domingo, 21 de agosto de 2022

Seleta Piauiense - Álvaro Pacheco

 

Fonte: Google

Autobiografia

 

Álvaro Pacheco (1933)

 

                   

Há quarenta e tantos anos

meu pai pensou que eu ia nascer:

mas quem nasceu foi meu irmão mais velho

que hoje sofre de velhice e da doença de não saber de nada.

 

A esperança é branca

a morte é negra

o amor é pobre

a vida é fugaz

 

(eu sou arco-íris)

que nasceu dezesseis anos depois

calvo, sozinho, branco e preto,

às vezes no mundo vinte e tantos anos depois.

 

                                                                                1962

Fonte: site Jornal de Poesia

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

PADRE DEUSDETE E O TIME SANTOS DE LIVRAMENTO




        

PADRE DEUSDETE E O TIME SANTOS DE LIVRAMENTO


Elmar Carvalho


Logo ao iniciar a caminhada, deparei-me com o colega Carlos Barbosa Dias, que vinha em sentido contrário. Fiz meia-volta e o acompanhei. Envergava ele, que é natural do interior de São Paulo, uma camisa do Santos, que voltou à moda com os seus meninos alegres, moleques e bons de bola. Perguntou-me se eu torcia pelo Santos.

Em resposta, contei-lhe o seguinte: quando eu tinha de treze para catorze anos de idade, morei na bela e bucólica cidade de José de Freitas, durante um ano. Foi um período muito feliz de minha vida. Quase todo dia, pela manhã, saía a passear, com o Carlos de dona Irá e o Itamar, e mais algum de meus irmãos ou outro garoto da vizinhança.

Às vezes, alguns de meus colegas iam pegar vim-vim, com o uso de visgo colocado em uma haste posta na gaiola do “chama”; outras vezes, íamos escalar o morro do Fidié, que na época não era conhecido por esse nome, mas simplesmente como morro, que hoje preferiria chamar de Morro do Livramento, em homenagem ao nome antigo da localidade e a sua padroeira; muitas vezes nosso destino era o açude Pitombeira, de onde pulávamos do velho trampolim.

Também banhávamos no olho d' água, perto do cabaré Jumento Velho, lá para as bandas do mercado público. Invariavelmente, à tarde, ia jogar futebol num campinho que havia na frente da casa do grande marceneiro Zezé Barros, que também era um peladeiro. Esse campo ficava dentro de uma quinta, tinha terreno arenoso, e era rodeado por belas e frondosas árvores, entre as quais uma imensa mangueira.

Gostava muito desse campo, pois, sendo eu goleiro, a areia macia me possibilitava enfeitar as defesas, projetando-me no espaço, quase a levitar, na construção de belas pontes, que hoje classificaria de estaiadas. Certa vez, jogando na periferia da cidade, e sendo então pequeno e franzino, alcei um verdadeiro voo, para cair com a bola encaixada em meu peito. Essa estripulia acrobática arrancou delirantes aplausos de um torcedor, que gritava que eu parecia um “passarinzim”.

Tempos depois esse terreno onde jogávamos foi comprado pela família do Pedro e do João Rocha, e as peladas foram proibidas. Por isso, certa tarde, em que estávamos batendo bola, perto da casa da família Santana, fomos avistados pelo padre Deusdete Craveiro de Melo, que era meu professor de Português, no segundo ano ginasial, e diretor do Colégio Antônio Freitas. O padre, de dentro do seu famoso fusca, me perguntou a razão de estarmos jogando na rua. Expliquei-lhe que o nosso campo fora fechado.

Ele, então, sugeriu que fizéssemos outro, na frente do cemitério velho, conhecido por cemitério dos ricos, como se a morte fizesse algum tipo de distinção social, e acrescentou que nos daria uma bola de couro, as traves, apito, e os tornos para marcação do campo. Liderei os garotos da vizinhança e fizemos o campo. O padre cumpriu a promessa, inclusive mandando fincar as traves e os tornos.

Diante disso, fiz uma carta ao Armazém Paraíba, narrando esses fatos, e pedi uma equipe de um time de futebol. Um ou dois meses depois, quando eu já perdia a esperança, a empresa mandou deixar a farda do Santos em minha casa. Depois, encetei uma campanha para a aquisição dos calções, o que também deu certo. Pouco depois, minha família retornou a Campo Maior, mas tenho notícia segura, através de meu amigo Francisco Costa, freitense, fiscal do Estado e radialista, de que esse campo ficou em atividade durante muitos anos.

De modo que, respondendo à pergunta do magistrado Carlos Dias, paulista e torcedor do Santos, posso dizer que sou santista desde menino, desde que joguei num time chamado Santos, que ajudei a  criar, na aprazível e querida cidade de José de Freitas, outrora Livramento.   

9 de abril de 2010

quarta-feira, 17 de agosto de 2022

De Jerumenha a Pastos Bons

Reginaldo Miranda


De Jerumenha a Pastos Bons[1]


(Antonio Fonseca dos Santos Neto, da Cadeira 11 da Academia de Pastos Bons, da Cadeira 1 da Academia Piauiense de Letras, da Cadeira 27 da Academia Passagense de Letras e Artes – e membro honorário da Academia Caxiense de Letras).

 

A Academia de Letras, História e Ecologia de Pastos Bons, ao completar os 15 anos de sua instalação, associa a esse ato celebrativo, a posse de um novo membro, com ânimo de significar a construção de sua perenidade. O sentido de imortalidade acadêmica de que tanto se fala é constituído dessa maneira: as cadeiras têm pessoas que se sucedem para cultivar e manter viva a obra de quem o silêncio calou a voz sonora.

Estamos aqui para apresentar ao corpo acadêmico e a seus convidados, o cidadão Reginaldo Miranda da Silva, novo e segundo ocupante da cadeira 9, antes ocupada pelo escritor e jornalista Herculano Moraes, e que tem como patrono Félix de Valois de Araújo.

Reginaldo nasceu na cidade piauiense de Bertolínia, no vale do Gurgueia, parte do território histórico de Jerumenha, no dia 17 de agosto de 1964. Seus pais são Dona Eunice de Miranda e Silva, também natural de Bertolínia, funcionária pública da prefeitura de Bertolínia, e Abdon Rodrigues da Silva, natural de Canto do Buriti, também cidade e município no dito vale, fazendeiro e também serventuário da Justiça em Bertolínia. Distingo mais o avô paterno de nosso recipiendário, que tinha o nome sugestivo de Joaquim José Mariano da Silva Brasil, um professor de primeiras letras e poeta.

Ainda sobre a ambiência em que existiram os avoengos das gerações mais distantes na história familiar do novo acadêmico Reginaldo, lembro que a grande região sul do atual Piauí, o extremo oeste de Pernambuco, a faixa baiana do lado esquerdo do rio São Francisco, e o grande sul do Maranhão, têm, a unir todos esses rincões, alguns troncos familiares entre os mais grossos do tempo colonial, com uma parentela estendida por essas antigas capitanias, hoje estados. O que tem muito pouco – ou praticamente inexistente, são maranhenses vindos do litoral e das Baixadas do Maranhão das origens.

