sábado, 25 de setembro de 2021

BURROS NÃO SE REPRODUZEM, MAS A ASNICE, SIM

Fonte: Google


BURROS NÃO SE REPRODUZEM, MAS A ASNICE, SIM


Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)

               

                Será que terão mais sorte do que seus irmãos tortos, os jumentos? Estes, há muito vêm sendo desprezados pelos donos, que preferiram substituí-los por motocicletas, senão mais possantes, bem mais rápidas, que vão aonde aqueles iam e sujam menos. Tanto é assim, que os coitadinhos dos jegues estão quase virando manjar na China. Comenta-se que a terra dos mandarins, há muito, tem potencial para importar até um milhão deles por ano, para torná-los fina iguaria. Lá naqueles praianos municípios mafrensinos, fala-se que os bichinhos andariam desaparecendo na mesma proporção em que as dunas aparecem; não, não estão sendo por elas soterrados, talvez estejam sendo transformados em kituts ou embutidos.

                Há algum tempo, um candidato a prefeito – teria, acaso, querido ser irônico como aquele ex-governador que, enquanto titular do executivo, levou os burros e seus donos para pastarem e visitarem o palácio de onde despachava ordens e decisões governamentais? – ou um tipo quixotesco como outro governante, trabalhador incansável, projetista e criador de obras oníricas, como barca do sal, asfalto branco, praia artificial e que tais? -, como promessa de campanha – da qual sairia vitorioso -, segundo ele, visando minimizar o maltrato aos animais domésticos, inclusive, os que atuam como força motriz ou instrumento de trabalho, informou a seus pretensos eleitores, críticos e adversários, que pretenderia retirá-los da frente das carroças, que passariam a ser motorizadas. Haja burro desempregado e carroceiro sem ganha-pão, se houvesse a proposta sido levada a sério, o que não ocorreu, para o bem dos envolvidos e tristeza dos humoristas. Talvez não tenha conseguido incutir na cabeça de correligionários e simpatizantes o modus operandi que utilizaria para fornecer crédito àqueles profissionais - os donos das carroças, desde sempre, indivíduos que apenas sobrevivem com o que conseguem graças a seus burros -, a fim de que adquirissem os motores, se é que motores haveria em quantidade suficiente para substituir tantos animais. Fato é que a proposta malogrou; entrou pelo bico do pinto, saiu pelo bico do pato e virou “estória de trancoso”.

                A proposta que ora temos, envolvendo carroceiro e seu companheiro animal, diverge um pouco daquela: não se pensa em substituir o defasado, cansado e, por pouco, não superado quase ex-motor de carroça, o velho e bom burro - Um parêntese: desde tempos imemoriais, portanto, antes da invenção da roda de metal e pneumáticos de borracha, carros de tração animal com rodas feitas de tronco de madeira ou material semelhante, já percorriam campos e cidades, puxados por boi, jegue e, enfim, pelo mais famoso, entre nós, o burro; o que pretende o autor da proposta de projeto legislativo é que o poder público subsidie, com o dinheiro do contribuinte, obviamente, o descanso semanal do sacrificado animal e, claro, também o do seu patrão. A ideia, que, a propósito, parece não ter caído no gosto do dono da carroça e, por conseguinte, não causará surpresa se, como sua precursora, de repente, vier a ser descartada, até onde se sabe, resume-se no seguinte: um valor bem pequeno, na verdade, um óbolo, como, vez ou outra, costumam demagógicos gestores público dispensar aos cidadãos mais desafortunados, seria pago aos carroceiros em troca dos merecidos e ociosos descansos semanais que deveriam dar a seus animais de trabalho. O bicho pegou a partir do momento em que se meteram a discutir o valor da pecúnia, e como ou quando a mesma seria disponibilizada.

                Como daqui a pouco virão novas eleições, quem sabe, até lá, um iluminado empreendedor crie a associação profissional dos burros carroceiros e lance alguns dos filiados à carreira política. Burro para governador, deputado, senador e até presidente da república, já imaginaram? No passado, houve macaco candidato – e muito bem votado - papagaio, jabuti. Os asnos, muares ou mulas, como conhecemos nossos incansáveis burros, sabidamente, extremamente produtivos e trabalhadores, certamente, fariam a alegria de seus prepostos. Com bons conselheiros e marqueteiros, poderiam ir longe.

                Não poderia encerrar este arrazoado sem questionar minha condição de ser inteligente: é que só consigo pensar em hipocrisia ou demagogia sempre que vejo, leio ou escuto certas idiossincrasias, como essa, advinda de alguém instruído, informado, dando a entender que um trabalhador comum desempenhar sua atividade profissional nos finais de semana, como fazem médicos, dentistas, policiais, seguranças, garçons, garis dentre outras categorias, senão por diletantismo, por necessidade, ainda assim, não os estaria sujeitando a maus tratos; todavia, para fazer o mesmo, um carroceiro, precisaria, sim, maltratar seu animal de trabalho.

                Quer dizer, se tal proposta viesse a ser aprovada, legalmente, quem garantiria que outros beneméritos da vida animal não se metessem a pensar em estabelecer um tempo de trabalho que, uma vez cumprido, asseguraria aos burros de carroça direito à inatividade, à aposentadoria, obviamente, remunerada? Menos mau que não haveria a fonte pagadora de se preocupar com a possibilidade de pensão aos herdeiros: é que burro não se reproduz; mas asnice, sim.     

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