terça-feira, 28 de outubro de 2014

CAMPO MAIOR E A INDEPENDÊNCIA DO PIAUÍ


CAMPO MAIOR E A INDEPENDÊNCIA DO PIAUÍ

Valério Chaves Pinto
 Desembargador inativo do TJPI              


            Transcorridos mais de 190 anos da Independência do Brasil em 1822, até hoje a data da proclamação no Piauí permanece em processo polêmico, sem se saber verdadeiramente a quem pertence a prioridade desse fato histórico para efeito de se fixar com exatidão a data em que oficialmente deve ser comemorado o Dia do Piauí - 19 de outubro ou 24 de janeiro. Do pouco que se tem notícia, nem sempre se pode afirmar de modo convincente,a que verdade comanda as esparsas e deficientes narrativas e interpretações existentes.
            Pesquisadores, historiadores e tantos nomes ilustres das letras piauiensesdo passado e do presente fiéis aos ensinamentos históricos tais como: Monsenhor Joaquim Ferreira Chaves, Odilon Nunes, Arimathéa Tito Filho, Wilson de Andrade Brandão e Abdias Neves, contribuíram de modo louvável com seus estudos, análises e pesquisas, porém não há até hoje uma interpretação segura capaz de elucidar a verdade.
            A polêmica maior se acende entre Parnaíba, em cuja sede houve uma conspiração em 1821 visando mudar a ordem política da província; e Oeiras então capital (1761),cada qual reivindicando para si a primazia da Independência do Piauí,apresentando como justificativa os acontecimentos revolucionários contra as ordens portuguesas ocorridos em 19 de outubro de 1822 e 24 de janeiro de 1823, respectivamente.
 Nos bastidores dessa polêmica há ainda aqueles que defendem a tese de que a verdadeira independência do Piauí foi proclamada no dia 13 de março de 1823 em Campo Maior, com a sangrenta Batalha do Jenipapo onde brasileiros e portugueses lutaram,em campo aberto, em defesa da causa nacional do Brasil - fato ignorado por muitos brasileiros de outras regiões.
            O professor e pesquisador Arimathéa Tito Filho, dando sua contribuição em homenagem ao debate do tema, afirma com o fulgor de sua inteligência, em entrevista concedida à Rádio Difusora de Teresina em 1979 que, na verdade,“houve duas proclamações da Independência no Piauí. A primeira - diz ele, foi feita no dia 19 de outubro de 1822, em Parnaíba, quando o Major Manuel Clementino de Sousa Martins, liderando um movimento insurgente, rapidamente sufocado, derribou os portugueses liderados pelo Major João José da Cunha Fidié; e a segunda foi feita em Oeiras em 24 de janeiro de 1823 pelo visconde da Parnaíba, que naquele tempo não era Visconde, era apenas o cidadão Manuel Clementino de Sousa Martins”, (sobrinho e genro do Barão da Parnaíba), o qual, à frente de uma conspiração em favor da secessão de D. Pedro I como Imperador do Brasil, proclamou a independência no Piauí.
            Sabe-se que quando Fidié teve notícia de que a Independência tinha sido também proclamada em Oeiras, marchou com sua tropa de Parnaíba no dia 28 de fevereiro para combater os oeirenses, porém encontrou em Campo Maior a resistência de um improvisado exército brasileiro, travando-se ali a já referida Batalha do Jenipapo,seguindo depois para Caxias no Maranhão, donde passou a resistir durante três meses, sendo finalmente vencido e preso, curiosamente, pelas tropas de Manuel de Sousa Martins.
O historiador pernambucano Francisco Augusto Pereira da Costa conta que após o entrevero do Jenipapo, parte da bagagem de guerra de Fidié,constituída de munição, armas, dinheiro e os despojos da vila de São João da Parnaíba, foi furtada pelos soldados das tropas do capitão português Alexandre Pereira Nereu e levada para a cidade de Sobral no Ceará onde foi feita a apreensão e colocada em hasta pública, em maio do mesmo ano. Este fato fez com que Fidié,diante do enfraquecimento de seu arsenal, decidisse ser mais prudente desistir de marchar sobre a cidade de Oeiras. (Cronologia Histórica do Estado do Piauí, vol. II, pág. 307).