Vamos tomar o exemplo do mais adensado desse tronco familiar existente na referida geografia dos quatro estados: os Coelho, que todos sabemos chegaram como donatários de Pernambuco, ainda no primeiro século da colonização – liderados pelo famoso Duarte Coelho. Foi aqui no norte da América portuguesa o único capitão donatário que não absentiu, Várias gerações dos Coelho herdando o território capitanial que incluía o que hoje são a metade sul do Piauí e a metade sul do Maranhão e até o norte do atual Tocantins. Uma das provas dessa relação “genética” territorial de Pastos Bons com Pernambuco, atravessando o Piauí, é que sua velha paróquia de São Bento é uma fração do bispado de Olinda-Recife – aliás, uma fração gigantesca – e não, do também antigo bispado de São Luís do Maranhão, aquele e este criados em 1676 e 1677. Pernambuco já uma prelazia desde o início do Seiscentos. 

No terceiro século do logro colonial, chegou a essa região, para viver e criar gado, um homem que muito nome deixou por aqui, e também muitos filhos: Valério Coelho Rodrigues, consorciado a uma “paulista”, Domiciana Vieira de Carvalho – casal fundador da cidade de Paulistana, num Piauí que é quase Pernambuco. Não se encontra estabelecido que Valério era parente próximo de Duarte, contudo, seu protagonismo, e prole, estão significados no tecido familiar-parental da grande região sertaneja, de agricultura, criatório e extrativismo, configurada na espacialidade geográfica que acima se aponta e que o autor do Roteiro do Maranhão ao Goiás pelo Piauí, pretendeu fazer capitania real não-marítima, para ordenar e florescer culturalmente a vida nos Sertões de Dentro.

Pois, do vale do Gurgueia desse Sertão de Dentro, e das ramas desse coelhado carvalhano, da Paulistana, pelos domínios gurgueanos, vem o nosso novo irmão acadêmico, para assentar nesta valorosa Academia de Pastos Bons. Academia idealizada pelo jurista Celso Barros Coelho, implantada sob sua forte liderança e concurso de conterrâneos e afins que atenderam – e atendem – a esse verdadeiro chamado aos cultivos da boa cultura. Instituição que é, já, uma Casa cujas atividades impactam, por década e meia, a vida da mais longeva municipalidade da metade sul do Estado do Maranhão.

Por que a Reginaldo Miranda, um piauiense, foi colocada a sugestão de fazer Cadeira, aqui, e os pares o elegeram, com entusiasmo?

Diga-se mais: Reginaldo tem um generoso tributo em pesquisas e livros, de sentido historiográfico, que desvelam a formação social-histórica do sertão do Piauí, da qual o antigo Pastos Bons é parte indissociável, na dinâmica da implantação colonizadora desde a era seiscentista. Jerumenha histórica, que vinca o berço do novo acadêmico, repita-se, é, por exemplo, irmã gêmea de Pastos Bons, em tudo vizinhas e intercambiantes por quase um século, entre o Seiscentos e Setecentos, época em que o rio não marcava uma divisa geopolítica entre Piauí e Maranhão, contudo marcava – e marca – uma via fluvial a fecundar as ribeiras e unir as gentes de um lado e do outro. Seria somente mera coincidência, ser uma gente, sobrenominada Ribeiro, uma das mais expandidas do imenso vale médio do rio Punaré, depois chamado de Parnaíba?

Contemplemos as cartas geográficas e veremos que Bertolínia é uma freguesia, hoje município distinto de Jerumenha e defronte a Nova Iorque, nova, filha das injunções do alagamento da Boa Esperança. Nova Iorque? Um notável quase bairro de Pastos Bons – com todo respeito!

O recipiendário desta noite vem para muito contribuir com estudos relevantes tão ainda faltos nos municípios da mesorregião médio parnaibana, a zona leste-sul do Maranhão e  também o valongo gurgueiano. Será um grande acadêmico, sucedendo a outro dedicado filho do sul piauiense, Herculano Morais, filho, cujo nome está entre os fundadores desta casa, em 2005.

Reginaldo Miranda da Silva é bertolinense, já se disse. Feitos os estudos primários no ardor do berço nativo, ainda adolescente, foi estudar em Teresina, a bela cidade verde, como lhe chamou o escritor Coelho Neto.     

Este não é o primeiro sodalício acadêmico que o confrade Reginaldo integra. Ele é o quarto e atual ocupante da Cadeira 27 da Academia Piauiense de Letras, entidade que presidiu com destacado êxito. Historiador, contista e cronista. Antes graduara-se em Direito, pela Universidade Federal do Piauí (1988), logo a seguir estabelecendo-se com escritório de advocacia. Na vida pública, foi vice-prefeito em sua terra natal. As obras que escreveu e publicou são muitas, entre as quais, Bertolínia: história, meio e homens (1983); Cronologia histórica do município de Regeneração (2002); São Gonçalo da Regeneração, Aldeamento dos Acoroás (2003). Recentemente, pela APL, publicou, Piauienses Notáveis, robusto livro que perfila figuras que marcam a história brasileira em chão do Piauí e arredores.

A Academia de Pastos Bons se alegra grandemente ao receber o novo ocupante da Cadeira 9.

Integre-se, caro recipiendário, no berço afável dos Pastos Bons, que você já conhece, de ver in loco, e sobretudo de nele imergir pelos vários relatos e outras memórias que sobre essa projeção histórica do Piauí foram assentados.

Em sua homenagem e vincando este rito de chegada, inscrevo aqui uma passagem de Dom Frei Manuel da Cruz, que foi o instituidor da freguesia de São Bento em Paróquia, no distante ano de 1741, e que também é autor da primeira notícia dada sobre o lugar “capital” das imensidões, então, ainda incertas, do sertão dos “pastos bons”. Disse ele, o primeiro bispo que pisou os pés no sul do Maranhão, em longa Visita Pastoral feita entre agosto de 1742 e janeiro de 1744 :

     

“[saindo de Parnaguá, que é a estrada real dos sertões deste bispado...]. Desta paragem em que se ajuntam estes dois rios [Parnaíba e Balsas] quatro dias de jornada pela [ribeira da] Parnaíba abaixo, tornei eu a passar a dita Parnaíba para a nova freguesia de São Bento dos Pastos Bons, que já situada na Capitania do Maranhão na mesma chapada adiante nasce o rio Itapecuru; e muito mais adiante em uma serra mui alta o Mearim [...]. Mas deixados estes futuros, visitada a freguesia de São Bento que está situada entre a Parnaíba e Itapicuru, distrito o mais delicioso, e fértil que achei em todo o sertão...”. O bispo está escrevendo “para o Reverendíssimo padre-mestre doutor frei Manuel da Rocha” que está em Portugal (Copiador das Cartas de Dom Manuel da Cruz, p. 120-121). 

 

Dom Manuel escreveu essa carta em 1744, quando de volta a São Luís e dando conta de sua longa viagem de “visita geral ao sertão do bispado”, capitania do Piauí, todas as freguesias, e partes da capitania do Maranhão.

