Francisco
Miguel de Moura
Escritor,
membro da Academia Piauiense de Letras
As
correntes filosóficas praticamente se esgotaram e os filósofos
desapareceram. Ficaram apenas a poesia e seus poetas. Na publicação
de Um depoimento pós-moderno, Edições, Cirandinha, Teresina, 1989,
eu dizia já prever a volta do romantismo no começo do séc. XXI,
porque poetas e leitores não vivem sem poesia.
Acabo de receber notícia do grande poeta renovador
mineiro, Márcio Almeida, que conheci pessoalmente, nas décadas
1960/1970. Como disse, ele revolucionava a poesia brasileira com seus
livros e ações em torno dos movimentos poéticos. A notícia veio
por intermédio do também poeta mineiro Paschoal Motta, amigo dele e
meu. Leiamos o teor:
“Meu caro Paschoal, ‘Não panfleteie ideologia, /
não holografe em atari, / não louversonhe as maras, / não palavre:
Signatari’ (Márcio Almeida, Assassigno, 1987). Versinhos em
homenagem ao Décio Pignatari, n. 20-8-1927 (Jundiaí) – f.
02-12-2012 (São Paulo), para quem o poema é o disigner da
linguagem, que conheci em evento, quase um fracasso absoluto, em Belo
Horizonte, juntamente com Carlos Ávila, que também perdeu o pai faz
pouco tempo, escrevi a quadra, inclusa no Assassigno, cujo
revival agora está de volta na publicação deLeituras
indesejáveis, que você receberá nesta semana. Outro dia você
me mandou um e-mail que também me deixou um pouco perplexo. É que
as pessoas boas estão morrendo, os jornais mal e porcamente
registram e rapidamente caem em esquecimento quando não no silêncio
cínico, caso dos nossos Henry, Adão, Duílio Gomes, José Afrânio
Moreira Duarte e tantos outros que se vão e pronto. E assim será,
com toda certeza, também conosco. Temo pelo absoluto ostracismo em
menos de uma década após a nossa morte. Meus filhos nunca me
perguntaram o que estou produzindo, nunca leram artigo meu publicado
em jornais, não conversam comigo sobre Literatura, nunca me
perguntaram sobre a qualidade de um livro que lêem. Amanda já
anunciou que quando eu morrer vai dispor de minha biblioteca em dois
tempos: a chegada e a saída do caminhão para doar tudo para uma
entidade. Isto, comigo. Não tenho referência se existe uma
biblioteca com o nome do Adão que o reverencia, idem com o Henry e
assim sucessivamente. O neoliberalismo com sua forçada equiparação
por baixo faz com que as pessoas se achem todas no mesmo nível e
assim todas se dão o direito de serem rigorosamente iguais em tudo.
Dia desses quase rompi com um amigo porque ele estava espalhando via
internete que para produzir miniconto o conhecimento da gramática
era inútil, desnecessário. Sou pessimista em relação à
sobrevivência da Literatura do futuro-já, mormente com a expansão
do tablete e você lerá eu já tratando do assunto em Leituras
indesejáveis. As pessoas (bem menos do que hoje) continuarão lendo,
mas textos curtos, impactantes, encomendados. O que chamamos de
Literatura tornar-se-á cult, arte devocional de apreciadores muito
especiais. É um palpite. Sem uma Sociedade dos Poetas Mortos, sem
uma ‘Sociedade’ que nos lembre a todos, indistintamente, além de
virarmos pó, nossos nomes serão apagados de quase tudo. Seremos
lembrados historiograficamente: ou porque, no seu caso, foi editor do
SLMG (Suplemento Literário do Minas Gerais), ou porque foi professor
de uma faculdade em DV, ou porque nasceu SPF e construiu uma
biblioteca. Quantas pessoas se lembraram de um poema nosso? E quando
essas pessoas morrerem? Lembra-se do filme Farenheit 45, do
François Truffault? Não é à toa se ele é um dos meus prediletos.
Sou mesmo veementemente contra Academia, mas ela tem uma vantagem:
respalda vida e obra dos autores; conserva sua memória, vira e mexe,
traz à tona o legado daqueles que realmente tem valor. Outro dia li
na Folha de São Paulo que amigos cariocas do Bartolomeu Campos de
Queirós iam prestar homenagem a ele no Rio, com exibição de
documentários, exposição de suas obras etc. Está claro que sua
morte ainda é recente, mas foi lembrado. Dinorah Maria do Carmo me
enviou e-mail ontem à noite convidando para a leitura de poemas de
Bueno da Rivera, em Santo Antônio do Monte, que também está sendo
lembrado. O que falta mesmo é uma sociedade que preserve a memória
dos autores, não os permita serem esquecidos e os mantenha vivos
para os pósteros, pois em vida foram lidos, premiados, serviram de
exemplo, dignificaram Minas” (e-mail de 03-12-2012).
Na resposta do poeta Paschoal Motta há jóias como: “Há
muito que fazer, Márcio, e principalmente pela humanização da
Poesia Escrita, começando com a retomada do lirismo.”
São três depoimentos em favor da volta da poesia mais
suave, mais doce, mais amiga, mais gente falando que desenhos e
figuras. Esse é o lirismo poético de um Márcio Almeida, autor
deste depoimento fabuloso que nos enviou, assim como o do próprio
Paschoal Motta. Romantismo numa linguagem nova, com a originalidade
de cada um para todos. O fogo da Literatura deve ser passado à
frente como o das tochas Olímpicas. Todos os povos são românticos
e querem sobreviver por terem feito alguma coisa boa. E os
escritores, justo porque escrevem, naturalmente pensam na escrita, na
prosa e na poesia e no próprio nome, como forma de sobrevivência
histórica. “No princípio era o Verbo e o Verbo estava
junto de Deus e o Verbo era Deus”. (Evangelho, segundo São
João). Acredito também que no fim também é o Verbo e o Verbo é
Deus. E Deus é poesia. E tudo isto é linguagem, tudo isto é
poesia, tudo isto é lirismo e romantismo.
Fonte: blog Revista Cirandinha
Elogio em boca própria é vitupério, não é bem isto que quero dizer. Mas, meu caro Elmar, meu artigo em blog ficou perfeito, uma gracinha.Aliás seu blog é digno de todos os elogios, vem sempre com matérias importantes, suas principalmente. Você tem me saído um prosador de mão cheia. Parabéns.
ResponderExcluirabraços
francisco miguel de moura
Obrigado, caro Chico Miguel.
ResponderExcluirUm elogio como o seu é um estimulante para que a gente prossiga na caminhada. Valeu!