sexta-feira, 22 de março de 2013

JÚLIO ROMÃO DA SILVA




Reginaldo Miranda
Presidente da Academia Piauiense de Letras


Faleceu na manhã de sábado(08/03), em sua residência, nesta cidade de Teresina, o escritor e acadêmico Júlio Romão da Silva, aos 96 anos de idade incompletos. Deixa viúva a d. Zélia Maria Melo Romão da Silva, com quem era casado desde alguns anos, e cinco filhos oriundos de outras duas uniões anteriores.
Homem de cor e de origem humilde, nasceu na cidade de Teresina, em 22 de maio de 1917, o mesmo ano de fundação da Academia, sendo filho de Luís Quirino da Silva e Joana Quirino da Silva. Órfão desde os quatro anos de idade foi criado pela avó, vivendo premido por necessidades financeiras.
Completada a idade escolar ingressou no colégio Demóstenes Avelino, onde cursou o ensino primário, passando, posteriormente, para a antiga Escola de Aprendizes Artífices, hoje Instituto Federal do Piauí(IFPI), cursando marcenaria, que concluiu em 1933, aos 16 anos de idade. No ano seguinte, em busca de oportunidades muda-se para São Luiz do Maranhão, onde passa a viver da marcenaria, profissão que tinha iniciado em Teresina. Todavia, em 1937, sem recursos financeiros, embarca clandestinamente no porão de um navio cargueiro, indo desembarcar no Rio de Janeiro, onde fixou residência e continuou a desenvolver a marcenaria.
Nesse novo domicílio, com enorme esforço e extraordinária força de vontade, venceu as dificuldades cursando o ensino ginasial no Colégio Matos e formando-se em Comunicação pela Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil. Então, passa a trabalhar no Jornal do Comércio, primeiro como revisor, depois como redator e editorialista. Consolidando seu nome como jornalista e intelectual, ainda teve passagem por outros órgãos da imprensa carioca, tais como O Malho, Diário Carioca, Vamos Ler, Revista da Semana e Dom Casmurro.
Concomitantemente à carreira jornalística e literária, foi servidor público federal, ingressando por concurso no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE), onde ocupou diversos cargos de direção.
Escritor engajado, ativista negro liderou diversos movimentos sociais no Rio de Janeiro.
Dedicou-se à literatura, publicando obras de real valor, que projetaram seu nome no cenário nacional. Publicou as seguintes obras: Os escravos(1947), O golpe conjurado(1950), Memória histórica sobre a transferência da capital do Piauí(1952), Luís Gama e suas poesias satíricas(1954), Vida e obra de Teodoro Sampaio(1955), A maçonaria, os destinos políticos do Brasil e a atualidade brasileira(1958), Santa Catarina: geografia, demografia, economia(1960), Geonomásticos cariocas de procedência indígena(1962), A parábola da ovelha(1963), Evolução do estudo das línguas indígenas do Brasil(1965), Denominações indígenas no toponbímica carioca(1966), A mensagem do salmo(1967), A família etnolinguística Bororo(1968), O monólogo dos gestos(1968), Zumbo-Zumbo(1969), A epopéia brasileira(1972), Solano Trindade(1974), Cera de carnaúba e cacau(1974), Cultura humanística em Portugal e arte biográfica(1975), Louvado seja Castro Alves(1975), José, o vidente(1975), Os índios Bororos: família etnolinguística(1980), Os anjos caídos(s/d), além de palestras e conferências.
Essa obra foi bem recebida pela crítica, sendo apreciada, entre outros, por Agripino Grieco, Alceu Amoroso Lima, Outro Maria Carpeaux, A. Tito Filho e M. Paulo Nunes. Foi reconhecido pela Academia Brasileira de Letras com os prêmios João Ribeiro(1962) e Cláudio Sousa(1972); pela Prefeitura de Teresina, com a Medalha do Mérito Cultural José Antonio Saraiva(1995); pelo Governo Piauí, com o diploma de Grão-Mestre da Ordem do Mérito Renascença do Piauí(1997) e pela Universidade Federal do Piauí, com o título de doutor honoris causa(2011), entre outras medalhas e condecorações. Recebeu os títulos honorários de cidadania carioca e fluminense, pela Câmara Municipal e Assembleia Legislativa do Rio. É nome de Rua no Bairro do Meier, no Rio de Janeiro. Reconhecendo seu talento, a Academia Piauiense de Letras o recebeu como titular da cadeira 31, em 21 de maio de 1990.
Por motivo de doença ultimamente ele vivia afastado das reuniões acadêmicas. Todavia, em 22 de dezembro passado o recebemos pela última vez na Academia, quando foi lançado o livro Júlio Romão da Silva – entre o formão, a pena e a flecha, com parte de sua obra e fortuna crítica, organizada pelos escritores Ací campelo e Elio Ferreira. Foi um dia de festa na Academia. Brevemente, faremos o seu panegírico, como manda o Estatuto da Casa. Será, portanto, mais uma homenagem ao aguerrido escritor. A Academia está de luto, porque perde um de seus mais expressivos membros.

2 comentários:

  1. Prezado conterrâneo Reginaldo Miranda:

    Vejo, pelo seu artigo - uma sínntese completa do percurso pessoal e intelectual do ilustre piauiense, acadêmico Julio Romão, recentemtne falecido, um autor múltplo, digno de ser conhecido pelas novas gerações de estudidosos piauienses e não piauienses, quer pela qualidade científica de algumas de suas obras, quer pela qualidade literária de outras, fazendo dele um intelectual completo e de notável saber.
    Aprendemos com o seu exemplo, como, no país, talento de escol e a força de vontade jamais impedem que um negro possa atingir uma gama de saberes graças à determinação, o esforço hercúleo de sobrepujar mesmo as condições de um berço humilde num país onde ainda persistem alguns vestigios de preconeitos.
    Júlio Romão, assim, faz parte da linhagem de grandes brasileiros que, não tendo nascido branco louro, de olhos azuis e de família abastada, conseguiram posição de relevo no mundo da cultura, das ideias, da ciência, como são tantos os exemplos, no passado e no presente, da história da inteligência brasileira.
    Comopartilho do sentimento geral e sincero dos membros dessa respeitada instituição cultural, que é a Academia Piauiense de Letras, pela perda lamentável desse eminente escritor e pelo vazio que deixa no conjunto dos seus membros-acadêmicos e aproveito o ensejo para transmitir os meus mais sentidos pêsames à família do Júlio Romão.
    Respeitosamente,
    Cunha ae Silva Filho
    24 de março de 2013 20:21

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