segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Sebastião, santo mártir ou mito?


Sebastião, santo mártir ou mito?

José Maria Vasconcelos
Cronista
Josemaria001@hotmail.com

            Sou cético a muitas manifestações milagrosas de santos. Pior, à divinização de mitos e lendas.
             Major Carlos Sales, sacerdote, capelão da Polícia Militar do Piauí. Vozeirão de espantar até microfone: “O Senhor esteja convosco” no  modesto templo da Polícia Militar, acolhe média de cem fiéis. Para minha surpresa, nenhum policial presente. Do altar, o celebrante acena com voz de comando: “Zé, escreve uma crônica sobre São Sebastião!” Claro, major, você merece continência. E assembleia camarada aprovou a ideia.
          20 de janeiro, São Sebastião, festa de arromba e feriado mundo afora: Rio de Janeira, Parnaíba dos capuchinhos da Igreja de São Sebastião, Uruçuí. Centenas de cidades, paróquias, vilas e ruas dedicadas ao jovem, cravado de flechas, amarrado a um poste. Terreiros de Umbanda capricham na homenagem, e homossexuais têm-no padroeiro.
          No império romano, a religiosidade voltava-se para idolatria a deuses-padroeiro de chuva (Júpiter), sexo (Vênus), força física (Marte), bebedeira (Baco), artes e poesia (musas), enraizada em crenças e superstições populares. Com o avanço do cristianismo, pregou-se a fé no Deus invisível. Muitos cristãos convertidos, entre o segundo e terceiro séculos, não se libertavam da idolatria pagã. Substituíam deuses pagãos por heróis e mártires cristãos, em cujas devoções prevaleciam excessos de aclamação, superstições que atravessaram séculos, via cultura popular, e continuam até hoje. Papas, como Sixto IV, tentaram eliminar centenas de santos do calendário litúrgico. João XXIII, pelo Concílio Vaticano II, cassou dezenas, permitindo apenas homenagens regionais. Em respeito a tradições e à cultura popular, certos vigários estimulam a devoção, erguem santuários a mitos, alguns produzidos pelas lendas e fetichismo, a exemplo de Padre Cícero, em Juazeiro do Norte.
          São Cristóvão, a lenda do homem que teria ajudado uma criança a atravessar o rio e descobriu que era menino Jesus. Nem João XXIII engoliu o xarope, retirando-o do calendário litúrgico. Fantástica lenda de São Jorge, que enfrentara um dragão que engolia gente. Santo Erasmo ou Elmo, bispo de Fornia, Itália, outra lenda. Perseguido, torturado e preso pelo imperador Maximiano. Conta-se que foi libertado da cadeia pelo arcanjo Miguel. Novamente preso, cortaram-lhe os intestinos, virou protetor dos doentes de estômago e de parto. Outro mito, famoso na Itália, São Januário ou Genaro, cujo sangue do martírio se encontra solidificado em duas ampolas conservadas na Catedral de Nápoles. Colocadas ao lado da cabeça do santo, o sangue borbulha, segundo autoridades eclesiásticas. Tentei assistir ao fenômeno, mas me informaram estar fora de época.      
          São Sebastião, francês, residiu na Itália, soldado do exército romano, pela fé em Jesus foi martirizado. Sabe-se sua história através das atas do martírio, que foram escritas só dois séculos mais tarde. Em quase todas as atas de santos, os escribas tinham ordens do imperador para colocar muitos detalhes do martírio e dar pouca ênfase ao martirizado, a fim de assustar futuros cristãos, visto que as atas eram colocadas na cidade onde ocorria o martírio.
          Sebastião, cristão convicto, mesmo cumprindo tarefas militares, não tomava parte nos sacrifícios nem nos atos de idolatria. Sempre que podia, visitava os cristãos encarcerados e ajudava os mais fracos, doentes e necessitados. Soldado dos dois exércitos: o de Cristo e o de Roma. O imperador ordenou uma perseguição e morte aos cristãos de seu exército. Sebastião foi amarrado a um poste, sofreu flechadas dos algozes e abandonado. Irene, sua amiga, vendo-o agonizar, levou-o para casa e lhe tratou as feridas. Curado, regressou ao imperador e assumiu a condição de cristão. Foi executado, imediatamente. Transformou-se em padroeiro dos enfermos; dos homossexuais, por assumir, publicamente, sua condição cristã.

          Mártires e benfeitores sociais despertam condão de simpatia popular, às vezes, sagrada e divinizada. Motorista Gregório, em 1927, involuntariamente, acidentou e matou um filhinho de tenente, o qual, irritado, o amarrou a uma árvore, às margens do Poti, sem comer nem beber, executando-o em seguida. A crença e superstição popular ainda lhe devotam orações e votos. Já já, vem  por aí canonização, santuário e feriado.  

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