sábado, 5 de julho de 2014

A Fifa, a Copa e outros prolemas


Cunha e Silva Filho

Moro Rio de Janeiro há cinquenta anos. Já vi muita coisa, boa e ruim, nos diversos aspectos em que se queira colocar o que tem atravessado este Brasil, belo na paisagem, difícil na condução de sua política, nos grandes desafios que teimosamente continuam sem solução, nas descontinuidades de seus principais problemas: desmoralização da coisa publica, corrupção crônica que se vai naturalizando, violência insolúvel, transporte ruim, educação pública municipal e estadual do ensino fundamental e médio ainda bem deficiente, saúde precária, bons hospitais particulares só para a elite, segurança do indivíduo por tempo determinado, só para inglês ver, ou melhor, para turistas estrangeiros que vieram acompanhar suas seleções em alguns estados brasileiros.

Perguntando, em dia de jogo de seleções estrangeiras, a um soldado da Polícia Militar do Rio de Janeiro por que eu não poderia entrar por uma rua pela qual costumo passar a fim de dar caminha em volta do Maracanã, ele me respondeu que por ali não poderia, acrescentando: “São ordens da FIFA.” Então, lhe respondi, em tom de desabafo e indignação patriótica, como se eu tivesse assumindo o papel quixotesco do personagem de Lima Barreto - o tragicômico Policarpo Quaresma: “Mas a Fifa é quem dá ordens agora no país? “Cadê meus direitos de ir e vir?” O militar, com ar sorridente, não me disse mais nada e eu tomei meu rumo.

O país da Fifa é uma quarentena alegre e festiva – não há como não concordar com a alegria que paira no ar brasileiro, sobretudo agora com a vitória do Brasil sobre o Chile. Vitória suada, arrastada, sortuda porque conquistada pelo acaso dos pênaltis. A manchete hoje da Folha de São Paulo resume o resultado do jogo nestes termos desoladores: “Júlio César e trave salvam Brasil de vexame em casa.”

O país, até no futebol, está desconcertante. E não é pela força grande que os torcedores dão de coração e alma abertos tanto os entusiastas do futebol quanto os torcedores apenas de Copa Mundial. Embora a nossa seleção não seja a dos sonhos dos brasileiros, não é hora de abandonar os nossos jogadores, dentre os quais se destaca a figura de um star, de um craque, o nosso Neymar Jr. Deus sabe que, diante da tela da TV, acompanhando os jogos de nossa seleção, tenho me esforçado para torcer e até me emocionar, derramando lágrimas, quando está em jogo o destino da nossa seleção.

É neste período dos jogos da Copa que devemos dar todo o nosso apoio aos nossos atletas, esquecendo até mesmo algumas fraquezas de desempenho dos jogadores. Por cima dos problemas brasileiros, há uma voz interior, mais forte do que nós, que nos arrasta para manifestarmos o nosso apoio e os nossos desejos de que iremos ganhar a Taça. É curioso esta metamorfose que ocorre em tempos de Copa Mundial de Futebol, principalmente. Chamo a isso o sentimento da pátria, do amor ao solo brasileiro, à nossa língua, ao que temos de bom, ao que podemos ainda construir.

Em síntese, isso é patriotismo, sentimento que fala mais alto do que as misérias que não podemos nem devemos deixar de denunciar e reprovar, exigindo constantemente melhorias para nosso país cansado de tantas mazelas que nos envergonham e nos entristecem a ponto de perdermos as esperanças em nossos políticos em todos os níveis de governo.

Se o analfabetismo que ainda existe no país é um prato cheio para os que se elegem graças ao clientelismo histórico de nossos políticos, e à `irresponsabilidade de nosso eleitorado que dá votos para picaretas que se aproveitam do que conquistaram no meio artístico de baixo nível ou em outros setores de atividades que lhes dão visibilidade e fama, for debelado da cultura nacional, então é possível ter-se alguma esperança de que teremos melhores tempos para o Brasil.

O país será melhor em todos os sentidos quando a consciência de nossa cidadania atingir um nível razoável de visão imparcial de nossos problemas mais agudos: educação, saúde, trans porte e segurança. A sociedade brasileira precisa de encontrar um caminho que, conquanto tenha divergências ideológicas, possa levá-la a uma convivência solidária, se não em completa comunhão de ideias, pelo menos a um estágio de relativo equilíbrio entre todos os níveis de classes existentes, sem preconceitos, nem prepotência, nem ambições desmedidas e individualismos reprováveis.

Este relativo equilíbrio a que me refiro é exequível. Pode ser alcançado. Só depende de forças interiores, de transformação moral e ética e de um componente que a pós-modernidade e épocas passadas não souberam aplicar na práxis da vida civilizada: a dimensão religiosa sem fanatismos nem cegueiras. Os fanatismos não veem senão seus próprios princípios ou dogmas obedecidos na teoria, nos rituais, ou nos livros sagrados, tanto no mundo ocidental quanto oriental.

Essa dimensão espiritual, “the missing dimension,” como a definia um pastor americano há muito falecido, é que está faltando, com urgência, à população da Terra, agora devastada, poluída, maltratada. Planeta judiado pelos homens, pelos governos, pelas pessoas. As consequências já estão à vista: enchentes devastadoras, estranhas mudanças climáticas, efeito estufa, degelo das calotas polares, aumento do nível dos mares – este último um gravíssimo problema que pode rondar os continentes habitados do Planeta. Eis a questão.      

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