terça-feira, 18 de setembro de 2018

TRAGÉDIA BRASILEIRA

Fonte: Google


TRAGÉDIA BRASILEIRA

Des.  Valério Chaves
Da Academia de Letras da Magistratura Piauiense


A prática política no Brasil, tão em voga em pleno século XXI, onde o povo levado pelas manchetes da mídia, não consegue compreender a gravidade dos crimes perpetrados pelos representantes eleitos envolvidos em complexos esquemas de corrupção, suborno e desvio de dinheiro público, nos remete à tragédia grega Júlio César de Willian Shakespeare, na qual, Brutus e Marco Antônio, a pretexto de proteger a república, usaram a força da persuasão oratória para convencer a plebe a decidir sobre a responsabilidade pela morte do homem mais poderoso de Roma, assassinado nas escadarias do Senado com 23 golpes de adaga desferidos por uma conspiração liderada pelos senadores Brutus e Cássius (44  a.C).

Brutus no seu discurso fúnebre em frente ao corpo ensanguentado da vítima, justificava-se dizendo ao povo ter golpeado pelo bem de Roma, pois a adaga cravada por ele no corpo de César representava seu amor e o preço para os cidadãos romanos viverem em liberdade, uma vez que César estava propenso a dar um golpe e se auto nomear Rei de Roma.

  Marco Antônio, por sua vez, utilizando-se de uma postura retórica diferente visando voltar a multidão contra os traidores do imperador, dizia que o amor de César a Roma era sincero a tal ponto que para demonstrar sua bondade e lealdade pelo povo havia deixado em testamento 75 dracmas a cada cidadão romano, e que o sangue vertido em cada rasgo, produzido pela lâmina manejada pelos honrados senadores criminosos, aumentava a revolta do povo contra eles.

A história da humanidade tem inúmeros outros registros acerca do emprego da persuasão pela retórica ou de imagens sedutoras visando esconder crimes praticados, e até para obter promoção pessoal e alçar o poder, como revela o exemplo histórico do republicano Brutus que, ao qualificar César como ambicioso e pretender a escravidão do povo, quis carrear a culpa do crime à própria vítima.

Como vaticinado na filosofia do holandês Baruch Espinoza (1632-1677), “a modernidade tornou o homem refém do poder da imagem e da razão, através da qual vê a verdade à medida que a intuição intelectual permite conhecer a essência das coisas”.

Tanto na tragédia grega, quanto no momento atual da sociedade brasileira, há silêncio dos inocentes, daqueles que são reféns dos interesses de políticos ambiciosos, e que, submetidos às superstições justificadas pela mídia, acreditam nas promessas de um futuro melhor.

Nesse contexto, o poder de convencimento de muitos políticos ambiciosos do nosso país, direcionado a um povo inerte diante das condições precárias em que vive, soa, ora como a atitude de Brutus, ou seja, distante do povo romano nos escândalos que resultaram no assassinato de Júlio César para esconder sua traição; ora como a de Marco Antônio que soube usar sua invulgar habilidade oratória para louvar César, passar imagens dos conspiradores como homens honrados, porém, no fundo, desejava livrar-se deles para ganhar uma posição na república e satisfazer suas ambições políticas.

Em última análise, verifica-se que aquele ato da tragédia grega montado por Shakespeare, torna-se hoje mais atual do que nunca quando vemos muitos representantes do povo atuarem com todos os ingredientes de uma tragédia brasileira, ou seja, valem-se da persuasão oratória e da influência da mídia para chegarem ao poder, minimizar crimes e permanecerem impunes.  

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