segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

As minhas Copas do Mundo de Futebol (1)

Fonte: Google

As minhas Copas do Mundo de Futebol (1)

José Pedro Araújo
Romancista, escritor e cronista

Já que este ano teremos Copa do Mundo de Futebol na Rússia, ocorreu-me de publicar uma série de textos falando dos mundiais que eu assisti ou ouvi. Os primeiros mundiais, ouvi pelo rádio, e depois pela TV, sempre acompanhando as mudanças ocorridas nesse tipo de transmissão. E começo com uma constatação: a cada nova copa do mundo, uma tevê com mais recursos e melhor imagem é adquirida pela maioria dos brasileiros. Esse fenômeno deve ser mundial. Virou mania, assim como os games. Precisamos, é claro, acompanhar as novas mudanças tecnológicas, e desfrutar de toda a qualidade que os anunciantes dizem que elas trazem. Neste 2018, ano de copa do mundo outra vez, não vai ser diferente. Já me antecipei e adquiri a minha 4K com promessas que vão muito além da minha percepção. Achei que agindo assim, escaparia dos reajustes de preço que virão pela frente. Mas, deixa-me fazer um retrocesso para falar deste assunto.

A primeira copa do Mundo que realmente me traz alguma lembrança foi a de 1966. Da de 1962, quando o Brasil foi bicampeão do mundo, só me recordo de que a fábrica de bicicletas Monark lançou um modelo pós-copa que veio com os resultados dos jogos do Brasil fixados no varão das magrelas. Meu pai acabara de adquirir o tal veículo de duas rodas, novinha, e nesse dia lembrado ela estava exposta na sala de visita da sua sogra, d. Zezé, a minha avó materna. É somente do que me lembro mais intensamente aquele mundial. E olha que eu já tinha quase oito anos na ocasião. Como desculpa, devo acrescentar que as transmissões eram feitas pelo rádio, ele veiculava todas as notícias que aconteciam fora das fronteiras do velho Curador.  Eu não ouvia rádio, estava mais preocupado com outras coisas, como jogar pião, empinar papagaio ou mesmo... jogar futebol.

A de 1966 disputada na Inglaterra não, dessa ouvi muitas discussões sobre o potencial da nossa seleção de futebol. Não que já tivéssemos acesso à TV. Ainda ouvíamos as transmissões via rádio. Por esse tempo, vizinho ao comércio do meu pai, na Magalhães de Almeida, existia a farmácia do Sr. Zequinha Enfermeiro que, assim como seus dois filhos, João e Francisco, apreciava falar de futebol com o meu pai. E nesse período da copa já citada, eles estavam eufóricos, pois a seleção verde-amarela defendia o seu bicampeonato conquistado na Suécia e no Chile. Mas, logo na primeira apresentação do canarinho, deu para eles verificarem que o time havia envelhecido e perdido a sua condição de favorito. Ganhamos da Bulgária por 2 a 0 sem convencer. Perdemos as duas partidas subsequentes: Hungria por 3x1, e Portugal também pelo mesmo placar. Estávamos eliminados ainda na primeira fase de grupos, melancolicamente. Rádio desligado, as conversas se davam na calçada dos dois comércios, e eu, sem entender muito do que se passava, vi a tristeza se abater sobre aqueles torcedores sertanejos que se comportavam como se houvessem perdido um ente querido.

Nos dias seguintes, a tristeza deu lugar à revolta e as reclamações sobre o desempenho desse ou daquele jogador tomava conta das avaliações. Eu só ouvia tudo, sem emitir uma palavra. Não me considerava ainda um dos 85 milhões de técnicos de futebol da época, apesar de já está em processo de formação bem adiantada. Foi a Inglaterra, jogando em casa, quem ganhou a sua única copa do mundo, como todos sabem.

A copa de 1970 foi diferente. Já me achava com a formação de técnico de futebol concluída e, portanto, apto a participar das discussões sobre o tema. Havia me transferido para Teresina e aqui a televisão transmitiu tudo ao vivo. Só que na casa que eu morava não tinha TV, um artigo considerado de luxo, e ao alcance de poucas famílias ainda. Mas, mesmo assim, sempre encontrávamos receptividade na casa de algum conhecido e lá nos encantávamos com as atuações da Seleção de Ouro de Pelé, Tostão, Gerson, Rivelino e Companhia. O título não veio fácil, pegamos adversários difíceis. O primeiro jogo foi o mais tranquilo: sapecamos 4x1 nos nossos adversários, a Checoslováquia. Depois a caminhada foi ficando difícil. 1x0 na Inglaterra, em jogo duríssimo, e 3x2 na Romênia, em jogo que começou fácil e depois complicou.  Estávamos classificados, com louvor. Nas quartas-de-final(não existia oitavas-de-final ainda) nos defrontamos com a seleção peruana, treinada pelo brasileiro Didi, e tacamos 4x2 neles. Foi um belo jogo entre vizinhos sul-americanos.

