sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Tony, vida de padreco



Fonseca Neto

Um dos mais cultos e didaticamente apetrechados entre os já muitos professores que tive na vida. 
Professor de Francês no ginásio, primeira série, primeiro dia de aula, sete da manhã: chega em nossa sala, e turma, toma uma barra de giz, desenha uma imagem no quadro e pergunta o que significa e todos dizem que aquilo é “um chapéu”.  
Deixa o suspense e então escreve: Antoine de Saint-Exupéry – “Le Petit Prince”. Contou, a seguir, a história de um francês, piloto-menino, e a narrativa que criou e se transformou na obra literária mais conhecida depois dos livros bíblicos de nossa tradição.
Assim ele começou o curso e, traduzindo o prenome do autor e o título da obra, apresentou-se a nós, dizendo que assim também se chamava,“Antonio”, e que ali viera como nosso professor de Francês: Antonio Luiz de Macedo Costa. Disse-nos que podíamos chamá-lo de Tony(assim a cidade de Colinas o conhecia). Para nós, professor Tony Macedo. E nos cochichos uns com os outros, a conversa de que ele, quase padre, deixara a batina para se casar. Era o início do ano letivo de 1967.
As décadas passaram. Há poucos dias, visitando ele Timon e Teresina, deixou-me uma preciosidade: “Minha Vida de Padreco”, um livro-memória de seu tempo de seminarista em Caxias e no Seminário da Prainha, no Ceará. Nele, um mergulho narrado e muito significativo quanto às apreensões que marcavam um candidato ao sacerdócio católico na década de 1950. Um capítulo muito especial da história desse que é, em mais de século e meio, no Brasil, um dos principais centros de formação de padres. 
Nessa “autobiografia do meu lado seminarista”, Tony diz de sua história, desde Colinas, Maranhão, cidade natal, até Fortaleza, onde o sobredito Seminário Maior. O convívio familiar e a decisão de ser o segundo padre da família – o irmão mais velho, José Manuel, já fora ordenado, e entrado no paroquiato da própria Colinas. Narra o papel de dona Didé e os bastidores de agruras e alegrias imensas de sua mãe oferecendo padres à Igreja. E o abatimento em face da desistência de um deles.
O ambiente seminarístico do tempo, por inteiro, vem referido, em curtos capítulos, em narrativas prazerosas de ler, em cinco partes: “Visão histórica da carreira: do ingresso ao abandono”; “Personagens, parceiros e coadjuvantes”; “Episódios pitorescos do cotidiano seminarístico”; “Um balanço – o que aprendi e o que aproveitei no Seminário”; “Lembranças especiais”. Distinga-se o que ele coloca sobre as bases e modos de como se dava a formação intelectual, humanística e postural de um sacerdote, necessariamente um esmerado leitor, na contemplação solitária imersa no silêncio e nas públicas liturgias. Um exegeta, no cogitar em busca do conhecimento de si, e da criatura humana, como instrumentos animados e sujeitos da fé. 
Tony dedica várias linhas à questão do drama pessoal do adolescente e jovem seminarista ante o celibato – afinal, um dos elementos a afastá-lo da experiência – e as impulsões de passar dos namoricos ao namoro, propriamente. Lembra o peso da batina preta vestindo um rapaz e a estranha atração desconcertante que isso desencadeava entre as mulheres-meninas. Em internatos de controles muito rígidos quanto às manifestações da sexualidade, lembra as angústias dos seminaristas, incompartilháveis, de amores platônicos e quase sempre destinadas ao confessionário –sim, a recorrência ao “in manu alivium”, “ex manus placere”.
A igreja perdeu um padre, mas a formação densa que obteve em nove anos estudando para sê-lo, o fizeram um pai, cidadão e educador de primeira qualidade. Na própria Colinas, partilhou com o irmão José Manuel, padre, uma exuberante experiência educacional – o Cinec, “novo sol no horizonte a nascer”.Em São Luís, do Cema e TV Educativa. Casou-se com Idesina Serra e Silva, de Timon, com quem tem cinco filhos: Sylvia Helena, Tony Júnior, Ana Beatriz, Marcus Vinicius e Jorge Gustavo. Foi para Minas, ali outro e belo horizonte em sua vida.Um mestre, na acepção de outro Tony que conheço em Teresina. Bravo!

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