terça-feira, 24 de setembro de 2013

Abençoado e milagroso calor


José Maria Vasconcelos

      Chega br-o-bró, chega de chororô. Não suporto alarmistas, especialmente repórteres, assombrados com o calor de Teresina e de outras cidades batendo 38 a 40 graus. Assemelham-se a profetas apocalípticos. Deveriam difundir os benefícios que a bendita estação nos proporciona. Muita gente de regiões frias, residentes aqui, ressalta as virtudes de nosso calor.
    “Frio é bom para turistas, mas, para quem reside no Sul prefere o clima do Nordeste, particularmente do litoral” -  afirma o gaúcho e pastor evangélico, Sérgio Campanelli. “Vocês precisam explorar os benefícios do calor”- costumava estimular Padre Luciano: “Na Itália, há picos de 45 graus, todo mundo se banha mais, ao contrário do que ocorre em rigoroso inverno.” Gerente de importante empresa paranaense, também, defende nossa: “Tempo gelado incomoda até quem se senta no sifão. Não há agasalho que resista. Aqui, vocês enfrentam estiagem; lá, as geadas queimam a pele e as plantações.” Ucraniano, residente em Teresina, senta-se na calçada, tablet nas mãos, envia imagens das tardes ensolaradas aos colegas da geladíssima terra natal: “Vejam quanto é bom morar aqui!”
      Aproveitar o calor, a estação sazonal da manga, caju (cajuína), abacaxi, mamão... Beber mais água, a fim de eliminar radicais livres, toxinas, excessos de sais e açúcares, além de prevenir cálculos. Hábitos que prometem longevidade.  
    Em tempo de estiagem, consegue-se produção agrícola com moderna tecnologia de gotejamento. Cadê minhas favas? Estou colhendo-as em pleno br-o-bró, por rudimentar processo de irrigação. Poucas plantações, abundante suor e prazer que não encontro em academia. Deliciosas favas, caras e disputadas como picanha; cozidas (prefiro as verdes) com arroz, cheiro verde e azeite de coco. Seduzido pela cultura do grão e pelo fácil manejo, sem pragas e predadores, o agrônomo Bartolomeu resolveu seguir-me a lição, além de outros, cumprindo a parábola do bom semeador.
     Piauí, solo fértil, aquíferos e mananciais; mais abundante, só o chororô, a cuia na mão, a avidez de verbas públicas, sabe Deus com que intenções.
   Todas as manhãs, generosos ventos frescos invadem a cidade. À tarde, a canícula dispara até primeiras horas da noite. Mas aquele ventinho das dez... Antigamente, sem televisão e malandragem, sentava-se à porta das casas, esticava-se o papo, aguardando-se a brisa relaxante, sob o brilho do luar. Na zona rural, ainda se conserva saudável hábito. Na capital, porém, muita gente se deleita na cerveja mais estupidamente gelada do Brasil.
     Edênica Cidade Verde, quente como a terra de Jesus, que bateu o mais longo e divino papo com uma samaritana, à beira do poço, sedento e fatigado pelo calor do meio-dia (João, 4). Dois milênios antes, Abraão e três mensageiros, à sombra dos carvalhos de Mambré, “no maior calor do dia”, confraternizavam-se com carne de cordeiro. Os mensageiros anunciariam que a mulher de Abraão geraria um filho, Isaac (Gênesis, 18). Teresinenses apreciam sombra das árvores de restaurantes e bares.
     Lamentar b-r-o-bró, eu, hein?! Sem calor, faltaria suculenta manga, caju, cajuína, mil frutas, de dar água na boca de quem não se adapta aos ciclos e mistérios da natureza.   

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