terça-feira, 18 de junho de 2013

As consagrações justapostas


Fonseca Neto

A cultura letrada de Teresina marcou ontem o encerramento vitorioso do Salipi. Evento da Fundação Quixote, com apoio de entes estatais e privados. Em seu décimo primeiro ano, trata-se de uma ideia e realização de pessoas que parece nasceram para erguer obras que desafiam os sonhos.

O 11º Salão foi dedicado ao escritor Manoel Paulo Nunes. Justa homenagem a um homem que faz da vida um caminhar guiado pela cintilação das letras. E que tanto amor e muita dedicação a elas o fizeram um prócere da Educação, ativo protagonista das políticas públicas atinentes ao processo educativo-escolar: um inspirado, confesso, em figuras de reformadores da estatura de Darcy Ribeiro e Anísio Teixeira. 

Num Salipi levando seu nome, muito oportuno que entre as dezenas de livros lançados, um, “Conversas com M. Paulo Nunes” (Edufpi), estudo biográfico, tivesse também o homenageado como centro. Publicação necessária ao conhecimento que dele devem ter a geração nascida nesta transição de séculos e as que virão.

O que mais dizer sobre ele, agora que podemos palavrear com os materiais de sua própria fala? Ou de sua vida e seu tempo narrados na escrita de Vanessa Negreiros?

Nunes nasceu há 87 anos completos, em Regeneração, filho da classe média local, condição que ajuda explicar seu contato com o universo letrado ainda quando criança. E nesse sentido vale anotar que naqueles anos de 1920 para 30, aquela microrregião do médio vale parnaibano – ancorada em Amarante –, era, ainda, um ninhal de agitadores letrados. Regeneração e Amarante que são, recorde-se, duas municipalidades constituídas em única ambiência histórica original, territorialmente definida por um aldeamento de nativos que a modernização pombalina – ainda que tardiamente – alcançou e “civilizou”, concedendo-lhe os foros de paróquia. Tessitura melhor explicada, assinale-se, pela veneração ao orago paroquial comum (São Gonçalo de Amarante) e pelos grupos familiares indistintos.

Aos 12 anos, veio ele para esta capital, aqui realiza sua vida escolar, formando-se em Direito. Não foi um estudante comum e justamente não o foi por suas propensões ao mundo literário, algo que o impulsionou a imergir, de cabeça, naquilo que significava então uma espécie de “cidadela das letras”, lugar de pessoas compenetradas e cúmplices no seu cultivo. Aos 19 anos ele se faz professor no sentido formal do termo. É, já, um letrado que publica. O ensaísmo crítico-literário o empolgará muito mais desde então.

Bacharel, professor militante e com vínculos politico-familiares, num Piauí/Brasil em que “a burocracia é a vocação de todos” – pensando com J. Murilo de Carvalho –, ingressa no Serviço Público, e o faz para atuar junto ao setor educacional, quando se destaca por suas funções na inspetoria federal de ensino, no Piauí. Engajamento que explica sua destacada participação, por exemplo, na implantação da rede CNEC no Estado, junto com dom Avelar Brandão Vilela, e também com este, na criação da Fundação Universidade Federal do Piauí.

Amigo próximo de Petrônio Portella, político que galgou funções proeminentes por aqueles anos, Nunes permaneceu próximo dele por bastante tempo, inclusive quando, ambos, serviram em Brasília – lugar das “solidões justapostas”, na poética de seu amigo Hindemburgo.

Um devotado homem de letras e sujeito de uma vontade mobilizadora enorme no campo cultural. Secretário de Estado da Cultura. Na APL é dos mais acatados entre seus membros, ocupante da cadeira 38, de João Ferry. E não é pequena a parcela da inteligência local que reconhece que seus mais de vinte anos como conselheiro junto ao Conselho Estadual de Cultura, antes de representar homenagem a um vocacionado, é reconhecimento de sua enorme capacidade de mover projetos. Daí a razão de ter sido eleito e reeleito, desde o governo Freitas Neto, até hoje, para a presidência desse órgão estatal. No tempo do petista Wellington Dias, alcançou a realização de um sonho grande nessa função: abrigar o CEC numa sede própria. Aliás, não somente uma sede, mas um Centro Cultural. Claro, contornou incompreensões, pois também é um mestre em vencê-las.

Justa homenagem fizeram os quixotes salipeiros. Que venha o Salipi-na-Ufpi de 2014.


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