            Como se pode ver, o assunto é polêmico, naturalmente gerando nos parnaibanos e nos oeirenses, um certo aborrecimento toda vez que se cogita de revisar a história do Piauí para se acabar com a dúvida ou com a inverdade sobre qual data se deve comemorar o Dia do Piauí – 24 de janeiro, 19 de outubro ou 13 de março.
O que não se pode esconder, contudo, é que os parnaibanos foram heróis, cívicos e imbuídos de grande patriotismo ao combaterem as forças portuguesas através de um movimento liderado pelo juiz de fora João Cândido de Deus e Silva e pelo coronel Simplício de Sousa Dias.
 Os oeirenses também foram heróis e patriotas. Tudo é uma questão de interpretação histórica que cabe aos historiadores proclamar a verdade.
            A propósito dessa discussão, merece destaque uma tese muito interessante defendida pelo historiador piauiense Wilson Brandão, segundo a qual, o nosso primeiro e grande patriota da independência foi Antônio Maria Caú, escrivão da junta de Fazenda da Província. Caú era um desses tipos populares que as vezes pregam ideias e as vezes levam ideias à frente. Foi ele quem chefiou uma trama revolucionária para mudar a ordem política da Província sob o falso pretexto de jurar logo a constituição portuguesa que simulava defender, mas o alvo principal, segundo F.A. Pereira Costa na obra citada, página 253,era depor o governador Elias José Ribeiro de Carvalho e a instalação de uma Junta Provisória, da qual seria presidente o cirurgião Francisco José Furtado”.
            O desembargador Cristino Castelo Branco, uma das maiores mentalidades do Piauí, acha por sua vez, que a verdadeira independência se verificou no dia 13 de março de 1823 com a Batalha do Jenipapo. O mesmo ponto de vista é defendido pelo não menos respeitado historiador piauiense Monsenhor Joaquim Chaves e pelo pesquisador e jornalista Arimathéa Tito Filho. Na opiniãode ambos, já falecidos, uma terra se liberta pelo heroísmo de seu povo. E foi,efetivamente, o heroísmo dos campo-maiorenses que deu a Independência do Piauí e do Brasil.
            Abdias Neves em sua monografia intitulada A Guerra de Fidié, (1907, pág. 6), destaca o seguinte trecho do ofício em que o Dr. João Cândido de Deus e Silva,acusado pelos portugueses de não punir os sediciosos em Parnaíba, enviou ao Presidente da Junta Provisória do Governo em Oeiras, no dia 30 de setembro de 1822:
                “A melhor, a maior, a mais rica, a mais populosa parte do Brasil tem-se declarado a favor da causa da Independência; como persuadir-nos que o resto não siga a mesma causa? Ou quererão os povos olhar de sangue-frio o seu país dividido, seguindo o Sul um sistema e o Norte outro? Não me persuado que tal seja possível”

                Em verdade, há aqueles que criticam o movimento patriótico dos parnaibanos, achando que a ocasião não era propícia para se manifestar contra a ordem vigente. Há ainda os que se insurgiram contra os reveses ocorridos às margens do riacho Jenipapo, em Campo Maior.
            Mas é  o próprio Abdias Neves quem responde tais críticas:
            “...toda reforma, seja social ou religiosa, precisa de mártires e desse batismo de sangue para se impor e criar raízes na alma das multidões”.

            De nossa parte, longe da capacidade de análise e observação histórica que o assunto requer, diríamos que Campo Maior, através da bravura de seu povo, heroicamente demonstrada no episódio do Jenipapo, com certeza, está inserida no contexto desse pensamento.

2 comentários:

  1. José Itamar Abreu Costa
    O desembargador Valério, descreve com riqueza de detalhes a nossa pequena, porém grande participação do nosso heroico povo em prol da indepêndencia do Brasil. Continue a pesquisar e encontrará informações consistente e que ajudará esclarecer de uma vez por toda, algumas dúvidas que ainda existem em relação äs datas.

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  2. O que aconteceu a Elias José Ribeiro de Carvalho depois de 26 de Outubro de 1821? Voltou a Portugal?

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