Da esquerda para a direita: Elmar Carvalho, Francisco Miguel de Moura, Valdeci Cavalcante, presidente Fides Angélica, Fonseca Neto e Nelson Nery. |
Foto: Josemar Lopes |
TRÊS DATAS JUBILARES (*)
Elmar Carvalho
PREÂMBULO
Meus pais, eu e meus irmãos fomos morar em Parnaíba em junho
de 1975. Residimos durante alguns anos no apartamento dos Correios e Telégrafos,
situado na bela Praça da Graça. No final dos anos 1970, a praça foi desfigurada
por uma reforma, mas ainda assim permaneceu cheia de graça. Nela e no seu
entorno ficavam as principais empresas da cidade e várias repartições públicas,
inclusive a Prefeitura.
Ao seu redor, podíamos encontrar os bancos do Nordeste, do
Brasil e do Estado do Piauí; a catedral de Nossa Senhora da Graça e a igreja de
Nossa Senhora do Rosário, ambas mais do que centenárias; as firmas comerciais Marc
Jacob, o Bar Acadêmico, o Salão Pimpão, o Palácio dos Móveis, a casa de
material esportivo do senhor Pedro Alelaf, o Cine-Teatro Éden e a farmácia do
Dr. Raul Furtado Bacelar, que não relaxava a sua elegante gravata borboleta, e
o posto de saúde do INPS. Nas cercanias, ficavam a Casa Inglesa (já de portas
fechadas), Poncion Rodrigues, Pedro Machado, Franklin Veras, a casa comercial
dos Neves, Moraes Souza e Moraes S. A. Muitas dessas firmas tiveram seu apogeu
na época do extrativismo econômico e tinham filiais em Teresina e em outras
cidades.
O transporte de cargas e passageiros era feito por trem, por
ônibus da empresa Marimbá, por caminhões e por via fluvial, através do Delta do
Parnaíba. No Porto Salgado ou Porto das Barcas ainda atracavam grandes embarcações,
graças à abertura do Canal São José, feita algumas décadas antes. Parnaíba já
entrara em decadência econômica, mas começava a se reinventar, mormente com a
prestação de serviço nas áreas de saúde, de educação, de turismo e de grandes
empresas comerciais. Já existia o Campus Ministro Reis Velloso (UFPI), que viria
a se transformar na Universidade Federal Delta do Parnaíba – UFDPar.
Todas as empresas que citei pertenciam às mais ilustres e
tradicionais famílias de Parnaíba, e já foram extintas. À família Moraes
Correia (**) pertencem dois de nossos homenageados.
JONAS DE MORAES CORREIA
Jonas de Moraes Correia era filho de Francisco Severiano de Moraes Correia Filho (*Açu-RN, 31/07/1845 - +21/01/1917) e sua esposa Maria Cleofas de Moraes Correia. Francisco é o patriarca dessa família no Piauí, quando se estabeleceu no litoral piauiense a partir de 1860/1863. O nosso homenageado nasceu em Parnaíba, em 15 de janeiro de 1874 e faleceu nessa mesma cidade em 27 de setembro de 1915. Portanto, estamos a comemorar o seu sesquicentenário. É o patrono da cadeira 24 de nossa Academia.
Com apenas 16 anos de idade iniciou sua vida profissional no
comércio, quando passou a fazer parte de uma sociedade mercantil, atividade em
que se destacou e se tornou respeitável. Foi colaborador da imprensa
parnaibana, na qual publicou importantes artigos sobre assuntos de interesse do
Piauí. Foi deputado estadual, tendo exercido a presidência de nossa Assembleia Legislativa.
Durante vários anos foi conselheiro municipal em sua terra natal. De 1901 a
1904, foi intendente municipal de Parnaíba.
