terça-feira, 15 de julho de 2025

Da Imortalidade Acadêmica

 

Fonte: Google

“A Academia Piauiense de Letras está desenvolvendo, ao longo deste mês de julho, a série “O que é ser imortal para mim”, uma proposta jornalística, publicada em forma de matérias reflexivas no site oficial da APL.

A série reúne breves depoimentos e impressões pessoais dos membros da Casa em torno de uma pergunta essencial:

Qual é o verdadeiro sentido de pertencer a uma instituição fundada em 1917 para preservar, cultivar e eternizar a palavra?”

Em virtude da solicitação acima, resolvi escrever o depoimento abaixo, para publicação em meu blog e em futuro livro. O texto serviu para que a jornalista Vanize Lemos produzisse uma bela matéria jornalística.

 

Da Imortalidade Acadêmica

 

Elmar Carvalho

 

Velhos alquimistas buscavam transformar enxofre em ouro. Até hoje essa fórmula não foi encontrada, apesar do imenso avanço da química.

Entretanto, o sonho da imortalidade é mais antigo, e, segundo a Bíblia, a perdemos com a queda de Adão.

Remonta, portanto, aos tempos de Gênesis e à antiguidade mitológica greco-romana.

A Sibila de Cuma pediu a Apolo que lhe concedesse tantos anos de vida quantos fossem os grãos de areia que cabiam em sua mão cheia.

O deus, como o gênio perverso da lenda árabe, distorcendo o seu pedido, deu-lhe a eternidade, mas não lhe deu o eterno frescor da juventude.

E a Sibila de Cuma, ao perder o vigor e a beleza, apenas desejava morrer.

E o elixir da longa vida jamais foi encontrado ou fabricado.

O valente império persa de dez mil homens ganhou a legenda de imortais, porque, logo que um soldado morria ou se tornava inválido, era imediatamente substituído por outro homem.

Assim, dizem os doutos e eruditos, os acadêmicos se tornam imortais de modo semelhante, porque, logo que um “silencia”, é substituído por um outro intelectual, permanecendo sempre o mesmo o número de acadêmicos.

Mas não seria essa a imortalidade acadêmica desejável. O que se almeja é que a obra artística do membro do sodalício permanecesse sendo lida pelos pósteros, o que nem sempre acontece.

Ataulfo de Paiva, que não tinha obra de valor, cortejou os “imortais” e conseguiu entrar na Academia Brasileira de Letras.

Mário Quintana, ao contrário, um dos maiores poetas do Brasil, bateu três vezes à porta da ABL, mas as suas portas douradas não se abriram. Quintana, no Poeminho do Contra, escreveu estes versos imortais:

Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão...

Eu passarinho!

 

No meu discurso de posse, nas minhas primeiras palavras, disse sobre o meu antigo desejo de pertencer à nossa Academia Piauiense de Letras:

“Desde o início de minha adolescência, ao ler revista desta Academia, nutri o desejo de pertencer a este silogeu. No exemplar, além de várias matérias, havia discursos de posse e crítica literária. Jovem, interiorano e humilde, achei um desiderato de difícil realização. Prossegui em meus estudos e em minha labuta literária, dando tempo ao tempo, na espera das oportunidades que pudessem surgir. Não fiz desse desejo um cavalo de batalha nem uma obsessão. Trabalhei e perseverei, sem forçar barras e sem cometer insolências e rebeldias sem causa, e também sem histéricas e inconsequentes iconoclastias. Agora, os senhores abriram os portais da Academia para mim, e eu lhes sou muito grato por isso, e saberei ter a gratidão da amizade desinteressada e do sadio e assíduo companheirismo.”

Ingressei no dia 21 de novembro de 2008, recebido por um magnífico discurso de Celso Barros Coelho, um dos maiores oradores e eruditos do Piauí.

Antes de tomar posse, um amigo escreveu que eu já podia morrer em paz, porquanto já me havia tornado “imortal”.

A esse amigo direi: não, amigo, pelo simples fato de ter me tornado membro da APL não me tornei imortal. Gostaria de me tornar lembrado pelos textos em prosa e poemas que já escrevi.

Mas, em verdade, seria uma imortalidade precária. Parafraseando Fernando Pessoa, diria que, com o passar dos anos, o meu nome desapareceria da tabuleta; depois, desapareceria a própria tabuleta. E, finalmente, será extinto este Planeta, esta “aldeola do espaço”, onde estas coisas aconteceram.

Gostaria de me tornar imortal “na mão de Deus, na sua mão direita”, como disse o excelso poeta Antero Tarquínio de Quental.

2 comentários:

  1. Excelente. Um tema extraordinário com agradável exposição.

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  2. Muito obrigado, caro amigo.

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