Feita essa menção de documento que é matéria que acalanta o labor de nosso recipiendário, agora se faz necessário parar este discurso, para se tenha outras audições nesta sessão tão significativa.

Senhor Reginaldo Miranda da Silva: aqui estais por diletante vaidade pessoal? Claro que não. Aqui viestes para ombrear esforços da grandeza cultural que a mística do academismo suscita e dos combates justos que a agremiação ouse enfrentar? Claro que sim. Pois aproxima-se, dizei mais sobre os nativos Amanajó, os Timbira todos; dizei muito dessa terra e gente sopradas pelos “ventos gerais” tão poeticamente cantados por nosso confrade comum Pedro da Silva Ribeiro, filho da histórica Tróia, da ribeira esquerda, e nascido no vale do Engano, do lado direito do Parnaíba. 

Esta Casa te convoca à confradagem, mais uma: esta que solenizamos nesta sala virtual, e nos arquivos das nuvens. Logo mais, mirarás o Pinga – em nossos recônditos de sertão as serras pingam e criam vales verdejantes plenos de vida; verás a fonte do Senhor São Bento – águas “bentas”, águas mornas que saem de uma loca do chão e erguem a própria localidade, no concerto das cidadelas do mundo; visitarás os Fortes – e até e quem sabe – verás o Jacarandá das meninices inebriantes do nosso mestre necessário, Celso Barros Coelho, um ícone dos dois lados do Punaré, dos vários lados e instâncias do Brasil. Ah! Ouvirás das serranias em dobras, os brados de uma República antecipada, a República de Pastos Bons! Que o Brasil sitiou.

Em nome da Casa, bem-vindo sejais! Jerumenhas, minhas também; Bertolínia, avoenga de tantos Rocha; “Oh! Pastos Bons” – parafraseio o versejar do teu Hino... “Tu és cidade, a mais linda de todo / o Sertão. // Seus filhos trabalhadores / lutando pela verdade, / na luta do dia a dia / conquistaram a liberdade”.

Assenta-te na Cadeira. E espera, de pé, o banho das doces brisas dos pastos culturais desse lugar de gente bendita.

Dito. 

[1] Discurso proferido pelo acadêmico Antônio Fonseca dos Santos Neto, em sessão acadêmica, sala virtual, em 12 de maio de 2021, em recepção ao acadêmico Reginaldo Miranda.  

terça-feira, 16 de agosto de 2022

Vila do Poti, Vila Nova do Poti, Teresina

 

Fonte: Google

Fonte: Google



Vila do Poti, Vila Nova do Poti, Teresina


José Pedro Araújo (*)

 

Teresina foi a primeira cidade brasileira planejada. E isso se deu justamente para ser a capital do estado do Piauí. Oeiras, a primeira capital, situada no sertão central da província, distava muitos quilômetros de distância para o principal meio de acesso para o restante do território, o rio Parnaíba.  Com a sua situação geográfica estrategicamente mal escolhida, a primeira capital foi substituída pela nova, Teresina. E isso já vinha sendo planejado desde muito tempo antes, existindo até o mesmo o local já escolhido para tal mudança. Contudo, a reação dos moradores da velha capital era tremenda, e postergou durante muito tempo a mudança. Até que o corajoso José Antonio Saraiva, na época o jovem Presidente da Província, resolveu encarar o desafio e fazer a tão esperada mudança. E como parte dos brasileiros desconhece completamente a bela história desta cidade que hoje completa 170 Anos desde a sua fundação, faremos aqui uma breve e sucinta narração da sua história.

 

O local escolhido para situar a nova capital precisou ser alterado, ou mais precisamente, substituído por outro a cerca de uma légua de distância da confluência dos dois rios, Parnaíba e Poti. Por esse tempo, a vila criada no local idealizado por Maia da Gama já estava em franca expansão quando Saraiva a visitou e se decidiu pela mudança. O comércio local vicejava e se expandia com rapidez, até já possuía uma capela erigida em intenção a Nossa Senhora do Amparo, e também um vigário, Mamede Antonio de Lima. Este, aliás, um dos três personagens mais importante no processo de instalação da cidade que logo passou a ser chamada de Teresina, juntamente ao próprio Saraiva, além do mestre de obras português, João Isidoro de França.

 

 A Barra do Poti apresentava muitas deficiências, muitos empecilhos a serem resolvidos. Passível de inundações, o local se achacava cercado pelos dois rios e por algumas lagoas, o que o tornava insalubre e propenso a doenças palustres. A escolha de um novo local situado na Chapada do Corisco foi, portanto, uma decisão acertada e que denota a inteligência dos homens que a proferiram. A Vila do Poti é hoje um bairro da cidade, muito querido dos teresinenses, no qual, todos os anos, por ocasião da passagem do dia 16 de agosto, sedia as festividades de aniversário da capital. Lá também está instalado o Polo Cerâmico de Teresina com centenas de ceramistas que produzem um ótimo artesanato a partir do barro argiloso retirado de barreiros da região. As peças produzidas no Poti Velho são respeitadas no mundo inteiro, tanto pela sua qualidade excepcional, quanto pela sua beleza plástica.

 

Formada na intercessão dos dois rios desde primórdios do século XVIII, a Vila da Barra do Poti demorou mais de um século para adquirir pequena população, pois possuía lento desenvolvimento. Seus moradores viviam da criação de gado, da pesca e da produção de alimentos. A construção da capela em intenção a Nossa Senhora do Amparo, deu-se ainda no século XVIII, suprindo uma lacuna reclamada pelos moradores

 

Somente em setembro de 1827 o imperador D. Pedro I elevou o local à condição de Freguesia, concedendo-lhe foro eclesiástico e civil. E cinco anos depois, em 1832, novo ato imperial elevava a povoação à condição de Vila.

 

O pároco local, Frei Mamede Lima, teve importância preponderante no convencimento da população da Barra do Poti para proceder a mudança. Ativo, envolvente e respeitado pelos seus concidadãos, logo se juntou a um grupo de moradores importantes da vila, e partiram para a escolha do lugar ideal para situar a nova povoação. O local escolhido ficava nas terras pertencentes ao sesmeiro Manoel Domingues Gonçalves Pedreira, área situada nas margens do rio Parnaíba, mas em local elevado e plano, com terreno firme, sem a presença dos baixões alagadiços da velha Vila da Barra do Poti. Neste ponto entra em cena o outro personagem importante: João Isidoro da Silva França, ou, Mestre Isidoro França. Foi ele o responsável pelo planejamento urbano da nova vila, como de resto pela construção das primeiras edificações, como a Igreja do Amparo, primeira edificação da nova vila, da Cadeia Pública, do Cemitério Velho(São José), e do Quartel de Polícia.

