segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

A PROPÓSITO DE DOIS PEQUENOS POEMAS


Fonte: Google

A PROPÓSITO DE DOIS PEQUENOS POEMAS  

Alcenor Candeira Filho

     Há tempos publiquei um artigo relacionado com o poema “Carga”, que apresenta vinculações com elementos da vida cotidiana e que vem se destacando no conjunto da minha obra poética, a ponto de merecer referências e transcrições em livros, jornais, revistas, comentários em salas de aula, cartões postais, exposições em varais de poesia e declamações em recitais. Eis o poema:

               “Carrego uma carteira  de identidade
               e mais outra de motorista
               um título de eleitor
               um certificado de reservista
               um cartão de CPF
               uma certidão de nascimento
               e outra de casamento
               um diploma de bacharel
               um seguro de vida
               (em todos eles ALCENOR RODRIGUES CANDEIRA FILHO)
               carrego uma calça
              (uns trocados no bolso)
              uma camisa
              uma cueca
              um sapato
              muitas chaves
              um automóvel
              e um relógio
              - e mais o peso abstrato da existência.”

     Escrito em 1975,  o poeminha se fez espontaneamente, sem grande esforço. Aliás, os motivos prosaicos da vida, tão presentes em “Carga”, me inspiraram no mesmo dia o poema “Este Esta”, onde igualmente objetos de uso cotidiano são enumerados:

               “este sapato me aperta
               este relógio me espreme
               esta gravata me sufoca
               este paletó me abafa
               esta calça me atormenta
               esta cueca me enche o saco

              - vontade de ser nu!”

     Em 1976 o jornal teresinense O ESTADO publicou três poemas de minha autoria, todos curtos e motivados em fatos e/ou personagens do dia  a dia: “Carga”, “Registro” e “Aquele Menino”. Essa transcrição seria o marco inicial de várias outras, que fazem de “Carga” o mais divulgado de meus poemas.
     Em 1978, “Carga” figurou em AVISO PRÉVIO, antologia poética editada em Teresina pela Livraria e Editora Corisco e Grupo Andreas de Ensino, reunindo poemas de Paulo Machado, Afonso Lima, Ral, Cineas Santos, João de Lima, Meneses & Moraes, Alcenor Candeira Filho e Rubervam du Nascimento.
     O jornal paulista SAGA, por indicação de Fontes Ibiapina, também publicou o poema, na edição nº 04.
     O pequeno poema  foi transcrito em 1985 no livro POEMÁGICO: A NOVA ALQUIMIA, antologia que contém poemas de Paulo Veras, Alcenor Candeira Filho. V. de Araújo, Jorge Carvalho e Elmar Carvalho, editada pelo Projeto Petrônio Portella/Secretaria da Cultura, Desportos e Turismo.             Comentando essa obra,  o escritor Renato Castelo Branco destaca “Carga” como um dos melhores momentos de minha participação na coletânea, onde se encontra, segundo  ele, “depois do hermetismo das chamadas escolas  de vanguarda (...) uma retomada da verdadeira poesia, um reencontro  com a beleza, sem artificialismo, vigorosa, meridiana, sensível, humana.”
     No natal de 1979, o Sistema Integrado de Comunicação O DIA distribuiu entre clientes e assinantes belíssimo cartão de natal e ano novo em que, além de fotografias coloridas de uma peça de artesanato do mestre Dezinho e de uma tela de Dora Parente, figuram poemas de autores piauienses, inclusive “Carga”.
     Através do jornal O DIA (1990), em matéria denominada “Esses Imortais Provincianos”, o jornalista Abdias Silva, piauiense que morou em Brasília.  refere-se a alguns intelectuais do Piauí (H. Dobal,  Wilson Brandão, A. Tito Filho), incluindo no artigo a minha pessoa, lembrada exatamente pela transcrição do poema “Carga”, a propósito do qual declara: “Pouca gente consegue extrair de elementos prosaicos como seus documentos e suas roupas uma expressão tão poética para a carga da existência.”
     O jornal parnaibano A LIBERTAÇÃO também publicou o poema em 1990.
     No livro  ANOS 70: POR QUE ESSA LÂMINA NAS PALAVRAS?, de José Pereira Bezerra, editado em 1993 pela Fundação Cultural Monsenhor Chaves, foram transcritos  oito dos dezenove versos  que compõem o poema, com o seguinte comentário: “Em CARGA, de Alcenor Candeira Filho, essa inquietação e ansiedade chegam ao paroxismo de um mal estar existencial (...) em que os aparatos identificadores de um cidadão de classe média representa um peso amorfo, que se soma ao peso do vazio da própria existência, revelando um sentido crítico diante do mundo.”
     Em 1995, “Carga” chama a atenção mais uma vez, abrindo a série de composições de minha autoria na mais importante antologia poética piauiense  -  A POESIA PIAUIENSE NO SÉCULO XX  -, organizada por Assis Brasil e publicada pela Imago Editora Ltda, em convênio com a Fundação Cultural Monsenhor Chaves.
     Não sei a que atribuir o pequeno sucesso do minúsculo poema. Através da enumeração de simples objetos impostos pelo mundo do consumo e da burocracia em que vive sufocado o homem moderno, o poeminha encerra forte carga emocional ao tangenciar uma temática complexa de natureza transcendental. É sem dúvida um poema interessante, simples, despojado, comunicativo, conciso. Já  escrevi poemas mais extensos e qualitativamente superiores. Mas nenhum tem sido mais mencionado do que “Carga”.
     Agora falarei de outro pequeno poema de minha autoria  -  “Sonetilho”  -  que também vem merecendo especial atenção de artistas e professores.
     “Sonetilho” foi escrito em  2013 e figura na catracapa de meu livro PARNAÍBA: MEU UNIVERSO, cuja capa foi criada pelo grande artista parnaibano Fernando Castro, bem como no livro-álbum PARNÁRIAS: POEMAS SOBRE PARNAÍBA, organizado em 2017 pelos poetas Alcenor Candeira Filho, Elmar Carvalho e pelo fotógrafo e escritor Inácio Marinheiro.
     Em caricatura feita por Fernando Castro em que sou retratado com camisa do Flamengo sentado em banco da praça da Graça ao lado do Monumento da Independência, o primeiro quarteto de “Sonetilho” foi evidenciado.
     O poeminha foi traduzido para o inglês pelo professor Augusto Santos e apresentado em 2017 em evento internacional promovido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
     Segue o poema na versão original e na tradução:

              SONETILHO

               “a cidade
               é o cimento
               que concreta
               a vida.

               berço-cama-mesa
               universo
               e verso
               reais

               beira rio
               beira vida
               -  Parnaíba

               minha vida
               concreta
               e completa.”


                TRADUÇÃO

               “the city
               is the cement
               that concretes
               life.

               crib-bed-table
               real
               universe
               and verse

               border river
                border life
                -  Parnaíba

               my life
               concrete
               and complete.”    
                       
     Recentemente “Sonetilho” foi musicado pelo maestro Beetholven Cunha, pernambucano radicado em Parnaíba. O trabalho do maestro será brevemente apresentado ao público pelo Coral da Cidade/Projeto Corais do Mar.
     Assisti no SESC/Caixeiral a um dos ensaios do coral comandado pelo grande maestro e fiquei bastante emocionado com o que vi e ouvi.          

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