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A PROPÓSITO DE DOIS PEQUENOS POEMAS
Alcenor Candeira Filho
Há tempos publiquei um artigo relacionado
com o poema “Carga”, que apresenta vinculações com elementos da vida cotidiana
e que vem se destacando no conjunto da minha obra poética, a ponto de merecer
referências e transcrições em livros, jornais, revistas, comentários em salas
de aula, cartões postais, exposições em varais de poesia e declamações em
recitais. Eis o poema:
“Carrego uma
carteira de identidade
e mais outra de
motorista
um título de
eleitor
um certificado de reservista
um cartão de CPF
uma certidão de
nascimento
e outra de
casamento
um diploma de
bacharel
um seguro de vida
(em todos eles
ALCENOR RODRIGUES CANDEIRA FILHO)
carrego uma calça
(uns trocados no
bolso)
uma camisa
uma cueca
um sapato
muitas chaves
um automóvel
e um relógio
- e mais o peso
abstrato da existência.”
Escrito em 1975, o poeminha se fez espontaneamente, sem grande
esforço. Aliás, os motivos prosaicos da vida, tão presentes em “Carga”, me
inspiraram no mesmo dia o poema “Este Esta”, onde igualmente objetos de uso
cotidiano são enumerados:
“este sapato me
aperta
este relógio me
espreme
esta gravata me
sufoca
este paletó me
abafa
esta calça me
atormenta
esta cueca me
enche o saco
- vontade de ser
nu!”
Em 1976 o jornal
teresinense O ESTADO publicou três poemas de minha autoria, todos curtos e
motivados em fatos e/ou personagens do dia a dia: “Carga”, “Registro” e “Aquele Menino”.
Essa transcrição seria o marco inicial de várias outras, que fazem de “Carga” o
mais divulgado de meus poemas.
Em 1978, “Carga” figurou em
AVISO PRÉVIO, antologia poética editada em Teresina pela Livraria e Editora
Corisco e Grupo Andreas de Ensino, reunindo poemas de Paulo Machado, Afonso
Lima, Ral, Cineas Santos, João de Lima, Meneses & Moraes, Alcenor Candeira
Filho e Rubervam du Nascimento.
O jornal paulista SAGA, por
indicação de Fontes Ibiapina, também publicou o poema, na edição nº 04.
O pequeno poema foi transcrito em 1985 no livro POEMÁGICO: A
NOVA ALQUIMIA, antologia que contém poemas de Paulo Veras, Alcenor Candeira
Filho. V. de Araújo, Jorge Carvalho e Elmar Carvalho, editada pelo Projeto
Petrônio Portella/Secretaria da Cultura, Desportos e Turismo. Comentando essa obra, o escritor Renato Castelo Branco destaca
“Carga” como um dos melhores momentos de minha participação na coletânea, onde
se encontra, segundo ele, “depois do
hermetismo das chamadas escolas de
vanguarda (...) uma retomada da verdadeira poesia, um reencontro com a beleza, sem artificialismo, vigorosa,
meridiana, sensível, humana.”
No natal de 1979, o Sistema Integrado de
Comunicação O DIA distribuiu entre clientes e assinantes belíssimo cartão de
natal e ano novo em que, além de fotografias coloridas de uma peça de
artesanato do mestre Dezinho e de uma tela de Dora Parente, figuram poemas de
autores piauienses, inclusive “Carga”.
Através do jornal O DIA (1990), em matéria
denominada “Esses Imortais Provincianos”, o jornalista Abdias Silva, piauiense
que morou em Brasília. refere-se a
alguns intelectuais do Piauí (H. Dobal, Wilson Brandão, A. Tito Filho), incluindo no
artigo a minha pessoa, lembrada exatamente pela transcrição do poema “Carga”, a
propósito do qual declara: “Pouca gente consegue extrair de elementos prosaicos
como seus documentos e suas roupas uma expressão tão poética para a carga da
existência.”
O jornal parnaibano A LIBERTAÇÃO também
publicou o poema em 1990.
No livro
ANOS 70: POR QUE ESSA LÂMINA NAS PALAVRAS?, de José Pereira Bezerra,
editado em 1993 pela Fundação Cultural Monsenhor Chaves, foram transcritos oito dos dezenove versos que compõem o poema, com o seguinte
comentário: “Em CARGA, de Alcenor Candeira Filho, essa inquietação e ansiedade
chegam ao paroxismo de um mal estar existencial (...) em que os aparatos
identificadores de um cidadão de classe média representa um peso amorfo, que se
soma ao peso do vazio da própria existência, revelando um sentido crítico
diante do mundo.”
Em 1995, “Carga” chama a atenção mais uma
vez, abrindo a série de composições de minha autoria na mais importante
antologia poética piauiense - A POESIA PIAUIENSE NO SÉCULO XX -, organizada por Assis Brasil e publicada
pela Imago Editora Ltda, em convênio com a Fundação Cultural Monsenhor Chaves.
Não sei a que atribuir o pequeno sucesso
do minúsculo poema. Através da enumeração de simples objetos impostos pelo
mundo do consumo e da burocracia em que vive sufocado o homem moderno, o
poeminha encerra forte carga emocional ao tangenciar uma temática complexa de
natureza transcendental. É sem dúvida um poema interessante, simples,
despojado, comunicativo, conciso. Já
escrevi poemas mais extensos e qualitativamente superiores. Mas nenhum
tem sido mais mencionado do que “Carga”.
Agora falarei de outro pequeno poema de
minha autoria - “Sonetilho”
- que também vem merecendo
especial atenção de artistas e professores.
“Sonetilho” foi escrito em 2013 e figura na catracapa de meu livro
PARNAÍBA: MEU UNIVERSO, cuja capa foi criada pelo grande artista parnaibano
Fernando Castro, bem como no livro-álbum PARNÁRIAS: POEMAS SOBRE PARNAÍBA,
organizado em 2017 pelos poetas Alcenor Candeira Filho, Elmar Carvalho e pelo
fotógrafo e escritor Inácio Marinheiro.
Em caricatura feita por Fernando Castro em
que sou retratado com camisa do Flamengo sentado em banco da praça da Graça ao
lado do Monumento da Independência, o primeiro quarteto de “Sonetilho” foi
evidenciado.
O poeminha foi traduzido para o inglês
pelo professor Augusto Santos e apresentado em 2017 em evento internacional
promovido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Segue o poema na versão original e na
tradução:
SONETILHO
“a cidade
é o cimento
que concreta
a vida.
berço-cama-mesa
universo
e verso
reais
beira rio
beira vida
- Parnaíba
minha vida
concreta
e completa.”
TRADUÇÃO
“the city
is the cement
that concretes
life.
crib-bed-table
real
universe
and verse
border river
border life
- Parnaíba
my life
concrete
and
complete.”
Recentemente “Sonetilho” foi musicado pelo
maestro Beetholven Cunha, pernambucano radicado em Parnaíba. O trabalho do
maestro será brevemente apresentado ao público pelo Coral da Cidade/Projeto
Corais do Mar.
Assisti no SESC/Caixeiral a um dos ensaios
do coral comandado pelo grande maestro e fiquei bastante emocionado com o que
vi e ouvi.
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