 

Este momento histórico importante está registrado em carta dirigida pelo mestre de obras ao Presidente da Província, José Antônio Saraiva. Este é o outro personagem importante nessa história, quiçá o maior deles. Ativo e organizado, o mestre Isidoro deu a conhecer ao administrador o fruto inicial do seu trabalho: “Tenho a grande honra e satisfação de levar ao conhecimento de V. Exa. que no dia 25 do corrente teve lugar a primeira pedra no alicerce da Porta do Evangelho da nova Matriz”. Obra de maior porte em execução, a Matriz transformou-se em problema para a administração central, uma vez tendo apresentado problemas nas suas fundações, o que provocou enormes rachaduras. E isso obrigou o governo a suspender a sua construção por avultado tempo. Enquanto isso, a fofoca corria solta na vila sobre a segurança da obra, incomodando sobremaneira o governo instalado na nova sede.

 

Pelo que se pode ver, nem um palácio para o governo se tinha, obrigando-se o Presidente da Província a se instalar em casa alugada, situação que permaneceu por muito tempo assim. Depois de pouco mais de dois anos a frente do governo, Saraiva foi embora para a Bahia para desempenhar por lá mandato de deputado provincial. Por aqui, os recursos do tesouro eram tão escassos, que a simples perfuração de um poço cacimbão para abastecer de água os moradores de Teresina, foi motivo de registro em relatório apresentado à assembleia provincial, pelo sucessor de Saraiva. Alegava o administrador aos deputados haver necessidade de se construir mais alguns, mas que as combalidas finanças públicas não permitia. O poço foi perfurado no Largo da Constituição, em frente ao palácio do governo, hoje Praça da Bandeira ou Deodoro.

 

Era essa a Teresina da época. A maior parte das obras em execução na cidade foram feitas por gente da antiga Vila da Barra do Poti que, convencidos por Saraiva, haviam acreditado na transferência da sede do governo para a Vila Nova do Poti (Teresina). Do mesmo modo, a pedido do Presidente da Província, esses mesmos moradores construíram novos prédios para a instalação das repartições públicas, para a escola de artífices e, sobretudo, para servirem de residência, tanto às autoridades quanto para os demais funcionários transferidos de Oeiras para a nova sede do governo provincial.

 

Vila da Barra do Poti virou um bairro de Teresina, o Poti Velho e, segundo o Censo de 2010, viviam em torno de 3.730 habitantes. N. S. do Amparo, a santa padroeira de Teresina tem morada em dois templos: o primeiro, transformado hoje em capela, fica exatamente no Poti Velho, e guarda em um nicho construído no seu adro, a imagem da padroeira trazida de Portugal em 1832, doada pela família Pedreira, proprietária da sesmaria onde a nova cidade foi erguida. A Matriz de Nossa Senhora do Amparo, foi construída depois de 1852, no marco Zero da cidade de Teresina, é um dos mais belos templos religiosos do Brasil. A capital, portanto, possui duas moradas para a sua padroeira. E também realiza festa para ela em duas datas: 16 de agosto, em Teresina. E 25 de novembro, no Poti Velho. O templo situado na Praça da Bandeira, com a frente virada para o rio Parnaíba, já passou por inúmeras reformas, e teve as suas duas torres em estilo neogótico erigidas em 1950 para as comemorações do primeiro centenário da cidade, e dela própria.

 

Teresina teve o seu traçado planejado a partir do Marco Zero. Em formato de xadrez, o planejamento inicial da cidade previa a distribuição, de forma gratuita, de sete quarteirões para o lado sul, e três para o norte. As ruas possuíam forma retilínea, e partiam da Igreja do Amparo em direção ao Poti. Demorou pouco tempo para a cidade começar a tomar forma.

 

Teresina é hoje uma das mais belas cidades brasileiras, com suas ruas largas, suas avenidas arborizadas, e seus parques instalados ao longo dos rios, e em diversos pontos do seu traçado. Valeu muito a pena a luta de José Antonio Saraiva para instalar na Chapada do Corisco, em pleno sertão, uma comunidade para sediar o governo. A cidade hoje possui as suas contradições, as suas carências, como todas as outras existentes no nosso país, mas como é bela, agradável e charmosa! Parabéns, Teresina, como é gratificante viver aqui!

 

(*) José Pedro Araújo, é engenheiro agrônomo, funcionário público aposentado, historiador, cronista, romancista, e coordenador do blog Folhas Avulsas.   

domingo, 14 de agosto de 2022

LÍRICA 2.222

 

Fonte: Google


LÍRICA 2.222


Elmar Carvalho

 

Eu vi teus olhos

de pedras verdes musgosas,

dissolvendo-se em líquido

no verde móvel do mar.

Teu corpo vi tomando

a forma da praia

e a tua voz assumindo

a cadência da música

das ondas.

 

De você me veio

uns longes veios de saudades

e maresias

invadindo meu ser.

 

Os teus cabelos

eram loiras algas,

encrespadas em ondas do mar.

 

As curvas

da terra e do mar

são apenas projeções

da poesia selvagem de teu corpo.

 

Sim, sinto ainda te amar

a leste, oeste, ao vento e ao mar,

com a mesma paixão incontida

de um gesto feito de raiva,

do tempo em que eu tinha

a inocência e o pecado

de um deus feito de pedra.

 

           Pba, 19.03.78

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

CREPÚSCULO E AS OUTRAS ESTAÇÕES DA VIDA

Fonte: Google


CREPÚSCULO E AS OUTRAS ESTAÇÕES DA VIDA


Elmar Carvalho


Na quarta-feira, recebi a informação de que a família de uma interditanda não teve condição de trazê-la ao fórum, para o interrogatório, em virtude de sua doença e debilidade. O advogado, em nome da família, pediu-me que fosse fazer o ato na própria casa dela. Considerando sua idade, de mulher de quase um século de vida, fui imediatamente, em companhia do causídico, da promotora de Justiça e do serventuário.

Morava em casa humilde, quase na periferia da cidade. Logo na chegada, constatamos que ela havia defecado na roupa e estava tomando banho em seu próprio quarto, com a ajuda de parentes. Quando o banho terminou, e pude iniciar o interrogatório, pronunciei o seu nome. Ela não teve a menor reação. Fiz outras perguntas, apenas para cumprir o ritual, às quais ela não fez o menor esboço em respondê-las.

Uma das coisas mais sagradas para uma pessoa é o seu nome, que a identifica e é a sua grande referência na sociedade e na família. É o símbolo de sua própria pessoa, de sua própria personalidade, de sua história pessoal. Por mais bem administrado que seja um ego, o nome é algo muito forte, é como uma marca, como um emblema do seu dono, tanto que, outrora, quando um franciscano fazia seus votos de fidelidade à ordem, a primeira coisa que abandonava era seu nome, como símbolo de seu rompimento com a sua vida passada.

Adotava outro nome, pelo qual passava a ser chamado e conhecido. Pela falta de reação a seu nome, entendi que seu caso era   grave, e ao que tudo indicava o seu mal de Alzheimer era já muito avançado. Tudo isso foi para mim uma consequência da condição e vicissitudes humanas, a que todos estamos sujeitos. Jamais aquela senhora, assim como qualquer outra pessoa, no apogeu de sua juventude radiosa, referta de sonhos e de rosas, poderia imaginar passar por uma situação desse tipo.

