Fonte: Google |
O êxodo
(enxerto extraído de Canto da
terra mártire)
Martins Vieira (1905 - 1984)
Inóspito sertão! Desoladas
caatingas
de vãs superstições, bruxedos e
mandingas
de duendes a carpir amaldiçoadas
penas...
A voz dos candomblés, das rezas,
das novenas.
crendices, benzições, dos hinos
das igrejas,
sumiu-se, acompanhando as
fosfinas andejas...
O êxodo começa! A secura dos ares
vem franzir no semblante as rugas
dos esgares,
bem como se encolheu a bolsa dos
minguados
vinténs, para trazer os ventres
sossegados.
Lá vem a procissão sem fim dos
retirantes:
São formas espectrais das fomes
ambulantes,
sustidas, por milagre, em tão
fanadas pernas...
Roncam peitos sem dor, sacudindo
as cavernas...
sangrando estão seus pés e as
unhas reviradas
vão “estrelando em sangue” o solo
das estradas.
Mais uma vez, o Sol nasceu. Ei-lo
que brilha.
Carrega-se de novo a reforçada
pilha
que faz enlouquecer os nervos
mortais...
Chumbou-se-lhe no peito o horror
do “nunca mais”
naquela martelada hostil que além
se alonga –
fantástica, febril, – o grito da
araponga!
Foi rude esse momento. O
retirante verga!
Recorda, com saudade, a
pobríssima enxerga,
em que nasceu, cresceu, feliz,
entre os mais velhos.
O golpe o derribou; fê-lo cair de
joelhos
e a mão que, pressurosa, ia
benzer-lhe o rosto,
desceu, grampando ao solo as
unhas, com desgosto.
(Fonte: A poesia piauiense no
século XX, de Assis Brasil)
Nenhum comentário:
Postar um comentário