O MUSEU DO SÍTIO BOA ESPERANÇA
Elmar Carvalho
Através do mais recente número da
revista Nossa Gente, editada pelo jornalista Raimundo Belchior Neto, tomei
conhecimento da existência de um museu, instalado no sítio Boa Esperança, de
propriedade do senhor Antônio Conrado. Decidi que em minha primeira viagem a
Campo Maior iria conhecê-lo, fato que aconteceu no domingo. A reportagem
informava que o sítio ficava no quilômetro 29 da estrada que vai para Barras.
Como meu pai não tivesse
conhecimento a esse respeito, consultei o Dedé, vizinho de sua casa na rua
Capitão Félix, perto do estádio. O Dedé simplesmente sabia tudo e foi preciso
nas informações. Disse que o sítio ficava perto da estrada, e era de bom e fácil
acesso. Com esse esclarecimento, em companhia do Antônio José, meu irmão, e do
amigo Zé Francisco Marques, dirigi-me para lá. Fui recebido cortesmente pelo
proprietário.
A antiga sede da fazenda é como
se fizesse parte do museu, com o seu babaçual, suas grandes árvores e plantas
ornamentais, e a gruta onde está entronizado o santo da devoção dos donos da
casa. O museu propriamente dito fica num prédio próximo, independente. Ali
estavam antigos móveis e objetos, que eu já não via há muitos anos; objetos que
foram úteis e preciosos, mas que se tornaram obsoletos ou fora de moda, com as
novas invenções e a mudança de gostos e costumes. Numa prateleira estavam
enfileirados rádios de vários modelos, alguns a válvula, além dos famosos Semp
e ABC.
Este último ostentava o seu
slogan “a voz de ouro”, que marcou gerações. Sobre uma rústica bancada estavam
enfileirados vários ferros de engomar, a carvão, que ainda alcancei em pleno
uso. Entre outros objetos, vi baús, bilheiras e um grande e pançudo pote.
Recordei os velhos petromax, que iluminavam as noites sertanejas. Entre os
objetos artesanais e mais rústicos, havia um imenso pilão horizontal, de vários
furos; um corró, que é uma armadilha de varas para pegar peixes; uma tora de
madeira oca, em cujo interior havia uma armadilha para prender pebas e tatus.
O senhor Antônio Conrado, em
conversa, contou que havia vendido alguns dos objetos, mas depois os comprou de
volta, para o acervo do museu. Revelou que um dos novos proprietários se
recusou a fazer a retrovenda de um móvel; disse preferir doá-lo, para que seu
nome constasse na ficha de identificação da peça. O engraçado é que esse
proprietário tem o sobrenome Grosso, mas pelo visto trata-se de pessoa fina e
educada, para ter essa sensibilidade e percepção.
Contemplei uma grande e velha
cadeira de outrora. Era numa delas, sem dúvida, que os coronéis da carnaúba, do
tucum, do babaçu e demais produtos do extrativismo e do gado ditavam suas
ordens e suas leis, num tempo mais simples, em que não havia tanta pressa e
tanto estresse. É certo que alguns desses objetos existiam na casa de meus
pais, mas foi um prazer reencontrá-los, para poder viajar ao país de minha
infância.
Na ida e na volta, vimos algumas
secas cabeças d'água do Surubim, como disse Dobal, num de seus poemas. São
riachos temporários, que, nas grandes invernadas, extravasam suas águas, após
dois ou três dias de boas chuvas, mas que, tão logo estas cessem, param de
correr, quase instantaneamente, deixando um leito de pedras e areias, sem
nenhuma poça d' água. Vimos as Extremas, de nome tão sugestivo e poético. Numa
época em que todos têm o seu carro ou sua motocicleta, em que as distâncias
encurtaram demasiadamente, já não entendemos a razão desse nome tão extremado.
Passamos pelas Areias, do
falecido fazendeiro Zé Pedro. Ele era um dos coronéis da pecuária e do
extrativismo. Numa época em que poucos podiam comprar um automóvel, ele sempre
teve o seu, com motorista particular. Gostava de tomar, de leve, a sua cerveja,
num dos barzinhos da cidade, sozinho, a ruminar seus pensamentos. Para que se
tenha uma ideia de suas posses e cabedais, basta que eu diga que ele, em
companhia de sua mulher, ia ao exterior, para assistir à Copa do Mundo de
Futebol, numa época em que viajar de avião era um misto de aventura, luxo e
glamour.
Antes do bairro Flores, de nome
poético, florido e cheiroso, no sentido de quem vai de Cabeceiras para Campo
Maior, nos deslumbramos com a alcatifa das suaves colinas e com os tabuleiros
de capim mimoso, onde as ovelhas pastam placidamente. Nessa paisagem ainda
podemos ver os galopes dos potros e ouvir o relincho das éguas e o canto alegre
dos bem-te-vis. Ao longe, podemos vislumbrar o debrum do perfil azulado da
serra a se recortar contra o azul do céu e o branco das nuvens. E o pensamento
vaga e divaga por essas quebradas encantadas.
16 de novembro de 2010
Bom dia, ilustre!
ResponderExcluirMuito obrigado por divulgar o Museu.
Pesquisei algumas fotos no Instagram oficial (Museu Antônio Conrado) e encontrei peças realmente interessantes.
E sobre o capim mimoso, como já ouvi dizer, ele possui uma propriedade especial: amacia e confere um sabor ainda mais delicado e mimoso à carne das ovelhas.
Muito obrigado, pelo acesso e pelo comentário.
ResponderExcluirElmar tem um tino descritivo muito envolvente. Torna a leitura convidativa e prazerosa. Ele consegue valorizar cada observação, por mais simples que seja, infundindo no leitor, belezas que só o grande literato capta e demonstra no escrito.
ResponderExcluirParabéns, Poeta!
Wilton Porto
Fico feliz de que o caro amigo e poeta tenha gostado.
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