Por isso mesmo, minha mãe, sempre que ouve falar em pessoa enfatuada, cheia de petulância e empáfia, como uma advertência a si mesma e aos outros, repete que sequer sabemos como será nossa morte. Talvez por essa razão, muitos dos nossos antepassados, em suas orações, tinham o costume de pedir a Deus que lhes desse uma boa morte. Vários tinham como padroeira e intercessora Nossa Senhora da Boa Morte. Contam-se que alguns sabiam o dia e a hora em que faleceriam, o que lhes permitiria prepararem-se espiritualmente, com orações e arrependimentos, para o inevitável desfecho fatal.

Fazem parte da vida humana as alegrias do alvorecer da juventude, tão prenhe de risos e esperanças, as lutas e labor da maturidade, já temperadas pelas experiências, em que as ilusões foram sendo esfolhadas pelo caminho, como disse o poeta, e o crepúsculo do envelhecimento, que pode ser belo, que pode ser majestoso, mas a que não falta nunca uma pitada de melancolia, seja pelas coisas e pelos amores perdidos, seja pela proximidade da morte.

E é por isso mesmo, que devemos passar por todas as fases da vida, para que nossa experiência neste nosso planeta seja completa, com nascente, zênite e morrente. Por tudo isso chego à conclusão de que uma velhice saudável e uma boa morte, pelo que almejavam os antigos, são duas dádivas maravilhosas, são um glorioso e sublime pôr-do-sol.  

9 de abril de 2010

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Notável legado



Notável legado 


Carlos Rubem 


Antônio  Bugija de Sousa Brito, escritor oeirense, nasceu no dia 21 de maio de 1907. Era o primogênito do casal Raimundo de Sousa Brito, farmacêutico, e de Anna Cavalcanti Monteiro Bugyja de Sousa Britto, apelidada de Yayazinha, pianista de escol. A valsa “Yaiá Bugija”, costumeiramente executada em Oeiras, foi composta pelo maestro João Hermes  Bugyja, seu avô materno.


Em 1915, o menino Catônio, como era conhecido, foi morar em Teresina com seus pais e irmãos, onde concluiu o curso primário e ginasial. Foi comerciário. Mediante concurso, tornou-se carteiro. Aprovado no vestibular de Direito, migrou para São Luís do Maranhão. Em 1930, ingressou no Ministério da Fazenda, por certame público, tendo sido lotado no Recife. Dois anos depois, foi transferido para trabalhar na Alfândega do Rio de Janeiro, onde concluiu o seu curso superior.


Casou-se com a Dona Olivia Vasques de Queiroz em 1934. Dessa união houve duas filhas: Miridan (historiadora) e Teresina (pintora).


Como dirigente do Centro Piauiense, representação do nosso estado na então capital do Brasil, Rio de Janeiro, criada pelo governador Leônidas Melo, nos anos quarentena, fez benéficas gestões administrativas em nível federal. Em particular, muito se esforçou para superar os entraves burocráticos junto ao Ministério da Educação visando a criação do Ginásio Municipal Oeirense.


Membros de diversas instituições culturais a exemplo do Instituto Histórico de Oeiras (IHO) e da Academia Piauiense de Letras (APL). Publicou vários livros a saber: MURALHAS (poesia); MIRIDAN (lendas indígenas), 1960; ZABELÊ, 1962; ITAINS ,1967; O PIAUÍ E A UNIDADE NACIONAL , 1976; NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS, 1977, QUATRO ESCORÇOS BIOGRÁFICOS, 1978; A ACADEMIA PIAUIENSE DE LETRAS NA CADEIRA N.12 , 1981; DESAJUSTES E DESAJUSTADOS, vol I 1985; DESAJUSTES E DESAJUSTADOS, vol II  1986; TRAÇOS EM 5 BIOGRAFIAS,1987; A HISTORIA DA INGLATERRA DO PEQUENO ARTHUR (tradução), 1989; TRES ARTÍFICES DO VERSO, 1991; AS HISTORIETAS DO MENINO CATÔNIO, 1992.


Conheci-o em 1964, talvez. Veio do Rio de Janeiro dirigindo a sua Rural pelo sul do estado, pois pretendia conhecer a Lagoa de Parnaguá. Hospedou-se na Casa-de-Fazenda do Canela, com seu primo Joel Campos (1897 - 1991), meu avô materno. 


Ao se aposentar em 1978, comprou a propriedade Riacho Fundo, em São Pedro do Piauí, onde, isolado do mundo, escreveu muitas de suas obras e outras produções literárias.


Apaixonado pela terra natal, vez outra, passava temporada em Oeiras, recepcionado pelo aludido primo. Homem de fino trato, prestativo, “causeur” brilhante.


Em 1987, por cá aportou com toda sua família para comemorar os seus 80 anos de idade. Foi uma festa bonita que contou com missa gratulatória, sessão solene do IHO tendo sido saudado pelo Professor Possidônio Queiroz. Em seguida, as suas filhas editaram o livreto Ecos da comemoração de um aniversário.


Por mim convidado, ao ensejo do centenário de nascimento do poeta Nogueira Tapety, em 1990, pronunciou substanciosa palestra sobre a vida e obra do homenageado. 


Naquela oportunidade, lembro-me muito bem, no terraço da casa do vovô Joel, contando estórias do folclore local para a minha filha Laís e meus sobrinhos. Parecia uma criança!


Demonstrou em carta para mim o seu propósito de vir a Oeiras, julho de 1992. Como me disse, seria uma viagem de despedida!... Fui pegá-lo no aeroporto de Teresina. Chegou acompanhado da filha Miridan. 


Quis visitar a antiga Fábrica de Laticínios dos Campos, em Campinas do Piauí, antiga possessão oeirense. Admirou-se das linhas arquitetônicas daquele centenário prédio que ainda hoje clama pela sua restauração. Previamente articulado, fomos almoçar em Simplício Mendes na casa do Dr. Oton Lustosa, Juiz de Direito à época, hoje desembargador do TJ/PI e membro da APL.


Na véspera do seu retorno, levei-o aos Correios. Mantinha intensa atividade epistolar. Antes de descer do carro, tirou dos bolsos do paletó um tufo de dinheiro, cujo padrão monetário nem sei qual era, e me repassou. Atribuo, hoje, que seria mais de R$ 5.000,00. Pediu-me que distribuísse tal valor aos conterrâneos que tivessem dificuldades de manter seus estudos. Pactuamos que eu não iria revelar este fato, o que ora faço em louvor de sua grandeza moral. 


Interessante, há pouco meses, em meio a uma velha papelada, localizei telegramas subscritos pelo Bugija Brito ao vovô Joel notificando-o, em período natalino, da remessa de vales postais em favor de desconhecidas pessoas carentes. Muito solidário, bondoso, caritativo.


Faleceu no Rio de Janeiro no dia 04 de dezembro de 1992 vítima de complicações respiratórias. Desejava que seus despojos mortais fossem sepultados em Oeiras, o que não ocorreu.