Na semifinal, outro sul-americano: o Uruguai. 3x1 em jogo em que perdíamos até o finalzinho do primeiro tempo, com a borduna dos nossos adversários comendo solta no gramado. Mas, finalmente conseguimos empatar antes do intervalo, e no segundo tempo a seleção fez valer a sua superioridade técnica. Passávamos de fase. Nesse jogo aconteceu um fato que quase me fez perder a transmissão do jogo. Não sei por que cargas d’água, somente saímos em busca de uma casa com TV já próximo à hora do jogo. Não dava mais tempo para chegarmos até ao local em que assistimos às partidas anteriores. Subimos a Rua Jônatas Batista no sentido do Lindolfo Monteiro e encontramos uma casa em que um grupo de pessoas assistia ao jogo. Encostamo-nos à janela, eu e um amigo que me acompanhava, e ficamos vendo o espetáculo dali. O Jogo estava começando naquele instante. Um dos torcedores que ali estava ao se virar e nos ver ali postados levantou-se, veio até próximo à gente, e fechou as duas folhas da janela na nossa cara. Ficamos atônitos com a aquele gesto de nenhuma solidariedade com os sem-tevê e, cabisbaixos, subimos a rua desnorteados.

Ao chegarmos à esquina da Rua Rui Barbosa, guiados pelos gritos de revolta de uma inflamada torcida, chegamos ao janelão de outra casa em que um grupo de aproximadamente cinco pessoas assistia ao jogo. Encostamos discretamente e vimos que o Brasil já perdia por 1x0. Apesar de os torcedores estarem tocados por umas geladas, o clima estava meio em suspense, diante do jogo pegado e do placar adverso. Daí a pouco tempo um cidadão, ainda jovem, olhou para trás e nos viu ali pegando uma carona na sua TV. Incontinente, levantou-se e veio até nós. Como gato escaldado tem medo de água quente, cuidamos logo de bater em retirada antes que outra janela fosse fechada na nossa cara. Mas o homem nos chamou e nos fez entrar na casa alegremente. Passamos a integrar a pequena torcida. É claro que ainda um pouco sem jeito, pulga atrás da orelha. Mas ai veio o gol do Brasil e, muitos abraços depois, estávamos totalmente integrados ao grupo.

O resultado final dessa copa todos sabem. Passamos pelo Uruguai por 3x1. E fomos à final contra a Itália. Deu Brasil na cabeça, com um relaxante 4x1 sobre a também bicampeã do mundo. Ao final dos jogos os teresinenses saiam às ruas e se esbaldavam em festa até altas horas. A Praça Pedro II passou a ser o ponto central das comemorações do carnaval antecipado. E eu participei daquela festa enlouquecedora pela primeira vez na vida.

Ai veio a Copa de 1974. Naquele ano eu já estava residindo em Recife e cursava Engenharia Agronômica de UFRPE. Copa melancólica para uma seleção que defendia o título mundial. Todos esperavam muito do time que encantou o mundo na copa anterior. Mas estávamos  sem Pelé, Tostão, Gerson e Carlos Alberto. Depois de dois empates sem gols nas duas primeiras partidas, conseguimos vencer o Zaire, país sem nenhuma tradição em copas do mundo, e nos classificamos para a outra fase pelo saldo de gols. De bom mesmo apenas o aspecto de já assistir tudo em imagem colorida pela TV do nosso alojamento na UFPE.


Na segunda fase ganhamos da Alemanha Oriental e da Argentina, e perdemos para o Carrossel holandês. Fomos disputar o terceiro lugar, mas a Polônia nos mandou de volta para casa com um melancólico quarto lugar. Foi uma copa sem brilho e que iniciava um período longo sem título. O título, aliás, ficou com a Alemanha, para desgosto do mundo inteiro que torcia pelo exuberante futebol da Holanda de Cruyff.   

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