sexta-feira, 21 de junho de 2019

No bar do Zé Lira

Foto antiga da sede da extinta Fazenda Estrela. Fonte: Luselene Macedo/Blog Super Campo Maior

No bar do Zé Lira

Elmar Carvalho

Estive ontem, no que eu chamo de “rápida circulação etílico-cultural periférica”, no bar do Zé Lira. Gosto de ir para lá porque fica perto da linha férrea, onde outrora passaram trens e locomotivas diversas, inclusive velha, negra e enfumaçada maria-fumaça, que passava bufando, resfolegando, enfeitada com o seu penacho de fuligem, a apitar saudosamente, como a dizer adeus a um tempo que não perduraria muito, e nas proximidades da casa grande da Fazenda Estrela, que ainda está de pé, embora quase em ruínas.

Mas vou, principalmente, porque de lá tenho uma bela visão da pequenina Serra Grande, na verdade morros isolados de Santo Antônio do Surubim, além de que, na ida e na volta, contemplo o pequeno, porém grande em beleza, Açude Grande. Ali perto, existiu um campo de futebol, chamado de rabo-da-gata, onde eu me transformava em verdadeiro gato, a fazer belas, elásticas e acrobáticas defesas, segundo dizem alguns amigos “pebolistas”.

Zé Lira é um cidadão sério e trabalhador, e que imprime respeito ao ambiente. Ontem, admirado com a qualidade das músicas que estavam sendo tocadas em seu aparelho de som, perguntei sobre quem as pedira. Com um sorriso traquina, respondeu-me que fora ele mesmo que as pedira. Tornou a repetir que gostava de pescarias e caçadas. Acredito que a afirmativa não é história de caçador e nem de pescador porque ele teve a humildade de dizer que era caçador de mocós, preás e outros pequenos animais, e não de onça.

Falou que é natural do município de Barras, de uma localidade situada entre Cabeceiras e a sede daquele município, porém depois foi residir num local perto do cruzamento da estrada que vai para Boqueirão com a BR.

Quando estava já quase de saída, em companhia do Zé Francisco Marques, chegaram o Sílvio Andrade e o Leni, meus velhos conhecidos. Sílvio é irmão de meu saudoso cunhado Zé Henrique, filho de dona Conceição e senhor Antônio Almeida, ambos falecidos. Fomos vizinhos na adolescência, quando nossos pais moraram perto, em casas que ficavam na rua do Estádio, a Capitão Félix.

Quando morei nessa rua, costumava jogar bola no campinho que ficava na beira do açude, numa praia de alvas e finas areias, em que perpetrei algumas “pontes” ornamentais, verdadeiras pontes estaiadas, na posição de goleiro. Esse campo ficava detrás da casa do tenente Jaime da Paz, ex-prefeito de Campo Maior, em cujo quintal verdejavam e se requebravam vários coqueiros, que me lembravam o mar que eu ainda não conhecia, a não ser por fotografias e pelos filmes exibidos no inesquecível Cine Nazareth.

Esse campo depois foi soterrado pela avenida de contorno da laguna, mas teima em existir na minha saudade. Nesse tempo ditoso, o açude praticamente não era poluído, e após o jogo tomávamos gostoso banho nas suas águas tépidas e de pequeninas ondas.

Depois, passei a jogar no campo do Grupo Escolar Leopoldo Pacheco, que era ingrato, áspero e intratável, como o cacto do poeta Bandeira, por causa da piçarra do terreno, que era uma verdadeira lixa a esfolar a pele dos atletas, principalmente goleiro, como era o meu caso. O imperador da época e do pedaço era o Otaviano, que até tem mesmo nome de imperador romano; era o dono da bola e do time.

Como não poderia deixar de ser, falamos do Zé Henrique, que, além de irmão do Sílvio, era amigo de nós três. Lembramos que, algumas vezes, quando tocado de leve pelo álcool, ele chegava a dar a própria camisa, quando se comovia com a pobreza de algum pedinte que o abordava. Foi bom rever esses amigos, e com eles ter confraternizado e conversado.   

15 de março de 2010  

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