A mais importante biógrafa de vultos da história parnaibana,
a professora e escritora Aldenora Mendes Moreira, em seu notável livro “Personalidades
Atuantes da História de Parnaíba – Ontem e Hoje”, relata que Jonas de Moraes
Correia sempre teve uma inteligência lúcida, uma lealdade e um grande amor
devotados à sua terra natal e aos seus conterrâneos. Dele ela traça este
perfil, que bem poderia estar em sua lápide: “As qualidades predominantes do
notável Jonas Correia, foram sem dúvida: a bondade aliada ao desinteresse; a
nobreza ao altruísmo; a inteligência à atividade; e a lealdade aliada à altivez,
todas postas em destaque, respectivamente, nas diversas fases de sua gloriosa
vida, quando podemos admirá-lo como o grande e respeitável cidadão.”
Para demonstrar a sua bondade e filantropia, basta que se
diga que, quando chegaram a Parnaíba vários flagelados ou retirantes, sobretudo
cearenses, vítimas da seca de 1900, ele organizou uma comissão de socorro, que
arrecadou importantes donativos, mormente gêneros de primeira necessidade e
dinheiro, que foram distribuídos com probidade e correção.
Era pai dos generais Jonas de Moraes Correia Filho,
Secretário de Educação do Rio de Janeiro, Deputado Federal, membro da Academia
Carioca de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e de Jônathas
de Moraes Correia, sobre o qual discorrerei adiante, e era avô de Jonas de
Moraes Correia Neto, também General e igualmente sócio do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, que ocupou o elevado cargo de Chefe do Estado Maior das
Forças Armadas. E era irmão do intendente Constantino de Moraes Correia, considerado
o urbanizador de Parnaíba, por ter idealizado e projetado o elegante bairro
Nova Parnaíba, na área conhecida como Caatinga de Cima, com suas ruas e avenidas
largas e arborizadas, muitas quase formando bulevares ou alamedas.
JÔNATHAS DE MORAES CORREIA
Para bem desempenhar minha missão de prestar esta homenagem jubilar ao segundo ocupante da cadeira 24 de nossa Academia, pesquisei em seus arquivos, em livros e dicionários biográficos, mas pouca coisa encontrei, a não ser sintéticas notas, que sequer faziam referência a seus pais e a sua data de nascimento. A informação sobre a data de sua morte era equivocada. Recorri a pesquisadores amigos e a parentes do homenageado, mas pouco ou nenhum êxito obtive. Recorri à internet e consegui encontrar a sua certidão de óbito, com a qual preenchi algumas lacunas. Pedi ao escritor Frederico Rebelo Torres, que vem se revelando um lídimo escafandrista de abissais e intrincados entrelaçamentos genealógicos, e ele me confirmou alguns dados, que eu conseguira encontrar.
Assim, posso dizer, com fundamento na sua certidão de óbito,
que o general Jônathas de Moraes Correia nasceu no Piauí (certamente em
Parnaíba), no ano de 1898 e faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 20 de
dezembro de 1952, onde se encontra sepultado no Cemitério de São Francisco Xavier.
Era filho de Jonas de Moraes Correia e de sua esposa Maria Firmina Ramos
Correia. Por conseguinte, memoramos hoje 126 anos de seu nascimento, 72 de seu
silêncio e, quiçá, 75 anos de sua eleição, já que ele não tomou posse de sua
cadeira, não obstante seja reconhecido pela APL como efetivamente empossado,
pelo que não existem discurso e nem termo de posse.
General do Exército Brasileiro. Exímio pesquisador na área da
Geodésia. Foi importante a sua participação na comissão que retificou os
limites do Brasil com o Peru. Na notável Antologia da Academia Piauiense de
Letras, da autoria de Wilson Carvalho Gonçalves, que tive a honra de prefaciar,
cuja segunda edição, integrante da Coleção 100 Anos, foi publicada na gestão do
presidente Nelson Nery Costa, encontra-se o seguinte comentário do acadêmico e
professor Álvaro Ferreira: “Assim foi que estivera na retificação de nossas
fronteiras, destacando-se como um dos mais entendidos. A ele coube a missão
difícil de encontrar o ponto ocidental do Brasil, na serra de Contamana,
exatamente, nos limites com o Peru. Saiu-se vitorioso da missão.” Foi deputado estadual
do Piauí (1934), tendo em sua legislatura sido também constituinte. Portanto,
foi signatário de nossa segunda Constituição Estadual.
