terça-feira, 8 de julho de 2014

EDIMÊ, a professora que remanesce

Foto meramente ilustrativa

EDIMÊ, a professora que remanesce

Jacob Fortes

Por vezes nos pegamos perdidos em silêncios indecifráveis, um estado letárgico alheado aos pensamentos racionais. É circunstância comum, acomete a todos os pensantes. Assim me sucedeu, dia desses, na hora da ave-maria, embora houvesse o pressentimento vago de que o torpor do “vinho” iria desvanecer brevemente.   Teclei o “enter” da minha mente uma, duas, três vezes e nada. Por fim, tenuemente surgiram os primeiros feixes de luz. Um filme insinuava-se. A tela, com a lerdeza de uma boiada calaceira que rumina o capim mascado, finalmente despertou. Neste comenos, lá da BR, hora do rush, ouvi a ambulância alardear continuamente a sua sirene em grau tão estridulante que fazia supor urgente missão de salvamento. Isso fez acender de vez todas as luzes do armarinho da minha memória. Um após outro, os pensamentos se ergueram e logo se formou um cortejo processional deles em busca de propósitos.

O primeiro a aluir-se expôs, num escaninho especial do armarinho, a figura da professora Edimê. Mais que professora, orientadora, amiga, e muito mais para quem, ingênuo e ainda poento do sertão, tinha o horizonte do tamanho das pestanas. Não sei do paradeiro da estimada professora, menos ainda as razões que a fizeram transferir-se da metrópole recifense para lecionar naquela cidadezinha. Naquele tempo, quando o diário do século, incrédulo, anotava as façanhas do Sputnik Primeiro, já lhe pesavam aos ombros o triplo dos meus doze. Dedutivamente, há de encontra-se vetusta, em algum lugar que gostaria de saber, ostentando as marcas inconfundíveis da longevidade. Senão, atendendo o chamado incontradito do concurso de remoção, passou a exercer a docência em plagas celestiais. Assim como na terra, lá também todos os ofícios são necessários. Seu relicário instrumento de ensino/aprendizagem, a máquina de datilografia, fora, no dizer do escritor Geraldo Almeida Borges, “Província Submersa”, incorporado, por decreto dos computadores modernos, à carga patrimonial da idade neolítica.

Gostaria que ela soubesse o quanto os seus ensinamentos me foram úteis e que efeito teve em meu coração a sua fidalga generosidade. Ainda que não possa vê-la, ternamente cultivo essa expectativa nutrindo a vontade de “ser novamente um menino”. Onde quer que esteja ofereço-lhe, professora Edimê, com a permissão do Rei, a canção “Lady Laura”, na voz melodiosa do meu silêncio, assistida por uma plateia de duas lágrimas que boiam indecisas: uma para regar a saudade que se tornou minha companheira, a outra para molhar as sementeiras que fazem florescer as edimês que tornam a vida ainda mais doce, a despeito dos seus absurdos.        

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