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FALSA DEMOCRACIA RACIAL
Desembargador Valério Chaves Pinto
Passados
129 anos do fim da escravidão negra no Brasil, a sociedade brasileira,
infelizmente, ainda não conseguiu mudar o modo como lidar com o drama de sua
penosa ascensão de escravo a assalariado e a cidadão, sob a dureza do
preconceito racial discriminatório e perverso.
Recentemente
a imprensa brasileira noticiou que a piauiense Monalysa Alcântara foi eleita
Miss Brasil-2017. Apesar do reconhecimento unânime dos jurados, a jovem de 18
anos, por ser negra, passou a ser vítima de ofensas racistas e de ódio nas
redes sociais por parte de quem desconhece que somos uma nação etnicamente
unificada falando a mesma língua e coesa numa mesma cultura e nos seus valores
maiores.
Mas não
é somente nos concursos de beleza que a prática do preconceito tem se manifesta
como uma praga na humanidade.
Historicamente,
sabe-se que este mal tem moldado os povos ao longo dos tempos. No estudo dos
filhos de Abraão (Isaque e Jacó) vemos que muitos povos foram escravizados
devido às suas diferenças – vistos como grupo do mal ou raças inimigas. Mas é
na própria Bíblia onde vamos encontrar a resposta para o racismo: “Não pode
haver judeu nem negro; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque
todos vós sois um Cristo Jesus” (Gálatas, 3, 28). “Para com Deus não pode
existir acepção de pessoas” (Atos, 10,34) e (Romanos, 2,11).
No
Brasil, apesar de inserido no texto constitucional (art. 5º, XLII) como crime
inafiançável e imprescritível, são recorrentes os episódios de racismo nas
ruas, nas escolas, no trabalho, nas redes sociais, nas competições esportivas,
principalmente em jogos de futebol onde alguns torcedores do alto de sua
ignorância, a pretexto de abalar o psicológico de jogadores adversários de pele
negra, assobiam ou fazem gesticulação com o corpo imitando macaco.
Recentemente
uma mulher cliente de um salão de beleza em Brasília, se recusou a ser atendida
por uma manicure negra sob a alegação de que era preta demais para arrumar as
unhas dela.
Um
relatório das Organizações das Nações Unidas divulgado em 2015, aponta que no
Brasil o racismo é “estrutural e institucional”. De acordo com a ONU, nosso
país vive em uma falsa democracia racial, que nega a existência do racismo
devido à miscigenação entre diferentes povos e raças. O último Censo
Demográfico revela que o preconceito de
cor se manifesta de forma cordial, ou seja, finge-se que o problema não existe.
Com o
mapeamento do nosso código genético decifrado pelo método DNA, a ciência provou
que, na verdade, a teoria de diferenciação da espécie humana por
características físicas (cor da pele,
textura do cabelo, formato dos olhos e nariz) é efêmera. O que existe são
variações genéticas de que se valem mentes vesanas para estimular o preconceito
étnico nos seus vários degraus.
A
Constituição da UNESCO, ao confirmar sua adesão aos princípios proclamados na
Carta das Nações Unidas (1948) determina que “a grande e terrível guerra que
acaba de terminar não teria sido possível sem a negação dos princípios
democráticos, da igualdade, da dignidade e do respeito mútuo entre os homens, e
sem a vontade de substituir tais princípios, explorando os preconceitos e a
ignorância, pelo dogma da desigualdade dos homens e das raças”.
A advertência
constitucional nos mostra de forma bem nítida, que todos os povos e todos os
grupos humanos, independentemente de sua origem étnica ou diversidade de forma
de vida, cor ou condição social, contribuem para o progresso das civilizações,
não podendo sob qualquer alegação, servir de pretexto a preconceitos raciais
nem legitimar práticas discriminatórias causadoras de estragos no mundo, na
medida em que quando alguém se refere ao racismo de forma explícita, não só
está praticando uma agressão, como um hediondo crime contra a humanidade
Hoje,
com o avanço da antropologia e da sociologia, não há mais espaço para
considerar “raça superior” como querem alguns desavisados.
Com
efeito, além de um simples gesto para humilhar um ser humano, seja miss Brasil, seja trabalhador da
bola ou não, só porque é diferente na cor da pele, o que mais assusta, é a
concentração do ódio alimentando a alma de gente sem visão de um dos maiores
valores do gênero humano: o pleno estabelecimento da paz entre os povos.
(Agosto/2017)
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