O jovem tenente Jônathas de Moraes Correia tomou parte ativa
na Revolta de 1924 em São Paulo, também conhecida como Revolta Paulista de
1924, que foi um levante militar ocorrido entre 5 de julho e 28 de setembro de
1924, durante o governo de Artur Bernardes, que é considerada como um dos
principais eventos ou influência do Tenentismo, que foi fortalecido por esse
levante. Portanto, bem pode ser considerado um herói dessa revolta paulista e,
em consequência, do Movimento Tenentista. Segundo a tese de doutorado (2022) de
Maria Clara Spada de Castro, ele foi indiciado e condenado a 5 anos de
reclusão, como coautor, e esteve preso em Ilha Grande. Entretanto, progrediu em
sua carreira, até atingir o generalato.
Além de ocupante da cadeira 24 de nossa Academia, cujo
patrono é seu pai, Jônathas de Moraes Correia foi sócio fundador do Instituto
de Geografia e História Militar do Brasil, do qual ocupou a cadeira 23, cujo
patrono é o marechal Gregório Taumaturgo de Azevedo, primeiro governador
republicano do Piauí, natural de Barras. Foi diretor desse Instituto, no cargo
de Bibliotecário.
O Des. Paulo Freitas, em seu discurso de posse, disse que
Jônathas fora um mestre acatado, que deixara inúmeros trabalhos sobre questões
de linguagem. Transcreveu o seguinte trecho escrito pelo Des. Robert Wall de
Carvalho: “...possuidor de personalidade forte, de trato cavalheiresco, amigo
sincero, chefe de família exemplar e amava o seu torrão natal com amor inexcedível.
Escolheu e seguiu a carreira das armas, atingindo, merecidamente, no glorioso Exército
Nacional, o último posto, mercê de sua cultura profissional. No Piauí, onde
nasceu e é radicada sua ilustre e digna família, envolveu-se na política
partidária, elegendo-se deputado à Assembleia Legislativa. E nos anais daquela
augusta Casa se encontram registrados fluentes discursos, vasados em linguagem
escorreita, e pelos quais se constata seu ardor cívico e quão altos eram os
seus propósitos, quão valiosas e influentes as pugnas que, através da oratória
brilhante, sustentou pelo bem da coletividade que representava.”
Belas e lapidares palavras, que bem refletem a nobreza de
caráter, os méritos profissionais, o brilho intelectual e a inteligência
fulgurante de nosso homenageado.
DARCY FONTENELE DE ARAÚJO
Darcy Fontenele de Araújo, ou apenas “Professor Darcy”, como
era conhecido, nasceu em Parnaíba, no dia 10 de janeiro de 1916 e faleceu em
Teresina, no dia 26 de março de 1974. Foi casado com Maria da Glória Santos
Araújo; deles descendem empresários e profissionais liberais, como engenheiros,
advogados e médicos.
Estudou no Ginásio Parnaibano, em que fez curso preparatório.
Formou-se em Direito pela velha Faculdade de Direito do Recife, depois
integrada à Universidade Federal de Pernambuco. Foi advogado, promotor de Justiça, professor
universitário e político.
Eleito deputado estadual em 1950, foi nomeado advogado-geral
do Estado, em 1951. Dedicou-se ao magistério, sendo nomeado professor de
Geografia do Liceu Piauiense, em 1957, e de Direito Comercial da Faculdade de
Direito do Piauí (1958), uma das entidades de ensino superior que veio a formar
a Universidade Federal do Piauí, instalada em 1971.
Membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, em que ocupou a cadeira 36, cujo patrono é o jornalista, cronista e contista Vicente de Paula Fontenele Araújo, seu irmão. Em 1961, assumiu o cargo de procurador-geral do Estado. Foi presidente da Junta Comercial do Piauí e da OAB-PI. É o patrono da cadeira 16 da Academia Parnaibana de Letras. Em Parnaíba, no centro comercial e histórico, existe rua com seu nome.