A Academia Piauiense de Letras, em 2007, promoveu sessão solene pelo transcurso do seu centenário de nascimento. O município de Oeiras, o Instituto Histórico de Oeiras e a Fundação Nogueira Tapety se consorciaram e cumpriram vasta programação alusiva a esta efeméride, inclusive com a fixação de uma placa comemorativa na casa onde nasceu o ilustre escriba, situada na Praça das Vitórias, n° 106, coração da cidade. A viúva e familiares marcaram presença em ambos eventos.


Deixou notável legado humanístico! 

domingo, 7 de agosto de 2022

Seleta Piauiense - Mário Faustino

 

Fonte: Google

Estava lá Aquiles, que abraçava

 

Mário Faustino (1930 – 1962)

 

Estava lá Aquiles, que abraçava

Enfim Heitor, secreto personagem

Do sonho que na tenda o torturava;

Estava lá Saul, tendo por pajem

Davi, que ao som da cítara cantava;

E estavam lá seteiros que pensavam

Sebastião e as chagas que o mataram.

Nesse jardim, quantos as mãos deixavam

Levar aos lábios que os atraiçoaram!

Era a cidade exata, aberta, clara:

Estava lá o arcanjo incendiado

Sentado aos pés de quem desafiara;

E estava lá um deus crucificado

Beijando uma vez mais o enforcado.   

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

AVENTUREIROS DO TRÂNSITO E SUAS VÍTIMAS

Fonte: Google


AVENTUREIROS DO TRÂNSITO E SUAS VÍTIMAS

Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal (afcsousa01@hotmail.com

Nisso me especializei durante a pandemia pelo coronavírus, eis que já era graduado na percepção do fenômeno antes dela: observar condutores de caminhões, vans, enfim, veículos de entrega, mudança, acharem que, nos espaços pelos quais transitam, seriam os únicos a utilizar seus veículos como ferramenta de trabalho; eles e os motociclistas, mototaxistas – mas, principalmente, os motoqueiros – entregadores de produtos e mercadorias em domicílio, ou prestadores de serviços diversos; logo, cada um a seu modo, entende que detém a preferência sobre os demais meios de transporte ou pedestres; esses, pelos mesmos circulariam por esporte ou mero diletantismo. Interessante é que, dentre os aventureiros do trânsito, donos das ruas, para os quais, a fim de não perderem tempo, ideal seria que avenidas e demais logradouros públicos ou privados, estivessem, necessariamente, sempre à disposição deles, há os que, mesmo cometendo barbaridade às pampas – avançando sinais, ziguezagueando, trafegando pela contramão ou por faixas proibidas, nestas também estacionando -, hipocritamente, ainda pedem feedback sobre seu modo de condução: “como estou dirigindo?”; “estou dirigindo bem?”

Também tenho percebido que, a despeito de regras existirem para ser seguidas por todos no trânsito, além daquela espécie de condutor que, invariavelmente, age de maneira irresponsável, naturalmente, há os que, mais que compreensão, esperam da parte dos companheiros de tráfego, quando, deselegante ou, criminosamente, tomam ou adotam atitudes incabíveis às vias que ocupam, por ações cavalheirescas, anuência, permissão automática deles para, por exemplo, mudarem de faixa, sem antes sinalizar; cruzá-las, desavisadamente, transversal, verticalmente, ou a fim de fazerem proibido retorno, independentemente, de observarem o posicionamento de quem trafega, ou atrás deles, ou em sentido contrário; avançarem sinais fechados. Provavelmente, se perguntassem a alguns de esses péssimos condutores por que estariam fazendo aquilo, a justificativa, certamente, seria por estarem muito apressados, senão atrasados para compromissos anteriormente assumidos. Cavalheirismo, elegância e respeito no trânsito, conseguem aqueles que, como fazem em qualquer nicho social, ético ou moral em que se insiram, também ali, obedecem e cumprem leis válidas para todos.

Seria leviano se afirmasse ou negasse, até porque, no auge da pandemia – como, acredito, muitos também fizeram - pouco transitei por movimentadas vias públicas, que nelas haja sido respeitada a regra de não estacionamento em locais onde os mesmos seriam proibidos; chego, todavia, a desconfiar de que isso não teria ocorrido, pois, recorrentemente, o que se observa são indivíduos descumprindo essas determinações, usando e abusando de sua vocação em burlar normas legais. Não seria imprudente, penso, se afirmasse que, à maioria de nossas principais avenidas, de duas ou mais faixas por via, não faria nenhuma diferença se tivessem uma delas, permanentemente, disponibilizada para estacionamento normal e regular, até porque, em muitos daqueles logradouros, é isso que, realmente, na prática, acontece. Quem quiser conferir, para comprovar ou desmentir o que falo, basta trafegar por uma delas, mesmo fora dos momentos de pico, e perceberá que, invariavelmente, uma de suas faixas, a mais à direita da via, geralmente, é utilizada ou serve de estacionamento, e pouco importa se nelas houver sinalização informando que, ali, naquele espaço, seria proibido estacionar; uns, estacionam em cima das faixas ou embaixo das placas indicativas da proibição; outros as eliminam, a fim de agirem mais tranquilamente.

Não diria que o período de pandemia, que ainda estamos vivenciando, por si só, haja potencializado as ações desrespeitosas que ocorrem no trânsito; nem sei se outros têm a mesma visão do problema que eu; por outro lado, creio que o aumento de acidentes nas vias públicas decorre do fato de que muitos as veem como espaço sem lei, destinado aos mais corajosos ou audaciosos; infelizmente, dentre esses aventureiros motorizados, muitos são abatidos antes de chegar ao final do percurso planejado; o pior é que, não raro, muitas vítimas inocentes de suas aventuras sucumbem com eles.  

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Convite para "Bate-papo literário"

 



Faltando apenas 02 dias para nosso encontro 

Estamos de contagem regressiva para o retorno de nossos encontros presenciais!!!

Convidamos a todos, sábado no dia 6 de agosto, na Unidade Escolar Mathias Olímpio, (prédio antigo senac) às 17h ⏰, para prestigiar e participar de um bate-papo literário com o escritor Elmar Carvalho, que falará um pouco da sua obra “Histórias de Évora”. Livro estudado pelo coletivo no mês de julho. 

 Elmar Carvalho é um grande nome da literatura piauiense, autor de vários livros em prosa e em verso, destacando-se Rosas dos ventos gerais, Lira dos cinquentanos, Confissões de um juiz e Histórias de Évora.

Todos estão convidados a participar!! Vai ser show 📚 👏 

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quarta-feira, 3 de agosto de 2022

NA NOITE

Fonte: Google


NA NOITE


Elmar Carvalho

 

Na noite

um sapo coaxa.

Uma puta triste

acha graça. Acha graça.

Um galo

às desoras desfere um canto

fora de hora. E chora.

Um cão ladra por nada:

nenhuma cadela no cio.

