quarta-feira, 6 de outubro de 2021

HAJA MANCHETE!

 


HAJA  MANCHETE!


Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com)

 

                Uma boa manchete tem o poder de despertar no leitor, espectador ou telespectador, a vontade de, o mais rapidamente possível, explorar o fato ou assunto a que ela se propõe resumir, destacar. Não é incomum compulsarmos determinado jornal, revista ou meio semelhante, à cata daquele tema cuja manchete, mesmo que não se refira à notícia à qual o veículo gostaria de dar maior destaque, teria sido a que mais nos chamara a atenção. Elas são o âmago, a síntese da notícia ou reportagem. Quando, porém, exageram ou se mesmerizam, empobrecendo, tornando-se cansativos pleonasmos ou anacolutos, o fato noticiado costuma perder essência.

                Eis manchete colhida no matutino daquele dia: “Parte de muro de cemitério cai e deixa túmulos à mostra”. O autor não disse que, pelo espaço aberto, uma legião de sepultados aproveitara para fugir. Aqui, a síntese quase substitui o todo, a notícia; talvez nem fosse necessário lê-la para se saber mais. Se o tapume era de um recinto onde se enterram mortos em jazigos ou sepulturas, uma vez destruído, certamente, aqueles é que ficariam expostos. Todavia, lendo-se a notícia, percebe-se que o temor dos vivos que têm mortos ali enterrados, não é pelo que lhes possa acontecer, mas aos túmulos, que bandidos poderiam conspurcar em busca de objetos de algum valor material, ou utilizarem o buraco para adentrarem o local e, lá dentro, arquitetarem outras ações criminosas; e, vândalos irresponsáveis, fazerem do mesmo espaço depósito de lixo.

                Outra: “Deputado fulano nega sua ida para o partido tal”. Até onde se sabia, também por meio das mídias informativas, a legenda para a qual o parlamentar mostraria interesse em migrar, não estaria querendo contar com seu concurso; no texto da notícia, ele alegaria que apenas não tinha intenção de concorrer com nomes tradicionais da sigla rechaçada. Seria uma tentativa de valorizar seu passe, negar que não estava aceitando ir para uma legenda partidária que já teria anunciado não fazer ressalva a ninguém que a quisesse integrar? Inusitado não soaria se, logo, logo o mesmo veículo de informação (ou outro) anunciasse que o cidadão teria aceitado a oferta, antes, rejeitada, e se incorporado às fileiras da sigla camarada; afinal, em política, com federação ou sem coligação, sim e não apenas dois advérbios são.

                E esta: “Moradores de bairro da capital reclamam da falta de limpeza”. Reclamação é o que vêm fazendo citadinos de todos os recantos quanto a muitos descasos dos gestores públicos de plantão: transporte coletivo, por exemplo, parece assunto sem solução: andaria mais capenga do que nunca; nas escolas públicas faltariam produtos exigidos pelos protocolos sanitários para combate ao coronavírus, mas, mesmo assim, os administradores exigindo que as atividades educacionais fossem retomadas. Os sindicatos das categorias profissionais envolvidas reclamando que funcionários não podem nem deveriam bancar às próprias expensas a aquisição de tais produtos; enquanto não ficar tudo dentro dos conformes, pretenderiam impedir que seus filiados retornassem. Quem está fora, ainda que participando como vítimas de tantos imbróglios, já ouve o que comentam à boca solta, que o governante é um sortudo, pois, abertamente, ainda não pedem seu impeachment, mas precisa dar o ar da graça, porque paciência tem limite. A instabilidade na prestação do serviço de transporte público teria levado empregado a dormir no local de trabalho para não ter cortado o ponto no dia seguinte; e, outros, a nem irem ao trabalho, uma vez que os meios alternativos de locomoção estariam impraticáveis em termos de custos. 

Outra manchete do mesmo caderno do jornal que anunciava a reclamação dos moradores daquele bairro ante à falta de limpeza por parte dos órgãos públicos: “Superintendência de transporte e trânsito promete dobrar frota; Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros não foi notificado”; o que parece fato, haja vista o texto da notícia não desmentir a segunda afirmação. O Sindicato dos Lojistas talvez precisasse aliar-se aos representantes da indústria, dos prestadores de serviço (inclusive, das empresas de ônibus), para, juntos, somente pararem de cobrar providências efetivas e práticas dos gestores públicos, quando elas fossem tomadas; afinal, tratam-se de empresas que contribuem com um percentual considerável da arrecadação de tributos e no fornecimento de empregos. Ou seja, fato é que o SINDILOJAS e as demais entidades de classe não podem aceitar lero-lero ou conversa fiada dos administradores quanto às suas demandas.

                Haja manchete! Aqui, mais uma, provocada por um midiático parlamentar municipal: “Desesperados” - edil diz ter pena do partido que, coincidentemente, até ontem, comandava os destinos políticos da cidade. Como sua crítica, ao que parece, teria sido à candidatura de nomes do partido desesperado ao governo do estado - já derrotados, na visão do vidente crítico, pelo candidato apresentado por seu partido -, talvez, se questionado, também admitisse ter dó da cidade, administrada, sem a ajuda de gente de sua legenda política e, menos ainda, claro, da dos desesperados; só cobranças.

                Na edição do dia seguinte do mesmo diário, esta destacaria seu editorial: “Uma cidade entregue à própria sorte...” Manchete irretocável, infelizmente. Quem leu, ou não, o editorial, diante do que já estava farto de saber, cremos, concordaria.  

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