Foi secretário de
Estado no governo do major José Vitorino Correia. Ao falecer, exercia o cargo
de secretário de Governo, na primeira gestão do governador Alberto Silva.
A Medalha do Mérito do Ministério Público do Piauí, que é a
mais importante honraria conferida pela instituição, tem como patrono o
procurador de Justiça Darcy Fontenele de Araújo. Essa distinção honorífica foi
instituída pelo Ato PGJ nº 123, de 1997, e regulamentada pela Resolução nº 04
de 2016, do Colégio de Procuradores de Justiça.
Escreveu e publicou os seguintes livros: Duplicata Mercantil
(tese), Inflação Monetária e sua Influência nos Salários e Desertificação do
Nordeste e o Vale do Parnaíba.
No último livro, editado numa época em que ainda não era moda
se falar em problemas ambientais ou ecológicos, em linguagem escorreita,
objetiva, concisa e clara, discorreu sobre as mazelas que fustigavam o rio
Parnaíba e os fatores que concorriam para a desertificação do Nordeste. Cabe
lembrar que o engenheiro alemão Gustavo Luís Guilherme Dodt (1831-1903), em seu
livro Descrição dos Rios Parnaíba e Gurupi, cuja primeira edição data de 1873,
já falava dos problemas de nosso Rio Grande dos Tapuias. O poeta Da Costa e
Silva, que o alcunhou de Velho Monge, já denunciava em dois poemas os malefícios
dos desmatamentos e das queimadas. E meu pai, em 1939 ou 1940, no Colégio
Diocesano, ouviu o professor Álvaro Ferreira, advertir que, se providências não
fossem tomadas, o Parnaíba poderia morrer em 50 anos, o que felizmente ainda não
aconteceu, embora a sua degradação seja muito grave.
Amante da literatura, foi um escritor competente e um leitor
inveterado e voraz. Segundo o historiador Caio Passos, era um “vibrante orador”
e participou, em sua cidade natal, de “memoráveis campanhas, quando arrebatava
a massa popular, em praça pública”.
Não obstante ser um profissional com um vasto currículo,
seu maior orgulho era ser Professor. E o
foi, com toda honra, mérito e desvelo.
CONCLUSÃO
Portanto, aqui discorri sobre três egrégios varões
plutarquianos, naturais de Parnaíba, que merecem todas as nossas homenagens, respeito
e reverência. E que seus nomes, para sempre, permaneçam lançados na
imortalidade do panteão de nosso Sodalício e do Estado do Piauí.
(*) Palestra pronunciada no dia 14/12/2024, na Academia
Piauiense de Letras, fazendo parte da solenidade comemorativa de jubileus acadêmicos,
em que foram homenageados Maria Nerina Pessoa Castelo Branco, Cromwell
Carvalho, Odilo Costa Filho, Celso Pinheiro Filho, Jonas de Moraes Correia,
Jônathas de Moreia Correia e Darcy Fontenele de Araújo.
(**) Pertencentes à família Moraes Correia foram intendentes/prefeitos
de Parnaíba: Francisco Severiano de Moraes Correia Filho, Luiz Antônio de
Moraes Correia, Jonas de Moraes Correia, Constantino de Moraes Correia, João
Orlando de Moraes Correia, Lauro Andrade Correia, Francisco de Assis Moraes
Souza (3 mandatos) e Antônio José de Moraes Souza Filho.
REFERÊNCIAS:
Personalidades Atuantes da História de Parnaíba – Ontem e
Hoje, de Aldenora Mendes Moreira.
Antologia da Academia Piauiense de Letras, de Wilson Carvalho
Gonçalves.
Livro do Centenário da Academia Piauiense de Letras, org.
Nildomar da Silveira Soares.
Cada Rua – Sua História, de Caio Passos.
Descrição dos Rios Parnaíba e Gurupi, de Gustavo Dodt.
A Revolta de 1924 em São Paulo: para além dos tenentes, tese
de doutorado (2022) de Maria Clara Spada de Castro.
Acervo da Academia Piauiense de Letras.
Informações fornecidas por familiares e amigos.
Informações colhidas na Internet.
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