O silêncio

grita como louco

na concha acústica

dos labirintos dos ouvidos moucos

por onde um Teseu lasso caminha

em busca do Minotauro – perdido

sem o fio de Ariadne –

conduzido por outro fio

que parte / se parte e

se reparte entre o ser

e o não ser.

E os gritos de Teseu

arrancam ecos

que já ecos de si mesmos

se repetem se repetem

até a mais completa

absoluta exaustão.   

terça-feira, 2 de agosto de 2022

AO AMIGO AVENTUREIRO

Fonte: Google



AO AMIGO AVENTUREIRO


Alcione Pessoa Lima

 

Ele já foi garimpeiro

Deixou a sua bandeira

Só ele e o companheiro

Voltou de novo ao sertão.


E debandou sem o ouro

A esperança na chuva

Sobre os ombros o atilho sagrado

Estava salvo outra vez!


Sem opção, recebe a contragosto

Os ratos e a camarilha

Prefere ouvir as promessas 

Pitando a guimba de palha 

Ouvindo um rádio de pilha. 


E a família incauta

Fica à mercê de uma malta... 

Acorda cedo e ponteia

Na sua viola caipira

Sagas de retirantes

Espelhos da sua vida.


Os três filhos que teve

De amores desencontrados

Um, seguiu pro garimpo

O outro, é capoeira

E a menina dos olhos

Amasiou-se na feira.


E de repente aprendeu

Tocar piano nas coxas

Reinventar o cordel

E entre um trago e outro

Seus dotes de menestrel.

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

UM CANTO À BARRAS DO MARATAOÃ: DOS POETAS E DOS GOVERNADORES

 

Ilustração: Centro Histórico de Barras do Marataoã (Ângela Rêgo)




UM CANTO À BARRAS DO MARATAOÃ:

DOS POETAS E DOS GOVERNADORES

 

                                                     Chico Acoram

   

“Barras ...

Barras do Marataoan ...

Dos cânticos de pássaros

e cântaros e címbalos de águas

em cantatas e cascatas

no rocio róseo-violáceo da manhã.

Barras das sete barras

- candelabro de sete braços de prata

líquida a escorregar macia

no dorso duro das pedras (...)”

 

(Versos iniciais do poema “Barras das Sete Barras”

do poeta Elmar Carvalho).

 

  

PREFÁCIO

          Joaquim Mendes Sobrinho (JOAMES)*

  

Um pequeno volume em poesia,

Mas de enorme valor em conteúdo;

Dos barrenses famosos, quase tudo

Aqui fala Francisco com mestria;

Sobre vultos que eu nem conhecia

O autor me deixou bem-informado;

Literatos famosos do passado

Ressuscitam aqui sua memória;

Cujos vultos notáveis são a glória

Cultural que enobrece nosso Estado.

 

 Grande orgulho p’ra nós piauienses,

Conterrâneos de gênio e finos tratos;

Governantes, poetas, literatos,

Os maiores destaques são barrenses;

Nos meandros da prosa, nos forenses,

Professores, retóricos famosos,

Militares honrados, prestimosos,

Defensores da pátria e do Estado;

Pelo autor, cada vulto é celebrado

Neste tomo de versos graciosos.

 

 Mas Francisco Carlos também fala

Das belezas da terra, a fauna rica,

As águas que se vão, o rio que fica,

Os perfumes que a vasta flora exala;

Acoram não omite nem se cala,

Ergue a voz em louvor à sua gente,

Porque sabe, o silêncio permanente

Faz até esquecer o próprio povo;

O poder singular dum canto novo

Faz o nosso passado ser presente.

 __________

 

Salve Barras, a flor de Marataoã!

Parabéns, Chico Carlos “Acoram”!

  

*JOAQUIM MENDES SOBRINHO (JOAMES)

Piauiense de Pedro II, escritor, poeta, estudioso e professor de Literatura de Cordel nas escolas públicas municipais de Teresina, Piauí. Membro da União Brasileira de Escritores – UBE/PI; da Associação dos Violeiros e Poetas Populares do Piauí; e da Associação dos Poetas Populares de Timon e Região dos Cocais (MA). Atual presidente da Cordelaria Chapada do Corisco – COCHACOR.


UM CANTO À BARRAS DO MARATAOÃ:

DOS POETAS E DOS GOVERNADORES

                                           

 

Minha terra tem matas abundantes;

 Paraíso das águas és oh Barras!

Tens a flora e uma fauna exuberantes.

Tens os cantos dos pássaros, cigarras

E as seis barras de rios deslumbrantes

Que desfilam nas matas em fanfarras

Escrevendo poesias e canções

Alegrando assim nossos corações!

 

 

Meu torrão tem poetas renomados

Como um David Caldas, os irmãos

João/Celso Pinheiro, ainda aclamados;

Tito Filho, o cronista, em cujas mãos  

Retratou Teresina em exaltados

Textos bem-feitos sobre os cidadãos,

Cantos desta cidade, seus encantos,

Suas ruas, e todos os recantos.

 

 

Outros vates ilustres das fazendas,

Das ribeiras do meu Marataoã

Se tornaram estrelas estupendas

Na seara das letras desta chã,

Como Hermínio, esse líder das contendas

Do repente e cordel, que d’uma sã                                        

Mente fez o corpóreo livro “Lira

Sertaneja”, que a gente o admira.

 

 

Desse clã dos Castelo Branco são

Excelentes poetas: o Leonardo

De Carvalho, o avô, de vocação

P’ra pelejas políticas, um bardo

Talentoso, foi homem de expressão;

Pai Miguel de Carvalho, felizardo

Em cultura, poeta, professor,

Bem versado em gramática, e orador.

 

 

Sua avó, por Judite conhecida,

 Mais algumas das filhas, poesias

Escreveram em carta dirigida

Ao pai preso e exilado, em covardias

Do governo do Rei, sem merecida

 Compaixão e quaisquer das garantias

Foi metido em prisões de Portugal

Por razão de não ser, ao Rei, leal.

 

 

 

Teodoro Castelo Branco, vate

Importante no seio da poesia

Popular, e homem do melhor quilate,

Nosso Hermínio puxou, em demasia,

O seu tio, que gostava do combate

Nas arenas de guerra, assim queria,

E depois retornar p’ra suas matas,

Pois gostava dos campos e cascatas.

 

 

Minha terra querida tem poetas

Importantes no rol dos imortais

Acadêmicos com suas seletas

Poesias, e escritores perenais

Dentre os quais, e segundo os exegetas,

São: Matias Olímpio, e seus iguais

Antenor Rêgo Filho, o professor

Dilson Lages que é um escritor.

 

 

Menciono, também, o antologista

Consagrado e escritor Wilson Carvalho

  (dos) Gonçalves, figura idealista

Da cultura e das letras, de trabalho

Invejável dum grande beletrista,

E longevo que nem o pau carvalho;

 O escritor Fenelon Castelo Branco,

Outro ilustre barrense de dom franco

 

 

 

E conceito bastante elogiado,

Seja um bom magistrado ou escritor,

Jornalista ou poeta renomado;

José “Lima Rebelo” foi cultor

Do Direito e um grande advogado,

Sobretudo, eminente educador,

Diretor da Instrução Parnaibana,

Catedrático em letras e de humana.

