UMA
FANTÁSTICA AVENTURA NO MUNDO DO CRIME
Jonas Fontenele de Carvalho (*)
Tenho
alguns amigos, que quando narro algumas passagens da minha vida, ou
não acreditam, ou a acham excepcionalmente fantástica, sendo certo
que as vivi, sem essa condição, apenas vivi. Acho mesmo que eles
também viveram situações consideradas fantásticas, mas ou não se
lembram delas, ou não deram tanta importância como eu, ou eu sou
mesmo um privilegiado, o que particularmente não acredito.
A
vida, não sei se por ironia ou por outro motivo qualquer, me fez
advogado, e na área criminal, justo eu, que não gosto de violência,
e que me sinto mal ao ver qualquer ser humano preso. Quando, por
obrigação da profissão, tenho que ir a um presídio, sinto que é
uma violência comigo mesmo, sempre saio de lá arrasado, por ver
aquela multidão de pessoas, sem poder curtir o que a vida tem de
melhor, seja lá o que eles achem o melhor da vida. Fico imaginando a
tristeza deles, e a tristeza que eles causaram para poder estar ali
atrás daqueles muros intransponíveis.
Mas,
o que quero narrar é uma passagem absurda e surreal que me aconteceu
quando ainda contava com dezessete/dezoito anos de idade. Morava eu
nessa época (1978/1979) na cidade de São Paulo e trabalhava na
VARIG, namorava uma jovem, que além de trabalhar também na VARIG,
morava perto do aeroporto, então quando eu saía do serviço, quando
não era dia de semana, eu ia pra casa dela, e de lá só saía por
volta de uma da manhã, coisa típica da idade.
Um
dia de domingo, saindo da casa da namorada, por volta da uma da
manhã, eu estava no ponto de ônibus, esperando o ônibus que
chamávamos de NEGREIRO, que era o último ônibus do dia. Era pegar
aquele ônibus ou esperar amanhecer o dia para conseguir ir pra casa.
Nesse dia não havia ninguém na rua, todo mundo recolhido para
recomeçar tudo outra vez na segunda-feira pela manhã, quando vejo
um sujeito sozinho empurrando um fusca. Ele empurrava e entrava no
carro para aproveitar o embalo e tentar dar um “tranco” para
fazer o carro pegar. Fiquei olhando aquela situação e pensando
comigo mesmo: “ele não vai conseguir nunca fazer esse carro
pegar”, isso porque quando ele conseguia entrar no veículo, o
impulso que ele havia dado se acabava e o “tranco” não tinha
força para fazer o motor girar.
Fiquei
olhando aquilo e pensando: se eu não o ajudar, o cara vai morrer
tentando e não vai conseguir. Correndo o risco do ônibus NEGREIRO
passar e me deixar na “mão” corri até o sujeito e perguntei se
ele queria que eu o ajudasse, no que ele imediatamente aceitou, e
então ele ficou dentro do carro e eu empurrei até que o carro fez
aquele barulho que estávamos esperando, eu pra deixar de empurrar e
ele para sair daquela situação. Carro funcionando, eu havia
terminado a minha parte, cabia a mim, voltar ao ponto de ônibus e
esperar o NEGREIRO, só que fui interrompido pelo “amigo” que
acabara de conquistar, que me perguntava para onde estava indo. O que
lhe respondi: INTERLAGOS, bairro onde morava. Ele então me disse:
estou indo praquelas bandas, entra aí que te deixo lá. Era muita
sorte minha, pensei: empurrei o carro certo, na hora certa, já que o
NEGREIRO não dava nem sinal que iria aparecer, aceitei a carona
muito satisfeito.
Entrei
e fui naquele veículo pensando: o sujeito ia pro mesmo lado em que
eu morava, eu não ia pagar nada e ia chegar em casa mais rápido do
que o NEGREIRO. O motorista era muito cordial, agradecendo a ajuda e
fazendo perguntas, tudo corria melhor do que eu previa, mas isso só
perdurou até ingressarmos na avenida 23 de maio, quando ouvi uma
sirene bem atrás do fusca, seguido de um movimento do motorista que
revelou um revólver na sua mão seguido de um tiro em direção ao
carro da polícia, óbvio e evidente que aquilo me deixou
absolutamente pasmo, sem reação e branco de medo. O tiro endereçado
ao carro da polícia, foi imediatamente revidado com vários tiros em
direção ao fusca, me deixando não em pânico, pois dessa fase eu
já havia passado, me deixando super-aterrorizado, sem entender que
diabos estava acontecendo, o que o motorista logo me revelou, fato
que se eu não estivesse aterrorizado já devia saber, mas o terror
vivido não me deixava raciocinar: ele acabara de furtar aquele
veículo, e eu na minha inocência, havia ajudado a concretizar o
furto, e estava agora ali, dentro do veículo, que recebia tiros da
polícia, com um sujeito que eu nunca vira na vida, e o que é pior,
na situação de cúmplice.
Narrar
esse fato hoje pra mim é fácil. No dia e na hora, o pavor que eu
vivi naquele momento, não dá para descrever, por mais que eu
queira. Aquilo era algo absolutamente diferente na minha vida. Não
sabia o que fazer, não sabia se gritava, se saltava do carro em alta
velocidade, ou simplesmente deixava o fato acontecer. Eu era refém
de uma situação absolutamente inacreditável. O sujeito imprimia
uma velocidade ao fusca, que acho mesmo que a própria Volkswagen não
sabia que o danado conseguia alcançar. Acho que aquela criatura viu
o pavor, o desespero que eu vivia e me disse que ia me deixar na
primeira oportunidade e que eu me preparasse para descer logo que ele
diminuísse a velocidade, ele então fez uma manobra brusca a
direita, que não sei mesmo porque não capotamos, e gritou: sai. Eu
não sei de onde tirei coragem e saltei e ele então entrou numa rua
e sumiu na escuridão.
Acho
que naquele momento meu coração pulsava além da sua capacidade.
Sentei no chão e comecei a chorar compulsivamente, não conseguia
controlar o choro, acho que o medo se misturava com o desespero, com
uma sensação de que a vida estava me alertando, dizendo que eu era
ainda muito criança, apesar de me achar muito “adulto” na época.
Vivi,
pois, esta fantástica aventura no mundo do crime, de forma
absolutamente involuntária, mas fico imaginado, que se tivesse dado
errado, poderia ter morrido ou preso na minha adolescência, e o que
é pior com a fama de “ladrão de carro”, que eu nunca iria
conseguir desfazer.
Essa
é uma das narrativas que os amigos acham fantásticas e outros nem
acreditam, acham que é brincadeira minha. Você leitor, tire suas
conclusões.
(*) O autor é advogado e professor em Brasília. É um bom amigo e tem reputação ilibada. Agora, um detalhe: de vez em quando, mente (artisticamente, claro).
Essa do MENTE ARISTICAMENTE, foi de lascar, ri muito. Agora sei que você faz parte dos que não acreditam nas fantásticas aventuras vividas kkkk. Abs e valeu
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