sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Quando religião vira desgraça

Torre de Babel. Fonte: Google

Quando religião vira desgraça

José Maria Vasconcelos 
Cronista, josemaria001@hotmail.com

          Topei convite para ministrar palestra a grupo de jovens de uma igreja. Coloquei-os em círculo. Cada membro passaria adiante a mensagem que eu ditara ao ouvido do primeiro da fila: “O Senhor manda dizer que você pode melhorar o mundo”. Quando a mensagem chegou ao último ouvido do grupo, pedi-lhe que a repetisse em voz alta. A mensagem não condizia com a que eu enviara pela primeira pessoa do círculo. A experiência provava quanto a comunicação vira babel, quando a linguagem é mal interpretada, provoca litígios e desgraças coletivas.

         Religiões, muitas vezes, pregam o oposto do que diziam seus fundadores. Jesus nunca falou em gays, apenas que “uns são naturalmente; outros se fazem pelo reino de Deus”. Nem obrigou celibato a seus discípulos. Ele se concentrava nos pobres, doentes e pecadores. Não aprovou escravidão de negros e índios, na piedosa intenção de os batizarem. Jesus não demonizava gays e pagãos, mas a elite religiosa da época, que sufocava os fiéis com pesados tributos e exigências: “Guias cegos, que coais mosquitos, mas engolis camelos!” (Mateus, 23-24). Não ensinou a demonizar bruxos e apóstatas, torturando-os em fogueira, repetindo carnificina do império romano.

                Maomé elevou o status das mulheres, em sua época; alguns islâmicos clérigos, entretanto, mutilam as genitais das mocinhas e impõem a burka. O carismático Maomé nunca aprovaria o desmanche de monumentos sagrados nem asssinatos em massa, em nome de Alá, como pratica o Estado Islâmico. Buda, provavelmente, ficaria em choque com apartheid imposto à minoria Rohingya pelos budistas de Mianmar.

         No Antigo Testamento, judeus consideravam-se a raça nobre de seus patriarcas, de um Deus, único, invisível. A raça desprezava pagãos, não os permitia no Templo de Jerusalém nem os saudavam nem comiam com eles, ao contrário de Jesus. Hoje, judeus cultivam mais tolerância: muçulmanos guardm a sexta-feira sagrada; cristãos, o sábado ou domingo.

         Fundadores de religião comportam-se como visionários ousados e carismáticos, cuja inspiração moral se transforma em ensinamentos voltados para seus próprios interesses. Até montam teatro de ataque assassino que aplica golpe na garganta; a peça ensanguentada vira leilão de 8 milhões de reais. Não é o Jesus dos evangelhos.

         O Ocidente transforma-se, cada vez mais, secular, mundano, “sem religião”, talvez pelo avanço do materialismo exacerbado, a cultura do bem-estar, egolatria e desmonte das virtudes. O despojado e virtuoso Mahatma Gandhi confessava admiração a Jesus Cristo, porém se escandaliza com o mau exemplo dos cristãos. Durante séculos, leis eclesiásticas não permitiam casamento entre cristãos e judeus. Hitler fora educado nessa apartheid.


         Convido os mais afastados de religião a se permitirem um círculo de leitura dos evangelhos e Atos dos Apóstolos. Ao menos isto. Ali se encontram as bases do espírito de Jesus. As mensagens podem perturbar o entendimento, mas, só de se darem as mãos e ouvidos, vale a pena buscar o sentido da vida.

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