Reginaldo, Natim e Elmar, conduzindo o pequeno e bravo motor do Tremembé |
Viagem inaugural do Tremembé (sem o motor) |
Paisagem do local de partida e chegada do Tremembé, vista da Toca do Velho Monge |
Nonato, o Batateiro, patrimônio da Várzea do Simão, futuro Capitão do Tremembé |
17 de setembro Diário Incontínuo
O TREMEMBÉ
MOTORIZADO
Elmar Carvalho
Após haver “batizado”
o meu barco inflável, que tinha o nome original de Cheyenne, pondo-lhe o nome
de Tremembé, e ter feito a viagem inaugural da ponte do Jandira até a Toca do
Velho Monge, na Várzea do Simão, conforme já registrado nesta crônica
diarística, deliberei comprar-lhe um pequeno motor de popa, na potência
especificada pelo fabricante.
Mais de mês
atrás, adquiri esse complemento. Mandei fazer um carrinho, especialmente
planejado para esse tipo e porte de motor, a fim de conduzi-lo da casa do sítio
Filomena à Toca, que fica a uns 120 metros, local em que colocaríamos o barco
no Parnaíba. No sábado, dia 5, fizemos a pré-inauguração do Tremembé, desta
feita motorizado.
Nomeei-me a mim
próprio capitão, e passei os cargos e encargos de imediato e piloto ao sargento
Natim Freitas, meu amigo e sobrinho de minha mulher. Foi conosco o Didi, ao
qual dei o nome náutico de Touro Sentado. Em virtude de o Natim, um mês atrás,
no Pantanal Matogrossense, mais precisamente em São Félix do Araguaia, haver
aprendido rápidas noções de pilotagem de barco com o seu primo Vavá, mais
conhecido pelo codinome de Comandante Carajá, conferi-lhe essa alcunha e
patente, em homenagem a seu primo. Assim, o Vavá continua sendo o Comandante
Carajá de lá, e o Natim será o de cá. Parafraseando o poeta Fagundes Varela,
que não se enojem nossos ouvidos com tantas rimas em a.
Conheci o Vavá,
faz alguns meses, na Várzea do Simão, quando ele veio visitar sua mãe e
parentes, e rever o seu local de nascimento, oportunidade em que ele fez um
acrobático voo rasante sobre essa bela paisagem ribeirinha. Soube que ele, além
de respeitado e experiente piloto de avião, também pilota uma “voadora”, de
altíssima velocidade, e uma casa barco, para a qual por ele fui convidado.
Aceitarei o convite, opportuno tempore, e haverei de ficar na varanda dessa
casa flutuante e ambulante, a fruir a beleza das águas, das árvores e das aves
do pantanal.
Numa invocação
a Camões, na excursão de sábado, disse que iríamos “além de Taprobana”,
entendendo-se com essa expressão que iríamos subir o Velho Monge até
ultrapassarmos a ponte do Jandira. Depois de “apanharmos” um pouco, pela falta
de experiência, e principalmente por não termos aberto de forma suficiente o
“suspiro” ou “respiradouro” do motor, que fica acima da tampa do tanque de
combustível, cumprimos esse desiderato.
Ao contrário da
viagem inaugural, sem o motor, de que já tratei neste diário, em que o rio se
mostrava sereno, pacífico, sem ondulações, desta vez ventava muito, e as águas
estavam encapeladas. No retorno, com o dia já quase escurecendo, as ondas do
Parnaíba estavam altas, e enfrentamos um verdadeiro banzeiro, em que os respingos
nos atingiam de forma quase constante.
Aliás, as ondas
vinham em sentido contrário à correnteza do rio, dando-nos a nítida impressão
de que enfrentávamos pequenas pororocas, se é que não estou sendo hiperbólico.
Em certos momentos, parecia que estávamos a cavalgá-las, tais eram os embates
das subidas e descidas do bravo Tremembé. Às vezes o barco parecia curvar-se
nas cristas da ondulação, verdadeiro marulho, mas sem nunca perder a
estabilidade e o equilíbrio.
No dia
seguinte, domingo, fizemos a efetiva inauguração do Tremembé motorizado.
Novamente o “timoneiro” foi o mestre Natim, já agora familiarizado com as
manhas do motor, pelo que não houve mais ato falho. Faziam parte da tripulação
o Didi e o Reginaldo. Determinei que iríamos bem além do Rebentão, até onde o
rio forma um grande remanso ou uma espécie de enseada fluvial.
Para minha
tristeza, mais uma vez constatei o estado deplorável do velho Rio Grande dos
Tapuias, também conhecido como Punaré ou Paraguassu. As margens se mostravam
bastante desguarnecidas de matas ciliares, de forma que se apresentava
assoreado, e muito largo e muito raso; tanto que, em alguns pontos, apesar de a
“quilha” do barco ser chata, e apesar de a embarcação ser pequena e inflável,
tínhamos que descer e empurrá-la.
Por essa razão,
tínhamos que tentar seguir, da forma mais fiel possível, o canal, que é a parte
em que o leito do curso d’ água se mostra mais profundo, o que provoca o risco
de nos aproximarmos em demasia da margem e, por conseguinte, de eventual galho
de árvore. Contudo, nem sempre esse malabarismo ou firula é possível, pois ora
o canal fica à margem esquerda, ora à direita e às vezes se desenvolve ao
centro, o que exige experiência, atenção e acuidade visual.
Encontramos
muitas coroas, de finíssima e macia areia. Numa delas tomamos um gostoso e
refrescante banho. Não obstante a beleza dessas ilhas fluviais, são elas uma
espécie de cancro e a prova mais ostensiva de que o rio está doente, de que o
rio pede socorro, sem que as autoridades o escutem. Com esse brado de alerta,
encerro, com tristeza, este registro, que deveria ser apenas de alegria plena.
Amigo poeta, agora o Tremembé ganhou autonomia e poderá navegar por mares nunca navegados. Parabéns. Continua de pé o meu oferecimento para grumete. Aliás, já encontrei um trabalho que me cai como uma luva, uma vez que nunca utilizei nem mesmo um remo: o de rebocador do Tremembé quando a embarcação estiver em dificuldades por conta da profundidade do rio. Bom, proveito!
ResponderExcluirPrezado Elmar,
ResponderExcluirExcelente narrativa do seu passeio pelo Rio Parnaíba, a bordo do Tremembé. Aproveitei sua viagem poética e voltei à minha adolescência em Parnaíba, onde tomei tranquilos banhos no Velho Monge e no Igaraçú.
A se lamentar, o assoreamento de ambos os rios. Torço para que medidas sejam encontradas visando a recuperação deles.
Abraços,
Ben-Hur Sampaio
Estimo que vc tenha gostado da crônica, caro Ben-Hur, e espero que que os governantes façam alguma coisa pelo moribundo Rio Grande dos Tapuios, já que nada fizeram até agora.
ResponderExcluirAbraço,
Elmar
Caro amigo José Pedro,
ResponderExcluirVocê é Pedro, Pedro é Pedra
e apóstolo como João.
Portanto, bão, balalão,
você, com espada na cinta
e ginete na mão,
também será capitão
do pequeno mas bravo
Tremembé tremendão.
Adendo ao comentário supra:
ExcluirNo Tremembé todos são passageiros e tripulação
e a menor e única patente é a de capitão.