quarta-feira, 24 de julho de 2013

Minha escola aos 50 anos


Fonseca Neto 15/07/13

Estudei a vida inteira em escola pública: o curso primário, fiz em Passagem Franca, onde nasci; depois, três anos ginasiais numa escola fundacional ligada à paróquia de Colinas, MA; em Teresina concluí o ensino médio no Liceu Piauiense; graduei-me e fiz mestrado, na Ufpi; agora o doutoramento na Ufma.

Na Passagem, depois de estudar a “carta de abc” e a “cartilha”, na escolinha Getúlio Vargas, fui para o primário na escola Clodomir Cardoso, funcionando em salões alugados. No dia 12 de julho de 1963, a cidade inaugurou o seu primeiro prédio escolar e nele criada uma nova escola, o Grupo Escolar Estado do Paraná. Fiz nela do primeiro ao quinto ano primário –com breve passagem pela escola paroquial Pio XII.

Agora completando 50 anos da inauguração “do Paraná”, as lembranças batem. Por isso escrevo. Eu fazia o 2º ano no dia da inauguração, um prédio enorme para a cidade: quatro salas de aula, boas e arejadas, piso “mosaico” (quadro negro na parede), diretoria, cantina, sentinas e um grande salão de recreio. Tempo de férias, mas todos fomos chamados à escola, pela manhã, de farda, porque haveria – como houve – distribuição de material escolar e merenda. A parte solene ficou para “gente grande”: professoras, prefeito, padre, pais. Cada sala recebeu um nome: a do 1º ano, “Raimundo Correa”; do 2º (?); 3º, “Padre Manoel Oliveira”; 4º, “Padre Vicente Britto”; 5º/diretoria, “Governador Newton Bello”; salão de recreio, “Senador Vitorino Freire”.

Lembro que, naquela manhã, recebemos das mãos das professoras e das filhas do prefeito, cadernos novos, lápis, borracha – mas o mino maior, a “máquina de fazer ponta de lápis”, só para professores... Houve mais de uma rodada de distribuição de bombons “sortidos”. Nossas carteiras novas eram muito bonitas (“cimo”), daquelas que sentavam dois estudantes em cada uma, com um engavetado para guardar os materiais, a cavidade de repousar lápis e canetas, e, ao meio, o lugar para se encaixar o tinteiro. O quintal da escola era enorme, parte dele, com laranjeiras, cajueiros, pés de ata; mas outra parte era chão recém brocado; distinguia-se um pequizeiro erado, no pátio descoberto –na época deles, da sala de aula, ouvia-se o som dos pequis caindo ao chão... A cantina, a parte menos cuidada: uma bilheira com dois potes de água fria, que logo secavam; as sentinas eram uma fábrica de brigas, confusão todo dia.

Naquela primeira metade dos anos 60, pelo “Estado do Paraná” ou nas demais escolas que por lá funcionavam, o magistério era somente de professoras; lembro das minhas: Maria da Paz Almeida, Mocinha Saraiva, Jesus Angeline, Carmelita Saraiva, Maria da Luz Lopes, Oscarina Ventura, Jacira Fernandes e Clóris Labre da Silveira Dias. Antes disso, fizera o “jardim” com dona Eurides Borges (minha primeira professora, do ABC) e dona Teresinha Moreira (a Cartilha).

A testemunhar esta história que agora tiro da cabeça, há centenas de colegas do tempo, com suas próprias memórias. Mas três pessoas são testemunhas da vida desse grupo escolar, como poucas: as vizinhas dele, dona Chiquinha do Mané Corró e dona Maria do Leó; também dona Sidona do Zé Cearense (já falecida), que desde o primeiro dia montou uma banquinha de venda de bolos e manga rosa e vivia às voltas com as professoras que não liberavam a saída de quem tinha um trocado para ir comprar –também nos davam água.

A cada dia, no início de tudo, “tia” Clóris, a diretora, fazia a formatura, regia o hino e a oração do dia. Cada dia, um hino: nacional, do Maranhão, Independência, à Bandeira e até o do Descobrimento do Brasil, que nunca mais vi cantado em lugar nenhum. Aqui e acolá aparecia alguma “autoridade constituída” para participar. O inspetor estadual era a autoridade educacional mais reverenciada – e temida – das que vinham de fora: lembro-me bem do professor Tony Macedo, perfilado, de terno.

Friozinho bom o da Passagem, era coisa ruim acordar cedo para ir à escola. Vida dura: encanto? Desconfio que a escola pública mudou.

(Dedico esta crônica aos padres Manoel e Vicente; donas Chiquinha, Maria e Sidona; a Anastácio Borges, prefeito que a inaugurou – falecido há seis dias.)

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