terça-feira, 5 de agosto de 2014

Arrocha, professor!


Arrocha, professor!

José Maria Vasconcelos
Cronista, josemaria001@hotmail.com

          Acabo de receber mensagem da arquiteta Goretti Mendes, minha ex-aluna. O convite é-me simpático: ”Estamos organizando o encontro de nossa turma. Será um jantar no buffet... podemos contar com a sua presença, bem como da nossa colega Rita?...”

         Uma das gratas satisfações do exercício do magistério é o convívio prazeroso com a geração adolescente, bela, saudável e sonhadora, apesar dos rompantes de rebeldia da idade. Muito cedo, ainda no primeiro ano de faculdade, fui para as salas de aula de escolas públicas e privadas. Empolgado, vibrante, irreverente, cobrador de tarefas, saltitante, ensinava sempre em pé.

         Estudante pena, quando convocado para falar em público, explicar como elaborou a tarefa de casa, quais os resultados encontrados. Eu os “torturava”, exigindo-lhes exemplos extraídos de revistas, fotografias dos locais onde garimparam informações, gravação com entrevistados, para produção de texto. Eu não lhes permitia moleza, embromação ou pesca. A aula virava circo, e, por incrível pareça, conquistava fãs, especialmente dos mais desembaraçados e moleques. Eu me dava bem com eles, atazanando-me a paciência. Promovia-os com tarefas e exaltação ao talento. Alunos traquinas deixam saborosas recordações.

            “Arroche, professor! Não permita estudante sem atividade. Aproveite as inesgotáveis fontes de energia dos jovens. Aluno problemático, professor despreparado” -  Advertia-me o diretor do Diocesano, Padre Luciano. E eu repetia a lição em outras escolas, incluindo as públicas. No final do ano letivo, generoso, não os reprovava.

A sala de aula surpreende , quando despontam perguntas para aplicar rasteira no mestre. Djalma Filho, advogado e professor de Direito, brilhante aluno, exibia raro talento, quando convocado para apresentar, em público, resultado de sua pesquisa. Um dia, em pé, frente aos colegas, virado para a lousa, pegou giz, escreveu: “O que dizes não é o que tu fazes”. E me desafiou, autoritário e voz alta para envenenar os colegas: Professor, divida e classifique este período. Senti a serpente engasgar-me com fruto da arrogância. Pergunta típica para derrubar muitos professores de português. “Djalma, escolhe outra, porque esta marmelada já comi. O período se divide assim: O/QUE DIZES/ NÃO É O/ QUE TU FAZES. Oração principal: O (isto, aquilo) NÃO É O (isto, aquilo). As outras duas: orações subordinadas adjetivas.” Hoje, Djalma abraça-me onde me encontra, mesmo em fila para comunhão, na missa.

Vale a pena encontrar amigos, ex-alunos e mestres. Na mesma semana do falecimento de minha mãe Dedé e de meu aniversário, pude avaliar os tentáculos e horizontes das redes sociais: quase duzentas mensagens e pouco tempo para responder a todos. Graças ao milagre tecnológico, Goretti Mendes descobriu-me para encontro com o passado. Irei abraçar a geração tostada pelo tempo. Claro, Rita, aquela aluna com quem me casei, acompanhar-me-á. Uma paixão forte quanto o entusiasmo em sala de aula.      

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