Aracy e Guimarães Rosa |
José
Maria Vasconcelos, cronista
josemaria001@hotmail.com
Como
tantos outros rebolados, rebolations, "eu tô maluco",
eletrizantes e sensuais, tão fugazes e meteóricos, logo
desaparecem. "Eu Quero Tchu, Eu Quero Tcha..." é da hora,
invade o planeta, jogadores famosos festejam o gol, em requebros para
a plateia. Restará aos autores da espasmódica canção e mixuruco
texto e gingado apelativo, uma montanha de dinheiro e fama
transitória.
Condenam-se tais rebolados.
Piores do que os pinotes e malabarismos escandalosos de gestores?
Sacaneiam a opinião pública, até o nome Deus. Dançam, gingam,
tripudiam, sem tapa-sexo, sem dignidade: "Eu quero mais...muito
mais...e tcham, tcham, tcham para otários éticos." Parlamentar
sacoleja a pança, rebola-se como secretário, esfregando a vergonha,
há décadas, com obesos contracheques, sem nunca ter pisado no
emprego de banco estatal. A mulher se esbalda em luxuriantes 20 mil
paus, como procuradora do Estado, nunca piscou o olho para o
trabalho. Na dança irreverente de contracheques, filhos e irmãos se
derretem e compõem o ritmo da malandragem. Bananas e maior-de-todos
para a moral cristã, para a infância e velhice abandonadas nos
hospitais, para as obras inacabadas.
Francisco Cambraia, irmão
de ex-prefeito de Fortaleza, acaba de me enviar documentário sobre a
bela Aracy Guimarães Rosa. Separada do marido, foi morar com a tia
na Alemanha, nos anos 30. Dominando alemão, Aracy conseguiu emprego
no consulado brasileiro de Hamburgo. João Guimarães Rosa, também
separado da esposa, antes de sair do Brasil, foi servir no consulado
de Hamburgo. Conheceu Aracy, casaram-se. Uma circular do Itamaraty
proibia vistos de saída a judeus para o Brasil. Aracy driblava as
autoridades, permitindo vistos àquele povo perseguido pelo nazismo.
Guimarães Rosa sabia do ato humanitário e arriscado da esposa,
permitindo os vistos. Aracy salvou centenas de judeus do holocausto.
O governo de Israel, mais tarde, homenagearia a benfeitora, em
memorial de Jerusalém, onde constam nomes de 18 diplomatas que
salvaram judeus da carnificina nazista.
Guimarães Rosa morreu em
1967. Aracy nunca mais se casou, nem se assoberbou de viúva do
imortal escritor. Acolheu perseguidos políticos do governo militar,
acolhendo-os na Alemanha, entre os quais cantor Geraldo Vandré.
Em 1985, a heroína
dirigiu-se a Israel para condecoração, bem como a Washington, pelo
governo americano. Faleceu em 2011, aos 103 anos. Nenhuma homenagem
do governo brasileiro. Aqui se homenageiam esposas, filhos, parentes,
distribuem-se, servilmente, títulos de cidadania. Essa gente segue
códigos egoístas de "Mateus, primeiro os meus." E ainda
tripudia a opinião pública, dançando, nus de vergonha na cara, o
rebolation, a ginga do Tcham na boquinha da garrafa. Quantas
boquinhas imorais!
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