Olavo Pereira da Silva Filho
O Decreto
Municipal nº 12.048/14/04/2012 que tomba o edifício sede do Jockey
Club do Piauí, chega ao noticiário como uma efusiva manifestação
de que os gestores públicos têm consciência da memória da cidade.
Será?!
Para
entendermos o significado desse ato no contexto da paisagem cultural
da cidade precisamos projetar um sentimento de estima pelas
referências que consubstanciam identidade social. Não raro, esse
sentimento encontra-se incubado em mentes presas a um passado
condenado à extinção. Isso nos mais idosos, porque as novas
gerações pouco ou nada sabem do passado dessa cidade. Nessa Chapada
do Corisco, a alienação e a falta de estima pelos bens culturais é
um estigma de um modo de ver e de sentir, que interage no meio
ambiente, delimitando fronteiras do desenvolvimento social.
Nisso, há
muito desconhecimento que, aliado à informações desvirtuadas, não
raro praticadas por agentes públicos, caracterizam um preconceito à
preservação do patrimônio cultural. Contudo, frente ao ato em
tela, não se pode dizer de desconhecimento. Além do que, esse
complexo não está na lista de “monumentos” objeto de “proteção”
da Lei nº 3.563, out/2006, nem tampouco no IPAC-TE (Inventário de
proteção do Acervo Cultural de Teresina, realizado pela própria
Prefeitura). No que então, esse prédio consubstancia identidade à
cidade, para merecer a aplicação desse suporte legal?
O Jockey,
embora na origem vinculado a criadores de cavalos, foi nos anos
sessenta, enquanto clube de lazer, que talvez mais tenha se projetado
na vida social da cidade, inclusive agregando toponímia ao bairro.
Essa atividade seria o principal argumento para a proteção oficial
desse complexo. Ou seja: mais pelo uso que marcou aqueles anos
dourados, que pela arquitetura propriamente dita, já tão
reformulada ao longo do tempo.
De suas
edificações de origem nada restou. De sua arquitetura atual, não
se pode dizer de expressão imprescindível ao quadro histórico da
arquitetura de Teresina, pois se assim o fosse todas as outras com
essas características, igualmente deveriam receber o mesmo
tratamento da salvaguarda oficial. Também não se sabe de movimentos
pela a preservação especifica dessa edificação, enquanto
componente da paisagem tradicional, senão do Club propriamente dito,
enquanto lugar de lazer familiar, muito diferente dos estrondosos
espaços musicais que hoje se espalham pela cidade.
Do que
chegou aos dias atuais, o que me toca é um sentimento de perda -
tempo de piscinas, quadras e bailes. Daquele cenário não esqueço
os antigênicos vestiários, a fascinante piscina e o pitoresco
restaurante aberto e coberto de palha. Nesse trajeto da Avenida Nossa
Senhora de Fátima, não mais o encontro. Reformas e ampliações o
levaram ao estado atual, enquanto o uso, como pátio de espetáculos,
o distancia de suas antigas concentrações de convivências
particularizadas.
Nesse
contexto, em que o limite do tombo se restringe ao edifício sede,
por si só insuficiente para caracterizar o Club, além de
anunciadamente passível de adaptações comerciais, evidencia-se não
só a desmemorização desse ambiente, em que pátios, piscinas,
quadras e demais áreas livres deveriam ser considerados partes
indissociáveis desse conjunto, mas a liberação desses espaços
para novos empreendimentos. Para isso, a lei de uso do solo seria
suficiente. Mas essa, ao selecionar 168 “FACHADAS”, condena mais
de 1000 outros ao desaparecimento, como de fato está a ocorrer.
Falso propósito que, aliado a esse dito ato de proteção, expressa
a total falta de apego ou de apreço pelas raízes culturais dessa
cidade.
Se o
Jockey é lembrança merecedora de revivências, por que não se
dizer o mesmo das históricas referências do centro antigo, tão
aviltadas pelo crescimento desordenado, estimulado pela próprias
políticas públicas?
Esse é o
ponto que mais preocupa nessa ação de tombamento: a desproteção
de tudo o mais inventariado pela Prefeitura em 1988 e 2010. O que se
vê nesse ato não é uma preocupação com a memória histórica da
cidade, de suas edificações tradicionais, nem mesmo com a memória
desse Club. Mas o aval para novos empreendimentos, em detrimento dos
valores históricos (ambientes, piscinas, quadras, equipamentos e
terreno) que caracterizam o Club. Por outro lado, um clube são seus
sócios. Assim, em que pese a nostalgia, só o uso compatível pode
preservá-lo, a exemplos de tantos outros espalhados pelo Brasil, em
franca e saudável atividade.
Essa é a
chancela oficial da preservação. Esse é o selo dos que decidem o
destino dessa cidade.
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