segunda-feira, 21 de outubro de 2024

A. Tito Filho – um breve depoimento

Primeira edição de Rosa dos Ventos Gerais, já em 3ª edição

 

A. Tito Filho – um breve depoimento (*)

 

Elmar Carvalho

 

Conheci o escritor e professor José de Arimathéa Tito Filho, ou simplesmente A. Tito Filho, seu nome literário, desde meados de 1985. Morando em Teresina desde agosto de 1982, quando assumi meu emprego na extinta Sunab, costumava passar de motocicleta na frente da antiga sede da Academia Piauiense de Letras, da qual ele era presidente. Porém, nunca adentrei esse imóvel.

Em 1985 a APL adquiriu sua sede própria, situada na Avenida Miguel Rosa, 3300 – Centro Sul, através de doação do Estado do Piauí, quando eram governador do Estado e secretário estadual da Cultura, respectivamente, Hugo Napoleão e Jesualdo Cavalcanti, que se tornaram mais tarde membros do sodalício. A partir dessa época passei a frequentar o belo e sobranceiro sobrado solarengo em que A. Tito Filho dava expediente todo dia.

Recebia-me com alegria. Entretínhamos animada conversa, de conteúdo literário, mas recheada de “causos” ou episódios anedóticos, em que figuravam importantes personalidades de nossa literatura. Nessa prática o professor destilava seu humor, salpicado de finas ironias. Muitas vezes minha visita foi registrada no Notícias Acadêmicas, boletim mensal que ele publicava com regularidade.

Prefaciou inúmeros livros. Em sua coluna literária, em jornais de Teresina, emitiu comentários sobre centenas de obras e autores, mas sem ferir a suscetibilidade de quem quer que fosse. Comentava-se que quando a obra não tinha mérito literário, ele falava sobre a personalidade e biografia do autor, ou sobre os temas abordados no livro. De qualquer sorte, todos ficavam felizes em merecer uma resenha ou comentário de A. Tito Filho.

No primeiro governo de Alberto Silva coordenou o ousado Plano Editorial do Estado do Piauí, em que foram publicadas dezenas de obras importantes e emblemáticas da literatura piauiense. Para várias dessas obras ele elaborou abalizados comentários críticos, além de ricas notas esclarecedoras, interpretativas ou de caráter elucidativo, filológico e biográfico.  

Um dia em que eu conversava com ele, um velho intelectual piauiense, de saudosa memória, já um tanto debilitado pela idade, lhe perguntou se a pronúncia correta da palavra nascimento era “nacimento” ou “naiscimento”. O mestre lhe respondeu com uma pergunta: “Entre o a e o s existe um i?” O consulente lhe respondeu que não. Ele simplesmente acrescentou: “Então, você já tem a resposta”. Isso demonstrava a vivacidade, a verve e a suave ironia bem-humorada do grande mestre, erudito e filólogo.

Nasceu em Barras, em 14 de outubro de 1924, e faleceu em Teresina, em 27 de junho de 1992. Portanto, aos 68 anos incompletos. Era filho de Arimathéa Tito e Nize do Rego Tito. Órfão desde o nascimento, pois sua mãe morreu em virtude de complicação no parto. Exerceu vários e importantes funções e cargos públicos, entre os quais os de secretário estadual da Educação e da Cultura, mas foi sobretudo professor de Português, escritor e filólogo. Escreveu inúmeros livros, entre os quais  Teresina, meu amor, Gente & humor, Sermões aos peixes, Memorial da Cidade Verde, Praça Aquidabã, sem número e Crônicas da cidade amada.

Contudo, a sua obra magna talvez tenha sido exercer a presidência da APL, por mais de vinte e um anos, com invulgar competência e total dedicação; nisso se esmerou.  Segundo Wilson Carvalho Gonçalves, ilustre escritor e historiador barrense, de quem tive a honra de ser amigo e de lhe prefaciar e apresentar vários livros, ele foi “uma das maiores culturas do seu tempo, liderou a vida cultural piauiense durante três décadas. Era um animador e um incentivador da vida cultural piauiense”.  

Eu mesmo posso dizer que fui estimulado por ele. Um dia, perto de sua morte, numa de minhas visitas habituais, em seu gabinete na APL, ele me disse que eu era um amigo da Academia, e que já estava me tornando um “academiável”. Em seguida, me recomendou enfeixasse meus poemas em um volume, porquanto desejava publicá-los. Fiz o que ele me recomendou. Meses depois, ele morreu. Contei esse diálogo ao professor Paulo Nunes, seu sucessor, que me disse manteria a promessa de A. Tito Filho, mas desde que meu livro fosse submetido ao Conselho Editorial da entidade. Em 1995 esse livro, a que dei o nome de Rosa dos Ventos Gerais, foi editado, através de parceria entre a APL e a UFPI. Foi meu primeiro livro individual. Antes eu tivera participação em várias coletâneas e antologias, mas nunca em um livro exclusivamente de minha autoria. O seu aceno inicial de que “já estava me tornando academiável” , veio a se concretizar em 2008, quando me tornei membro efetivo da APL.

Sou muito grato ao notável intelectual, orador, erudito e escritor A. Tito Filho, cronista e filólogo de escol, de quem tenho gratas e felizes recordações. E dele sinto saudades; por isso o tenho sempre presente em minha lembrança.

(*) Pronunciado em Barras, no dia 19/10/2024, no V SARAU COLETIVIZANDO CULTURA, promovido pelo grupo Coletivo de Leitura.

6 comentários:

  1. Grande cidadão ,cronista escritor,jornalista conseguiu uma sede própria da APL.Aqui no museu D.Avelar tem uma sala em homenagem a ele era muito amigo do padre Pedro Maione.

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  2. Bom dia, Elmar, não conhecia a biografia desse escritor. Belo texto.
    Everardo-Parnaíba

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  3. Obrigado pelos comentários, caros amigos.

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  4. Parabéns Elmar por tantos trabalhos publicados fazendo história.

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