domingo, 5 de junho de 2016

Seleta Piauiense - Hermes Vieira


NORDESTE

(Introdução)

Hermes Vieira (1911 - 2000)

Meu Nordeste feiticeiro,

Morenão de brônzeo peito,

Genuíno brasileiro,

Eu me sinto satisfeito

Em ser filho de um teu filho

E no chão por onde trilho,

Que venero com respeito;


Meu Nordeste das moagens

Nos engenhos de madeira,

Dos açudes, das barragens,

Da lavoura rotineira,

Das desmanchas de mandioca,

Do foguete-de-taboca

Irmão gêmeo da ronqueira;


Meu Nordeste onde os velórios

São rezados no sertão,

E improvisam-se os casórios

(Sem juiz, sem capelão),

Os padrinhos e os compadres,

As madrinhas e as comadres,

Na fogueira de São João;


Meu Nordeste do bornal,

Rifle, bala e cartucheira,

Da "lombada" e do punhal,

da "garruncha" e da peixeira,

Do cacete e do facão,

Com que um cabra valentão

Desmantela festa e feira;


Meu Nordeste em rede armada

(De algodão ou de tucum),

Aguardando a maxixada

Com quiabo e jerimum,

Mel, canjica e milho assado,

Feijão verde e arroz torrado,

Na semana de jejum;



Meu Nordeste a boi de carro...

Carro-de-boi do Nordeste,

Tosco, humilde, simples, charro,

Submisso e a nada investe,

Que, arrastado estrada afora,

Range, grita, canta e chora

Ajoujado à canga agreste;

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