segunda-feira, 29 de outubro de 2012

UMA FANTÁSTICA AVENTURA NO MUNDO DO CRIME



UMA FANTÁSTICA AVENTURA NO MUNDO DO CRIME

Jonas Fontenele de Carvalho (*)

Tenho alguns amigos, que quando narro algumas passagens da minha vida, ou não acreditam, ou a acham excepcionalmente fantástica, sendo certo que as vivi, sem essa condição, apenas vivi. Acho mesmo que eles também viveram situações consideradas fantásticas, mas ou não se lembram delas, ou não deram tanta importância como eu, ou eu sou mesmo um privilegiado, o que particularmente não acredito.

A vida, não sei se por ironia ou por outro motivo qualquer, me fez advogado, e na área criminal, justo eu, que não gosto de violência, e que me sinto mal ao ver qualquer ser humano preso. Quando, por obrigação da profissão, tenho que ir a um presídio, sinto que é uma violência comigo mesmo, sempre saio de lá arrasado, por ver aquela multidão de pessoas, sem poder curtir o que a vida tem de melhor, seja lá o que eles achem o melhor da vida. Fico imaginando a tristeza deles, e a tristeza que eles causaram para poder estar ali atrás daqueles muros intransponíveis.

Mas, o que quero narrar é uma passagem absurda e surreal que me aconteceu quando ainda contava com dezessete/dezoito anos de idade. Morava eu nessa época (1978/1979) na cidade de São Paulo e trabalhava na VARIG, namorava uma jovem, que além de trabalhar também na VARIG, morava perto do aeroporto, então quando eu saía do serviço, quando não era dia de semana, eu ia pra casa dela, e de lá só saía por volta de uma da manhã, coisa típica da idade.

Um dia de domingo, saindo da casa da namorada, por volta da uma da manhã, eu estava no ponto de ônibus, esperando o ônibus que chamávamos de NEGREIRO, que era o último ônibus do dia. Era pegar aquele ônibus ou esperar amanhecer o dia para conseguir ir pra casa. Nesse dia não havia ninguém na rua, todo mundo recolhido para recomeçar tudo outra vez na segunda-feira pela manhã, quando vejo um sujeito sozinho empurrando um fusca. Ele empurrava e entrava no carro para aproveitar o embalo e tentar dar um “tranco” para fazer o carro pegar. Fiquei olhando aquela situação e pensando comigo mesmo: “ele não vai conseguir nunca fazer esse carro pegar”, isso porque quando ele conseguia entrar no veículo, o impulso que ele havia dado se acabava e o “tranco” não tinha força para fazer o motor girar.

Fiquei olhando aquilo e pensando: se eu não o ajudar, o cara vai morrer tentando e não vai conseguir. Correndo o risco do ônibus NEGREIRO passar e me deixar na “mão” corri até o sujeito e perguntei se ele queria que eu o ajudasse, no que ele imediatamente aceitou, e então ele ficou dentro do carro e eu empurrei até que o carro fez aquele barulho que estávamos esperando, eu pra deixar de empurrar e ele para sair daquela situação. Carro funcionando, eu havia terminado a minha parte, cabia a mim, voltar ao ponto de ônibus e esperar o NEGREIRO, só que fui interrompido pelo “amigo” que acabara de conquistar, que me perguntava para onde estava indo. O que lhe respondi: INTERLAGOS, bairro onde morava. Ele então me disse: estou indo praquelas bandas, entra aí que te deixo lá. Era muita sorte minha, pensei: empurrei o carro certo, na hora certa, já que o NEGREIRO não dava nem sinal que iria aparecer, aceitei a carona muito satisfeito.

Entrei e fui naquele veículo pensando: o sujeito ia pro mesmo lado em que eu morava, eu não ia pagar nada e ia chegar em casa mais rápido do que o NEGREIRO. O motorista era muito cordial, agradecendo a ajuda e fazendo perguntas, tudo corria melhor do que eu previa, mas isso só perdurou até ingressarmos na avenida 23 de maio, quando ouvi uma sirene bem atrás do fusca, seguido de um movimento do motorista que revelou um revólver na sua mão seguido de um tiro em direção ao carro da polícia, óbvio e evidente que aquilo me deixou absolutamente pasmo, sem reação e branco de medo. O tiro endereçado ao carro da polícia, foi imediatamente revidado com vários tiros em direção ao fusca, me deixando não em pânico, pois dessa fase eu já havia passado, me deixando super-aterrorizado, sem entender que diabos estava acontecendo, o que o motorista logo me revelou, fato que se eu não estivesse aterrorizado já devia saber, mas o terror vivido não me deixava raciocinar: ele acabara de furtar aquele veículo, e eu na minha inocência, havia ajudado a concretizar o furto, e estava agora ali, dentro do veículo, que recebia tiros da polícia, com um sujeito que eu nunca vira na vida, e o que é pior, na situação de cúmplice.

Narrar esse fato hoje pra mim é fácil. No dia e na hora, o pavor que eu vivi naquele momento, não dá para descrever, por mais que eu queira. Aquilo era algo absolutamente diferente na minha vida. Não sabia o que fazer, não sabia se gritava, se saltava do carro em alta velocidade, ou simplesmente deixava o fato acontecer. Eu era refém de uma situação absolutamente inacreditável. O sujeito imprimia uma velocidade ao fusca, que acho mesmo que a própria Volkswagen não sabia que o danado conseguia alcançar. Acho que aquela criatura viu o pavor, o desespero que eu vivia e me disse que ia me deixar na primeira oportunidade e que eu me preparasse para descer logo que ele diminuísse a velocidade, ele então fez uma manobra brusca a direita, que não sei mesmo porque não capotamos, e gritou: sai. Eu não sei de onde tirei coragem e saltei e ele então entrou numa rua e sumiu na escuridão.

Acho que naquele momento meu coração pulsava além da sua capacidade. Sentei no chão e comecei a chorar compulsivamente, não conseguia controlar o choro, acho que o medo se misturava com o desespero, com uma sensação de que a vida estava me alertando, dizendo que eu era ainda muito criança, apesar de me achar muito “adulto” na época.

Vivi, pois, esta fantástica aventura no mundo do crime, de forma absolutamente involuntária, mas fico imaginado, que se tivesse dado errado, poderia ter morrido ou preso na minha adolescência, e o que é pior com a fama de “ladrão de carro”, que eu nunca iria conseguir desfazer.

Essa é uma das narrativas que os amigos acham fantásticas e outros nem acreditam, acham que é brincadeira minha. Você leitor, tire suas conclusões.

(*) O autor é advogado e professor em Brasília. É um bom amigo e tem reputação ilibada. Agora, um detalhe: de vez em quando, mente (artisticamente, claro).

Um comentário:

  1. Essa do MENTE ARISTICAMENTE, foi de lascar, ri muito. Agora sei que você faz parte dos que não acreditam nas fantásticas aventuras vividas kkkk. Abs e valeu

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