quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

AS MISSIVAS DE ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES



12 de fevereiro   Diário Incontínuo

AS MISSIVAS DE ELISABETO RIBEIRO GONÇALVES

Elmar Carvalho

Não resisto à tentação de trazer para este Diário uma pequena carta internética, datada do dia nove, que me foi enviada pelo Dr. Elisabeto Ribeiro Gonçalves, neto do coronel Orlando Carvalho, reconhecido como um dos mais operosos prefeitos de Oeiras, terra natal do missivista. Ei-la, na íntegra:

“Prezado amigo e poeta (maior) ELMAR CARVALHO,

          Recebi neste final de semana o seu livro AMAR AMARANTE. Fiquei encantado com o presente e por algumas boas razões. Primeira delas, é que o livro é de sua autoria e isso nos dá a certeza de uma antecipada garantia de qualidade literária e estilística. Depois há uma razão, digamos sentimental: Amarante é o berço da família Ribeiro Gonçalves, pois lá se fixaram os três irmãos vindos de Portugal.
           Aliás, segundo sei, eram quatro irmãos, mas um foi para o sul e nunca mais ninguém teve notícias dele. Então a família nasceu lá e continuou lá por muito tempo, quando se dispersaram entre Oeiras, Teresina e Floriano, principalmente. Lá nasceram meus avós paternos, meu avô materno e meu pai, embora nascido em Manaus, voltou para lá ainda criancinha, com quatro anos, e viveu em Amarante até formar-se, quando foi exercer a Medicina em Oeiras, casando-se com minha mãe, oeirense.
            Amarante ainda tem a honra de ter dado ao Piauí o maior poeta brasileiro de todos os tempos.  Lembro-me de que num dos sonetos do vate amarantino ele canta Amarante dizendo que minha terra é um céu se há um céu sobre a terra. E tem um de seus versos (acho que de A Moenda) eleito o melhor e mais bonito de toda a poética de língua portuguesa: Saudade, asa de dor do pensamento.
            De modo, poeta, tenho motivos de sobra para ler o seu Amar Amarante com todo interesse, buscando nele o encanto, o prazer e a emoção que sua prosa, já minha conhecida, certamente vai me propiciar. Se não for pedir demais, peço-lhe que não se esqueça de mim, enviando-me, oportunamente, todo o produto de sua criação literária e poética.
            Ao ler e reler seu “Noturno de Oeiras” passei a entender o sentido do que Guimarães Rosa disse em seu Grande Sertão: Veredas: tem horas em que penso que a gente carecia, de repente, de acordar de alguma espécie de encanto. É isso aí, poeta: a leitura de sua obra me dá essa espécie de encanto, que a gente tenta esticar, prolongar, mesmo sabendo que devemos, embora a contragosto, fugir à magia e ao doce torpor desse deslumbramento.
            Abraços afetuosos, poeta, do amigo que o estima e admira muito, mesmo sem conhecê-lo.

           Elisabeto”

Consta que o grande poeta Augusto Frederico Schmidt, então proprietário de uma editora, ao ler um relatório do prefeito Graciliano Ramos, ficou com a convicção de que o alcaide deveria ter algum romance escondido em alguma gaveta. De fato Graciliano havia escrito seu romance Caetés, que Schmidt veio a publicar. Depois veio a série de obras importantes do grande ficcionista alagoano.

Da mesma forma, quando dona Anatália Gonçalves de Sampaio Pereira, sua irmã, me deu a ler uma carta do Dr. Elisabeto, fiquei com a desconfiança de que ele deve ter importantes textos guardados, que certamente merecem ser dados à estampa da publicidade.

Dona Anatália lhe remeteu o meu livro Noturno de Oeiras e outras evocações. Poucos dias depois, recebi uma carta, por e-mail, em que ele comentava com muita propriedade essa obra. O texto tinha algo de boa crítica literária, e muitos comentários e observações que somente um bom escritor e leitor arguto poderia fazer.

As cartas de Elisabeto são feitas com frases bem construídas, elegantes e gramaticalmente corretas, mas sem empolações e desnecessárias pulutricas estilísticas. Concisas, exatas, precisas, mas de denso conteúdo. Consoante se depreende de suas judiciosas observações e análises, de seus abalizados e pertinentes comentários, ele poderia ser, se o desejasse, um exímio cronista ou um notável ensaísta. 

Pelas intertextualizações, pelas referências a textos e autores, e pelas eventuais citações diretas, nota-se que Elisabeto é um leitor de largas, longas, profundas e meditadas leituras, cujas ressonâncias transparecem no teor de seus escritos e em seu estilo límpido, escorreito, rítmico. Não é somente um bom redator; é um estilista esmerado, atento, perfeccionista, que chega ao ponto de elidir o “que” (elipse), para que esse conectivo não tenha excessivas repetições num mesmo período.

De qualquer forma, suas cartas, pelo que me foi dado conhecer, merecem ser enfeixadas em livro. Aliás, muitos escritores tiveram suas missivas organizadas e editadas. Algumas dessas publicações são compostas de dois ou mais literatos que trocavam correspondências. Muitos desses textos são tidos como grandes obras literárias, por suas observações, reflexões, análises, críticas, depoimentos, comentários a fatos ou obras de arte. As cartas de Elisabeto contêm todos esses ingredientes, tudo vazado em refinada linguagem.  

Mário de Andrade era um incansável missivista. Enviava cartas para diversos escritores, tecendo comentários, emitindo sugestões, apresentando palavras de estímulo e encorajamento. Tento imaginar o que ele faria hoje, com as facilidades proporcionadas pela internet, através de sites, blogs, e-mails e facebook. Godofredo Rangel e Monteiro Lobato se corresponderam por 40 anos. Li uma dessas missivas. Era uma verdadeira obra de arte, e me comoveu e encantou.


As cartas do Dr. Elisabeto Ribeiro Gonçalves, médico como seu pai, um dos mais respeitados oftalmologista de Belo Horizonte, são verdadeiras obras-primas, pelas qualidades que lhes ressaltei acima, e por reunirem atributos de crônicas, ensaios, memórias e artigos, merecem ser compiladas em volume impresso, ainda que ele julgue necessário fazer uma seleta dessas excelentes missivas.   

Um comentário:

  1. Dr Elisabeto, fiquei muito grato aos familiares do Dr Paulo de Tarso Ribeiro Gonçalves, por terem publicado o Sonetoi de nossa autoria:
    "Médicos do sertão"
    I
    "Ser médico é ser um Sacerdote
    É cuidar coim carinho dos outros
    Exercer a profissão de médico no interior,
    É mais que um sacerdócio, é uma atitude superior.
    II
    "As belas hist(est)orias, do Dr Paulo de Tarso,
    Isaias Coelho, Raul Macedo e outros,
    Deixam a medicina cheia de glórias,
    Fazendio acreditar em passado de vitórias.
    III
    "Pouca tecnologia, muita atenção nas histórias,
    Exame clínico esmerado, paciência e dedicação,
    Levando com suas habilidades condutas exitosas.
    IV
    "Dr Paulo de Tarso, nos ajude nesta empreitada!
    Que a medicina, volte a ser uma profissão humanizada,
    Que p Médico, exerce-a com amor e conduta ilibada!"

    Um abraço José Itamar abreu Costa
    Cardiologiusta
    Presidente da sociedade Norte e Nordeste de Cardiologia
    Vice-presienrte da Academia de Medicina do Piauí

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