terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

O ESTRANHO MUNDO DA PENA DE MORTE


            O ESTRANHO MUNDO DA PENA DE MORTE

Valério Chaves
 - Des. Inativo do TJPI e membro
   da UEB-PI e da Academia de Letras da Magistratura Piauiense

            A decapitação do jornalista americano James Toley, a execução por fuzilamento do brasileiro Marco Archer Cardoso Moreira, e de outros cinco presos na Indonésia; o recente ato de selvageria praticado por grupos extremistas do Estado Islâmico contra o piloto jordaniano Muath al-Kassasbeth, queimado vivo e mostrado o vídeo na internet, e o enforcamento da terrorista iraquiana Sajida al-Rishami, tudo a pretexto de chamar a atenção mundial, conter o tráfico de drogas, espalhar o medo e ganhar poder, nos dão uma visão bem nítida do quanto o mundo está em perigo e tão carente de dimensionamento humano.
            Não resta dúvida de que atos dessa natureza - verdadeiros assassinatos a sangue-frio conduzidos por facções radicais travestidas de agentes públicos – representam uma forma cruel e desumana de violação de direitos da pessoa humana.
 Com efeito, aceitar a decapitação de prisioneiros, o fuzilamento de jornalistas e o enforcamento de terroristas como uma suposta solução de segurança em face dos crimes de que foram acusados pelos seus algozes, não passa de mera ilusão quando se sabe que países onde esse tipo de punição foi abolida, experimentam outras alternativas à abordagem da repressão total das drogas, tratando como uma questão de saúde pública, e não de crime punido com a pena capital.
            Sabemos que a execução de políticas eficazes de segurança é tarefa difícil no mundo competitivo e alienante em que vivemos, e que sua efetivação tem de passar por medidas que comecem com a implantação de forças policiais bem entrosadas com a comunidade, com um poder judiciário eficiente e com a eliminação de dois fatores responsáveis pelo alastramento da violência: a pobreza e a discriminação.
            Nesta era de livres denúncias ainda não se comprovou até hoje nos países onde é aplicada, que a pena de morte tenha provocado a diminuição da violência e dos delitos vinculados, nem tampouco tenha impedido a atuação de pessoas na prática dos crimes cominados com a pena capital, máxime quando não existem evidências confiáveis que atestem sua eficácia na prevenção de crimes.
            Embora sejam recorrentes as críticas mundiais a este respeito, ainda é grande o número de países (90) que utilizam a pena de morte, principalmente de governos totalitários, tais como: Cuba, China e Irã. Felizmente, no Brasil, em razão da proibição constante da cláusula pétrea da Carta Magna, não existe a pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, inciso XIX), não obstante saber-se que algumas pessoas, sem perceberem a impossibilidade jurídica, e sem fazer uma análise mais humana do assunto, defendem sua aplicação nos casos de crimes hediondos.
            O certo é que, mesmo sob os escombros desses atos de brutalidade funesta contra vítimas indefesas, é difícil aceitar que as magnitudes dos atos terroristas mostrados ao mundo pelos meios de comunicação, não atingem somente as famílias das vítimas, mas todos os povos que exercitam e buscam a paz mundial.
            Vale ressaltar, contudo, que o sentimento crítico mundial e a reação indignada da maioria contra a sentença de morte decretada por governos que pregam o terror e usam as vidas de prisioneiros e de minorias étnicas/religiosas como instrumento de propaganda e fortalecimento do poder, são uma forma de não submissão à tirania imposta a quem desrespeita as leis.
            O grande jurista italiano, Cesare Beccaria, que nunca deixou de expressar seu amor pela humanidade, talvez antecipando o resultado de longos estudos da ciência jurídica ou inspirado nas condições particulares de sua época, dizia que a pena de morte é contrária à própria essência do direito. “Um país onde o próprio soberano exerce a autoridade, onde as riquezas apenas podem significar prazeres e não poder,  não deve existir qualquer necessidade de tirar a existência de  um cidadão” (in Dos Delitos e das Penas, pág. 46)
Espera-se, portanto, que o bom senso e a tolerância prevaleçam no coração de governantes mutilados pelo egoísmo, e que o retrato idealizado de deuses e heróis fanáticos, cedam lugar a imagens realistas de homens cultores do amor e da paz, e que representem, ao mesmo tempo, um forte chamado à oração a fim de que o desamor pelo próximo, possam dar lugar à reflexão e ao debate democrático num clima memorável de harmonia entre as nações rumo ao ideal de paz e fraternidade universal.
Caso contrário, estaremos sujeitos a perigos ainda maiores pelos caminhos do tempo e da história.  

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