 

 

Mas não posso deixar de destacar

Um poeta e escritor d’alma barrense.

 “Barras das Sete Barras” – vem de Elmar

 (dos) Carvalho; contudo, há quem bem pense

Que o escriba nasceu neste lugar,

   Mas o ilustre é um campo-maiorense,

Pois o pai é de Barras Marataoã,

Seu Miguel (dos) Carvalho, alma cristã.

                                                                             

 

Ele próprio declara, por herança,

É barrense de todo coração,

Relembrando, ainda jovem, fez andança

Pelas Barras, e muita gratidão

O poeta tem por essa lembrança

Com o povo gentil deste torrão

E agradece a acolhida, a deferência

Recebida com muita reverência.

 

 

 

Minha terra, também, de lá nasceu

Um pintor, desenhista e professor,

É Lucílio Albuquerque, e mereceu

Elogios e aplauso e mui louvor,

Pois o mundo assim bem reconheceu

Como um grande barrense de valor

Das pinturas das telas, retratista,

Foi também excelente paisagista.

 

 

Barras é conhecida em todo canto

Como terra dos sete governantes

Espalhados por tudo que é recanto.

São ilustres barrenses tão brilhantes:

Taumaturgo Azevedo foi, portanto,

Um gestor de atuações bem conflitantes,

O primeiro barrense nomeado

Governar, na República, este Estado.

 

 

Taumaturgo, também, governador

Do Amazonas atuou por algum tempo

Nesse cargo importante com temor

Do inimigo cruel que a contratempo

O levou a perder, sem um clamor,

O comando do Estado, onde em meio-tempo

Deodoro ausentou da Presidência

Da República, é preso sem clemência.

  

 

Em razão de um robusto relatório

Que mandou publicar lá na cidade 

Do meu Rio de Janeiro, peremptório,

Descrevendo com muita claridade

O que fez em Manaus, e do notório

Caso de falcatrua e iniquidade

De políticos “craques” em roubar,

Taumaturgo foi preso em conspirar.

 

 

Depois, foi nomeado Coriolano

De Carvalho pra ser governador

Do Piauí, mas no cargo além de um ano

Não ficou em razão do seu labor

Com a pública coisa, pois foi lhano,

Adotando medidas para pôr

As finanças do Estado equilibradas,

Entretanto, as ações são criticadas.

 

 

Foi Fileto (dos) Pires (e) Ferreira.

Militar, deputado federal,

Um barrense de ação bem altaneira,

Destacou-se   um político leal,

Foi amante das artes; sem canseira

Terminou a ereção monumental

Do Teatro Amazonas; com mandato

Encerrado, ao quartel volta imediato.

 

 

 

Sigismundo Gonçalves, um barrense

De destaque no campo do Direito

 Brasileiro, foi um piauiense

Magistrado, de muito bom conceito,

Que chegou a ministro, e que bem pense

Da Suprema Justiça, e foi eleito

Senador pelo Estado Pernambuco,

E Governo na terra de Nabuco.

 

 

Outros filhos de Barras atuantes

Deste Estado podemos destacar

Com orgulho os ilustres governantes

Artur de Vasconcelos, o exemplar

Mor Matias Olímpio, e o nunca dantes

E depois mandatário a governar

O Piauí, cerca de mais de dez anos,

Foi Leônidas Melo, o “Homem de Planos”.

 

 

Conhecida de terra de imortais

Bons poetas e muito senadores,

Barras já teve grandes marechais

De elevado conceito e com louvores

Na política como nos anais

Desse Exército de homens vencedores,

Dentre os quais se destacam Taumaturgo

De Azevedo, um “notável demiurgo”.

 

 

 

Foi Firmino (dos) Pires (e) Ferreira

Que na guerra lutou no Paraguai

Com bastante coragem na trincheira,

Nos combates mortais se sobressai;

Vencedor da batalha traiçoeira

E sangrenta é ferido, mas não sai

Da vanguarda, e que por essa razão

Se graduou General de Divisão

 

 

E os barrenses que foram senadores?

O Firmino (dos) Pires (dos) Ferreira,

Joaquim Pires, e os dois bons professores:

 O Matias Olímpio, de carreira

Ilibada, com atos promissores;

E Leônidas Melo, de altaneira

Profissão da área médica, político,

De avançada visão e senso crítico.

 

 

Destacados como homens imortais,

Barras é um celeiro de escritores

E poetas inscritos nos anais

Do importante “Sobrado” dos cultores

Beletristas, das artes culturais

Do Piauí, seja como precursores

Ocupantes/patronos de cadeiras

São quatorze daqui destas ribeiras:

 

 

 

1 – João Pinheiro (1877-1946). Fundador. Primeiro Ocupante da Cadeira nº 2 da APL);

2 – Celso Pinheiro – (1877-1950). “O milionário do verso”. Fundador. Primeiro Ocupante da Cadeira nº 10 da APL;

3 – Breno Pinheiro - (1899-1957). Segundo Ocupante da Cadeira nº 8 da APL;

4 – David Moreira Caldas - (1836-1879). Patrono da Cadeira nº 4 da APL;

5 – Dilson Lages Monteiro - (1973). Quarto e atual Ocupante da Cadeira nº 21 da APL;

6 – Fenelon Ferreira Castelo Branco - (1874-1925). Fundador. Primeiro Ocupante da Cadeira nº 3 da APL;

7 – Gregório Taumaturgo de Azevedo - (1853-1921). Patrono da Cadeira nº 29 da APL;

8 – Hermínio de Carvalho Castelo Branco – (1851-1889). Patrono da Cadeira nº 2 da APL;

9 – José de Arimathea Tito - (1887-1963). Primeiro Ocupante da Cadeira nº 29 da APL;

10 – José de Arimatéa Tito Filho – (1924-1992). Segundo Ocupante da Cadeira nº 29 da APL;

11 – José Pires de Lima Rebelo – (1885-1940). Segundo Ocupante da Cadeira nº 22 da APL;

12 – Matias Olímpio de Melo – (1882-1967). Primeiro Ocupante da Cadeira nº 20 da APL. Presidente da APL;

13 – Teodoro de Carvalho e Silva Castelo Branco – (1829-1891). “O poeta caçador”. Patrono da Cadeira nº 6 da APL;

14 – Wilson Carvalho Gonçalves – (1923-2021). Quinto Ocupante da Cadeira nº 12 da APL.

 

REFERÊNCIAS

 

ARAÚJO, Francisco Carlos. O menino, o rio e a cidade. Teresina: 2021.

CARVALHO, Elmar. Barras - terra dos governadores e de poetas e intelectuais (Crônica publicada no Blog do Elmar Carvalho). Teresina: 2014.

CHAVES, Monsenhor. Obra Completa. Teresina: 2013.

GONÇALVES, Wilson Carvalho. Antologia da Academia Piauiense de Letras. Teresina: 2018.

RÊGO FILHO, Antenor. Barras, histórias e saudades. Teresina: 2007.